Como uma indústria de balas e doces do interior de SP foi alvo de gigante dos EUA

Dori Alimentos é vendida para Ferrara Candy, associada da Ferrero, em negócio que acirra disputa de Mondelez, Nestlé e Arcor pelo mercado de balas e gomas

Linha de produção de balas da Ferrara, uma das maiores empresas do setor nos EUA (Foto: Luke Sharrett/Bloomberg)
24 de Julho, 2023 | 08:09 PM

Bloomberg Línea — A Ferrara Candy Company, empresa associada à Ferrero e uma das maiores empresas de balas e gomas nos Estados Unidos, anunciou nesta segunda-feira (24) um acordo para aquisição da Dori Alimentos, uma das principais fabricantes e distribuidoras brasileiras de doces e snacks de amendoins e de chocolates, dona de quatro fábricas no país. O negócio marca a entrada da companhia americana no mercado brasileiro e acirra a competição no segmento, já explorado por players estrangeiros.

Com sede em Chicago há mais de 115 anos e de capital privado, a Ferrara possui 20 marcas como Black Forest, Brach’s, NERDS, SweeTARTS e Trolli. No ano passado, teve faturamento de US$ 1,5 bilhão.

A Dori, fundada em 1967 em Marília (interior paulista), tem no portfólio nomes como Dori, Pettiz, Jubes, Gomets, Deliket, Disqueti, Yogurte 100 e Bolete. Teve receitas brutas de R$ 1,56 bilhão em 2022.

A Ferrero, por sua vez, é uma companhia italiana especializada em mercearia fina e dona de marcas icônicas como Ferrero Rocher, Nutella, Kinder e Tic Tac.

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O mercado de balas e gomas de mascar é considerado competitivo, pois são produtos populares entre os brasileiros e têm demanda constante. Entre os players estão a Arcor, dona das marcas 7Belo e Butter Toffees e Poosh, a Mondelez, de Halls, Trident e Lacta, e a Nestlé, das marcas Garoto e Smarties.

Há ainda no páreo a Perfetti Van Melle, empresa dona da Mentos, da Fruitella e do Chupa Chups, além de diversas fabricantes de atuação regional, o que torna esse mercado ainda fragmentado com marcas menores espalhadas pelas diferentes regiões do Brasil.

A aquisição da Dori será feita por meio da CTH, que é a principal empresa controladora da Ferrara. A Dori é uma empresa familiar e investida pela ACON Investments, empresa de investimento em private equity. Os termos financeiros da transação, como o valor, não foram divulgados.

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O site do jornal Valor Econômico informou, sem revelar fonte, que a transação teria sido de quase R$ 2 bilhões e que o ativo foi avaliado também pela Mars, pela Hershey’s e pela Mondelez.

Distribuição nacional

A Dori atraiu o interesse em razão de suas marcas tradicionais, conhecidas por diversas gerações. Em nota, a Ferrara destacou que “o portfólio robusto da Dori, somado ao desempenho consistente e capacidade de distribuição em todo o país, permitiram à empresa um crescimento de receita de dois dígitos nos últimos anos”.

“Estamos entusiasmados em nos juntar à Ferrara e confiantes de que é a parceira certa para este próximo passo na incrível história da Dori”, disse Pedro Lobo, CEO da Dori, em nota.

Vitor Barion, presidente do conselho da Dori, afirmou, por sua vez, que a Ferrara foi “uma grande inspiração” para a construção do portfólio de produtos da empresa.

Marco Capurso, CEO da Ferrara, também ressaltou que “a Dori combina com a Ferrara, com um portfólio complementar de doces, uma herança semelhante e uma cultura baseada em valores”.

Já Rodrigo Galvão, sócio da ACON Investments no Brasil, disse que o investimento na Dori começou em 2016. “ Testemunhamos a grande evolução da Dori e estamos animados para que ela embarque em uma nova fase em sua história. Acreditamos que a Dori e a Ferrara formarão uma parceria sólida que criará valor para todos os envolvidos”, afirmou Galvão.

A ACON, sediada em Washinton D.C., gerencia fundos de private equity e parcerias com propósito específicos que fazem investimetos nos EUA, na América Latina e na Europa. A empresa de investimentos em private equity tem a gestão de US$ 7 bilhões em ativos.

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IPO frustrado e calote da Americanas

Com a conclusão do negócio, os mais de 3.100 empregados da Dori se juntarão aos 4.600 membros da equipe da Ferrara, informou a nota. A transação está prevista para ser concluída no quarto trimestre de 2023 e está sujeita a determinadas condições de fechamento, acrescentou a Ferrara.

Em 2021, a Dori Alimentos chegou a protocolar na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) pedido para registro de IPO (oferta inicial de ações), mas as condições do mercado pioraram, levando à desistência da tentativa de abertura de capital.

Em janeiro, a Dori Alimentos apareceu na lista de credores da varejista Americanas (AMER3), que entrou em RJ (Recuperação Judicial) após a descoberta de fraude contábil da ordem de R$ 20 bilhões. Os débitos da Americanas com a Dori somavam R$ 3,8 milhões.

A Dori divulgou, no mês passado, que sua plataforma de snacks é composta por mais de 320 SKUs (tipos de produto), comercializados em canais voltados ao varejo e ao atacarejo, que atingem mais de 154 mil pontos de venda no Brasil. A participação do canal varejo passou de 46,3% para 58,9% da receita entre 2016 e 2021. Já no mercado externo, a empresa está presente em mais de 50 países com exportações que representam 12% de sua receita.

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Segundo último levantamento da Abicab, com dados coletados pela KPMG, em 2022, a indústria de balas e gomas teve um aumento de 19% de produção em relação a 2021. Durante o período de janeiro a dezembro de 2022, as indústrias produziram 287 mil toneladas.

O setor de balas & gomas tem passado por um processo de consolidação desde a retomada do mercado em 2021, avaliou Ubiracy Fonsêca, presidente da Abicab, em abril deste ano.

Em 2022, o resultado de exportação do setor de balas & gomas registrou um volume foi de 105,7 mil toneladas. Em valor, a exportação atingiu US$ 201,5 milhões no ano passado, um aumento de 19% quando comparado aos US$ 168,8 milhões de 2021. Os principais países de destino desses produtos são Estados Unidos, Paraguai e Argentina.

Desafios do mercado

Além da competição acirrada, o mercado de balas e gomas de mascar no Brasil enfrenta alguns desafios, como a carga tributária elevada, o que impacta diretamente os preços dos produtos.

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Há ainda uma mudança no perfil do consumidor. Com a crescente preocupação com a saúde e o bem-estar, consumidores buscam opções mais saudáveis, como balas e gomas de mascar sem açúcar ou evitam doces.

O mercado brasileiro enfrenta também a concorrência de balas e gomas de mascar importadas, que muitas vezes são vendidas a preços mais baixos. Isso pode afetar a participação de mercado das empresas locais e exigir estratégias de diferenciação.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.