Modelo de negócios flexível é diferencial do Brasil, diz CEO da WeWork LatAm

Em entrevista à Bloomberg Línea, Claudia Woods cita fatores como flexibilidade contratual com clientes e locatários para sustentar que operação na região não será afetada pela crise nos EUA

Claudia Woods, CEO da WeWork para a América Latina (Foto: Divulgação)
09 de Novembro, 2023 | 04:50 AM

Bloomberg Línea — O pedido de recuperação judicial da WeWork pelo Chapter 11 da lei americana na segunda-feira (6) deixou dúvidas sobre eventuais impactos na operação da companhia no Brasil. Segundo a CEO da WeWork na América Latina, Claudia Woods, a flexibilidade contratual da empresa com clientes e locatários é um diferencial crítico das operações no Brasil.

A executiva afirmou em entrevista à Bloomberg Línea que os desafios com a recuperação judicial da WeWork (WE) nos Estados Unidos, que declarou dívidas de quase US$ 19 bilhões, não comprometem a autonomia e a saúde financeira das operações latino-americanas.

Woods, que anteriormente comandou a Uber no Brasil, defendeu a sustentabilidade do modelo de negócios da WeWork, dadas as condições para o país e a região e a evolução que ocorreu.

“Quando falamos de um prédio da WeWork, imagine que o modelo nasceu quando alugávamos o prédio inteiro e assinávamos um contrato de 15 anos em que eu me comprometia com o valor de aluguel e eu ficava 100% com o risco de monetizar esse espaço”, disse à Bloomberg Línea.

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Segundo a executiva, a empresa de coworking fundada por Adam Neumann e Miguel McKelvey em 2010 evoluiu de um modelo de aluguel de longo prazo para estratégias mais flexíveis de compartilhamento de receitas com proprietários de imóveis. Esse ajuste responde à crescente aversão ao risco de empresas pós-pandêmica, favorecendo contratos mais curtos e ajustáveis.

“Os proprietários também estão muito acostumados a operar contratos de 15 anos e o mercado imobiliário sempre funcionou assim. O que aconteceu após toda a crise imobiliária da pandemia é que ninguém mais quer assumir esse nível de risco”, afirmou a executiva.

“No nosso portfólio, mais de 60% dos clientes são grandes empresas. Elas chegam à WeWork dizendo que não querem mais um compromisso de 15 anos já que as gerações estão mudando muito, o modelo de trabalho também e elas não querem esse comprometimento”, apontou.

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A CEO da WeWork LatAm destacou o aprendizado da startup com o crescimento e o aprimoramento na escolha de locais para suas unidades. Ainda assim, há um legado de contratos passados, que foram aqueles negociados “muito no começo, naquele primeiro boom de crescimento, em que não necessariamente a nossa habilidade de escolher os melhores lugares já estava desenvolvida”, disse.

No México, por exemplo, apesar de um desenvolvimento descrito como “saudável”, a executiva disse que dois edifícios lançados durante a pandemia ainda buscam atingir o nível de maturação desejado, ou seja, alcançar uma taxa de ocupação otimizada de 80% a 87%.

“Esse prédio - lançado na pandemia - tem uma curva de maturação. Ele vai chegar à ocupação de 80%, 85%, 87%, que consideramos nossa ocupação otimizada. Mas há um tempo para isso. É um ótimo exemplo de um mercado que é saudável para nós, porém eu ainda preciso de mais tempo para levar os edifícios a um ponto de maturidade, como já está o Brasil em razão da data de inauguração”, explicou.

Segundo Woods, ao se tratar de saúde financeira no segmento de coworking, duas principais alavancas são o valor do aluguel pago pela WeWork e o valor que a empresa consegue agregar para os membros para que possam pagar para utilizar o serviço de escritório compartilhado.

“Essas duas alavancas precisam estar em equilíbrio. Se não estão em equilíbrio, é aí que você vai ter um mercado talvez desbalanceado”, disse a CEO. Ela acrescentou que o Brasil tem uma característica muito própria, que é a revisão periódica do valor do aluguel, que faz parte de toda relação entre inquilino e proprietário. “Ela me protege na minha relação com os meus proprietários.”

