Fleury espera capturar sinergias com Pardini e pode voltar às compras, diz CEO

Jeane Tsutsui diz à Bloomberg Línea que combinação de negócios com Pardini avança em 2024 e que ecossistema integrado de saúde tende a sustentar crescimento; analistas, porém, não estão convencidos

Jeane Tsutsui, CEO do Grupo Fleury
14 de Março, 2024 | 06:00 AM

Bloomberg Línea — O Grupo Fleury (FLRY3) espera capturar mais sinergias em 2024 após a integração de negócios com o Pardini, iniciada em maio passado, o que ampliou sua abrangência geográfica e o portfólio de produtos, sem sacrificar o nível de rentabilidade.

Em entrevista à Bloomberg Línea, a CEO Jeane Tsutsui ressaltou o resultado da fusão, que fez a receita bruta subir a R$ 7 bilhões no ano passado. “Foi um ano histórico para o Fleury, um grupo de 98 anos. Fizemos a grande combinação de negócios com Pardini que fez nossa receita crescer 44,9% no ano e mudamos de patamar”, diz a executiva.

Tsutsui afirmou que processo de fusão deve durar três anos e que o grupo já conseguiu reduzir custos e despesas após mudanças de contratos e o fechamento de capital de Pardini com adoção de uma estrutura única de governança.

A estimativa do Fleury, divulgado em abril do ano passado, era capturar entre R$ 200 milhões e R$ 220 milhões em geração de caixa adicional no prazo de 12 meses. A operação conjunta só completa um ano em maio .“Não são apenas sinergias, há um processo de integração de culturas, processos e sistemas em curso”, observa.

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A CEO destacou a maior abrangência geográfica e ampliação do portfólio de serviços como vantagens da combinação de negócios.

“As unidades do Fleury já vendem exames toxicológicos, enquanto as unidades de Pardini já oferecem exames de genômica no lab-to-lab [unidade de negócios B2B do grupo mineiro]”, exemplificou Tsutsui.

Apesar dos reflexos positivos, analistas estão retirando a recomendação de compra para a ação por não enxergarem novos impulsionadores para o papel, enquanto o comando da empresa indica a possibilidade de uma retomada de sua estratégia de M&A.

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Tsutsui indicou que o grupo poderá voltar às compras neste ano, após a integração com Pardini em 2023, mirando principalmente players menores com atuação em outras regiões, mas ela lembra que os juros ainda estão elevados e que o custo de capital é avaliado dentro da disciplina financeira do Fleury em sua política de M&A.

“Em geral, os donos, fundadores desses ativos menores, regionais, são apegados a valores do passado e não dá para fazer [a aquisição], observou a executiva.

O CFO do grupo, José Antonio Filippo, acrescentou que os deals maiores, de impacto transformacional, como foi a combinação de negócios com Pardini, levam tempo, pois requerem muita negociação.

“Sempre estamos avaliando o pipeline e prospectando oportunidades do mercado. É preciso analisar se o deal faz sentido”, disse o executivo.

A CEO vê 2024 com potencial de crescimento da receita do seu ecossistema integrado de saúde, que atua no B2B (prestação de serviços a hospitais) e no B2C (plataforma digital).

A vertical denominada de “novos elos” (oferta da serviços ambulatoriais de especialidades, como ortopedia, infusões de medicamentos e oftalmologia) elevou receita em mais de 60% em 2023, após aquisições regionais, já representando 8% do faturamento do grupo.

A companhia, um dos maiores players de medicina diagnóstica do Brasil, lucrou R$ 467 milhões em 2023, um crescimento anual de 51,7%. O resultado contábil do quarto trimestre (lucro de R$ 81,3 milhões, alta de 162,6% em 12 meses) superou levemente o consenso de analistas ouvidos pela Bloomberg (R$ 79,3 milhões).

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A receita bruta saltou de R$ 4,8 bilhões em 2022 para R$ 7 bilhões no ano passado, refletindo a contribuição de Pardini contabilizada desde maio.

Interesse pela Dasa?

Atualmente, analistas trabalham com a expectativa de uma eventual venda de controle ou de participação minoritária da Dasa (DASA3), dona de laboratórios tradicionais como Delboni Auriemo, Salomão Zoppi e Lavoisier, como revelou reportagem da Bloomberg News, citando o interesse da Rede D’Or São Luiz (RDOR3) pelo ativo.

Os executivos do Fleury não comentaram diretamente a possibilidade de apresentar alguma oferta pela concorrente. A Dasa disse, em comunicado no último dia 2, que não está formalmente negociando venda de fatia ou controle da companhia.

A CEO do Fleury lembrou que, desde 2021, o grupo já concluiu 16 aquisições menores de ativos voltados para reforçar seu ecossistema integrado de saúde explorando avenidas de crescimento, como a oferta de serviços ambulatoriais, de menor complexidade.

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“Estamos olhando as oportunidades para continuar entregando resultados consistentes, dentro de uma estratégia robusta de crescimento orgânico e inorgânico. Esperamos que as questões macroeconômicas globais melhorem, bem como as eventuais dúvidas e inseguranças do mercado com o Brasil e outros emergentes”, diz a CEO.

Ebitda em alta

O Ebitda do grupo cresceu 39% em 2023, passando de R$ 1,2 bilhão no ano anterior para R$ 1,6 bilhões, excluindo as despesas não recorrentes com o processo de integração, segundo o resultado contábil divulgado.

A margem Ebitda caiu de 26,7% (2022) para 25,6% (2023), mas subiu na comparação entre os quarto trimestres, de 20,9% para 22,1%.

O último trimestre costuma sofrer o efeito da sazonalidade, quando cai o volume de exames devido ao maior número de feriados e viagens.

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Já a margem bruta caiu levemente de 27,1% para 26,9% no acumulado do ano. A CEO atribuiu essa redução aos maiores custos no período. No quarto trimestre, no entanto, a margem bruta subiu de 22,4% (igual período do ano anterior) para 23,5%, segundo o balanço contábil.

Tsutsui ressaltou que o resultado pro-forma (comparação em bases iguais com Pardini, não só desde maio de 2023) apontou uma margem Ebitda do grupo crescendo levemente de 25,1% (2022) para 25,2% (2023).

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“Mantivemos a margem Ebitda”, disse.

Pagamento de dividendos em abril

As ações do Fleury acumulam queda de 17% neste ano, ante uma perda de quase 5% do Ibovespa no período. A companhia é avaliada em R$ 8,13 bilhões na B3. A seguradora do Bradesco (BBDC3) detém 24,85% do capital do Fleury por meio da Bradesco Diagnóstico em Saúde, maior acionista. Os herdeiros e filhos do fundador Hermes Pardini - Regina, Victor e Áurea, são donos de 6,61%, 6,60% e 5,93% do Fleury, respectivamente.

O grupo distribuiu R$ 317,818 milhões em dividendos e JCP (juros sobre o capital próprio). No próximo dia 1º de abril, os acionistas com posição em 19 de março vão receber R$ 80,536 milhões em dividendos, em valor correspondente a R$ 0,14761361742 por ação.

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Analistas esperavam o impacto da sazonalidade do setor de saúde no ritmo de crescimento do Fleury no quarto trimestre. No mês passado, relatório do Safra rebaixou a recomendação da ação da companhia de compra para neutro, citando expectativa de um upside limitado após integração de Pardini.

Além do Safra, o Citi também mudou a recomendação de compra para neutra, mencionando a ausência de catalisadores de curto prazo, a fraqueza das vendas da marca premium Fleury, um mix de vendas com margens mais baixas, e a potencial queda nas estimativas de consenso dos analistas com o maior risco de execução. O preço-alvo do Citi foi cortado de R$ 19 para R$ 15. Ontem (13), o papel chegou a ser negociado abaixo de R$ 15, na mínima de R$ 14,84, fechando em queda de 1,91%, cotado a R$ 14,86.

Por sua vez, a corretora Genial, que recomenda compra com preço-alvo de R$ 21, escolheu a ação do Fleury como sua atual top pick do setor, ressaltando o contínuo crescimento dos exames por atendimento, nível de endividamento “saudável”, ganhos de eficiência e expansão de novos segmentos de negócios.

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“A criação do ecossistema integrado de saúde, com diferentes especialidades para captar o paciente em toda sua jornada, continua sendo uma das teses de longo prazo mais interessantes do setor”, escreveu a equipe da Genial no relatório assinado pelos analistas Guilherme Vianna e Luis Assis.

A nova Amil e a emergência da dengue

Sobre a compra da Amil pelo empresário José Seripieri Filho (ex-Qualicorp) no final de 2023, a CEO do Fleury disse que a companhia tem um bom relacionamento com a operadora de assistência à saúde, antes controlada pela americana UHG (United Health Group), e que o fundador da Qualicorp conhece bem o setor. Por enquanto, não há mudanças na parceria do Fleury com a Amil, segundo Tsutsui.

O grupo terminou 2023 com um nível de alavancagem (dívida líquida/Ebitda) de 1,2x. Segundo o CEO, a situação permite capturar oportunidades em linha com a estratégia de construção de um ecossistema de saúde.

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Quanto ao eventual impacto do estado de emergência para a dengue, decretado pelo governo de São Paulo na semana passada, a executiva disse que companha está ofertando exames para o diagnóstico inicial da doença, mas diante do novo patamar de R$ 7 bilhões da receita anual do grupo, esse produto não “move o ponteiro” do faturamento, ou seja, não tem relevância material para o desempenho deste trimestre, ao contrário do que se viu na demanda exponencial de testes de Covid.

“Estamos preocupados com essa situação sanitária, e já estamos oferecendo testes rápidos e sorológicos”.

Tsutsui afirmou ainda que o grupo tem trabalhado em conjunto com outros players, como as operadoras de planos de assistência à saúde, em busca da sustentabilidade do setor, que atravessou os efeitos negativos do aumento da sinistralidade e dos custos em sua rentabilidade desde a pandemia da Covid nos últimos anos.

“Nossa estratégia é contribuir com o setor levando soluções para as operadoras e trabalhando na prevenção com a integração na jornada do paciente por meio da vertical de novos elos”, disse Tsutsui.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.