Joint venture com o SoftBank

Woods descreveu a estrutura de joint venture com o SoftBank, que confere à WeWork América Latina, segundo ela, uma governança local, capaz de responder às especificidades de cada mercado latino-americano.

A CEO ressaltou que, apesar do pedido da WeWork global ao Chapter 11 - um mecanismo de reestruturação nos EUA que não reflete problemas de solvência, de acordo com ela -, a América Latina permanece protegida dessas complicações, mantendo parcerias e negociações com parceiros regionais.

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“A companhia deixou muito claro que os outros países não são impactados. Não estamos falando aqui de um problema de solvência. Estamos falando de um problema estrutural, seja da dinâmica de dívida, seja do relacionamento com os proprietários que levou a empresa a esse ponto, que a levou a usar esse mecanismo para poder realmente maximizar as suas negociações”, disse.

“A dinâmica de P&L [lucros e perdas] de cada país é diferente. Na verdade, mesmo dentro da América Latina, temos situações distintas entre os países. O Brasil é um dos nossos mercados mais saudáveis. Ele hoje representa acima de 30% do que é esse território da América Latina.”

Ocupação dos prédios

Segundo Woods, no Brasil a taxa de ocupação dos prédios está muito próxima à do ano passado, “que já era mais de 80%”.

Os dados de ocupação da WeWork no Brasil são divulgados no final do ano, segundo a executiva. “A empresa realmente estava operando em um nível de ocupação extremamente saudável e com alguns prédios até já com 100% de ocupação”.

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Ainda segundo a CEO, grandes empresas que ocupavam muitos espaços acabaram diminuindo a quantidade de espaço de que necessitam e complementaram com o chamado vale-escritório. Esse foi um dos produtos que a WeWork lançou no Brasil, que permite ao funcionário que conta com o benefício trabalhar de qualquer escritório da companhia.

“Empresas hoje não têm mais a mesma quantidade de cadeiras equivalente ao que possuíam de funcionários. Mais empresas estão usando menos espaço e complementando com o benefício da rede. Além disso, olhamos para o fluxo no prédio [para medir resultados]”, afirmou Woods, citando que outubro foi o mês com fluxo recorde de acesso aos prédios desde 2020.

Ponto dinâmico: 70% de ocupação

Woods não quis revelar qual o ponto de equilíbrio de ocupação para a viabilidade do modelo de negócios, mas disse que a WeWork opera em um ponto dinâmico em que 70% de ocupação já desencadeia um ambiente “vibrante e comunitário” - essencial para o conceito da marca.

Em um documento arquivado na SEC (Securities and Exchange Commission) em 2018, a WeWork citou um ‘Ebitda ajustado de comunidade’. Junto com a margem de Ebitda ajustada pela comunidade, ambas seriam medidas suplementares adicionais de desempenho operacional.

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O Ebitda ajustado pela comunidade representava o Ebitda ajustado antes dos investimentos em crescimento, ajustado adicionalmente para remover as despesas gerais e administrativas.

Já a margem Ebitda ajustado pela comunidade media o Ebitda ajustado pela comunidade como um percentual do total da receita de membros e serviço e da renda de taxa de gestão dos serviços de consultoria prestados aos locais com a marca.

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Segundo Woods, com mais ou menos 70% de ocupação “muitas coisas acontecem”, o prédio começa a ficar movimentado e “ele começa a respirar e a girar”.

“Normalmente a tendência é dali em diante [dos 70% de ocupação] chegar a uma ocupação muito alta muito mais rapidamente, porque há até uma espécie de FOMO [fear of missing out] com tudo o que está acontecendo no prédio. As pessoas querem fazer parte dele”, disse.

A executiva comentou sobre a mudança nos espaços de trabalho no Brasil: locais antes vistos como periféricos, como prédios de bairro que abrigavam mais profissionais autônomos, casos de Oscar Freire e Perdizes, agora com alta demanda. Seria reflexo de uma mudança no comportamento dos trabalhadores, que agora evitam longos deslocamentos para a região da Faria Lima.

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Isso é evidenciado pelo aumento no uso de salas de reunião e no tráfego geral nos prédios, sugerindo uma preferência por interações sociais em detrimento do trabalho isolado.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups