Investidor estrangeiro começa a tirar dinheiro da Bolsa do Brasil

Saldo de investimento estrangeiro na Bolsa fica negativo nos primeiros 14 dias de setembro

Tipo de investidor com maior peso nos negócios na B3, o estrangeiro inverte a mão e vende mais do que compra papéis neste mês, até o último dia 14
16 de Setembro, 2021 | 03:29 PM

São Paulo — Os investidores estrangeiros, que respondem por metade do volume de negócios (compras e vendas) na B3, iniciaram neste mês um movimento de retirada de recursos do mercado brasileiro de ações, acompanhando uma tendência iniciada em agosto pelos institucionais (fundos de pensão, seguradoras e assets). O tombo contínuo da ação da Vale, blue chip castigada pela queda de dois dígitos do preço do minério de ferro neste mês, ilustra a maior aversão ao risco.

Nos primeiros 14 dias de setembro, o saldo de investimento estrangeiro na Bolsa aponta uma saída de R$ 19,740 milhões, resultado de vendas (R$ 143,643 bilhões) maiores do que compras de papéis (R$ 143,624 bilhões), segundo os dados mais recentes disponíveis, divulgados pela B3, nesta quinta-feira (16).

Os investidores institucionais seguem, pelo segundo mês consecutivo, reduzindo sua exposição à renda variável. Em setembro, até o pregão da última terça-feira, eles retiraram R$ 2,018 bilhões. O saldo negativo decorre de vendas (R$ 76,124 bilhões) superiores às compras (R$ 74,106 bilhões).

A exemplo dos estrangeiros e dos institucionais, os investidores individuais também estão desmontando posições na Bolsa. Em duas semanas de setembro, venderam R$ 49,817 bilhões, acima do valor das compras (R$ 49,523 bilhões), resultado em uma saída de R$ 294,164 milhões.

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Pessimismo com Ibovespa

Nas últimas semanas, instituições estrangeiras pioraram as projeções para o Brasil. Sondagem feita pela área de pesquisa do Bank of America com 31 investidores da América Latina, por exemplo, aponta que as apostas de o Ibovespa fechar o ano acima de 130 mil pontos diminuíram de 49% dos entrevistados no mês passado para 16%. Hoje, o principal índice brasileiro recuava para nível abaixo de 114 mil pontos.

Os investidores ouvidos pelo BofA elencaram como os maiores riscos para os ativos brasileiros a deterioração descontrolada do quadro fiscal, eleições gerais de 2022, a queda dos preços das commodities, a depreciação do real e a pandemia da Covid-19, com a disseminação de novas variantes e atrasos na vacinação de toda a população.

A gestora de recursos Nova Futura atribuiu a queda do Ibovespa hoje à derrocada do minério de ferro no exterior e ao retorno dos temores políticos, após a CPI da Covid-19 aprovar a convocação de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro.

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Minério de ferro

Desde agosto, o preço do minério de ferro, um dos principais produtos da pauta de exportação do Brasil, sofre pressões regulatórias na China. O metal está em tendência de queda no médio e curto prazo, segundo estudo elaborado pela equipe de macro research do BTG Pactual Digital.

O recuo nos preços de minério de ferro no mercado à vista chinês aconteceu em razão de ações mais rígidas do governo do gigante asiático contra as siderúrgicas em relação às restrições à produção de aço. Destacamos que o preço está nos menores níveis, em dólares, nos últimos 12 meses, ou seja, as pressões recentes fizeram com que a commodity eliminasse todo o ganho durante o rali de preços ocorrido no auge da crise da Covid-19

BTG Pactual Digital

A desvalorização do minério prejudica o desempenho da ação de maior peso (14,477%) na composição da carteira teórica do Ibovespa, o da mineradora Vale. Hoje o papel chegou a cair 2,98%, cravado mínima de R$ 89, menor valor em pelo menos 30 dias, acumulando perdas de quase 18% neste mês. Em 12 meses, a cotação máxima de VALE3 é de R$ 118,11.

Por outro lado, a queda do minério de ferro ajuda a aliviar as pressões inflacionárias. Nesta quinta-feira (16), a FGV (Fundação Getúlio Vargas) divulgou que o IGP-10 (Índice Geral de Preços - 10) caiu 0,37% em setembro. A taxa negativa tem a ver com o comportamento do preço do minério de ferro, que caiu 22,17%”, afirmou André Braz, coordenador dos índices de preços.

Inflação

A preocupação do mercado com a inflação é outro fator que inibe a recuperação do Ibovespa desde agosto, quando acumulou queda (2,48%) pelo segundo mês consecutivo. Segundo Gustavo Berttoti, economista da Messem Investimentos, a política monetária brasileira tem sido contracionista, com o aumento significativo da taxa de juros. “Esse é um fator que gera dúvida sobre a retomada econômica neste segundo semestre”, analisou.

Os economistas apostam em uma maior dose no aumento da taxa Selic, o juro básico da economia, para a próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central, marcada para os dias 21 e 22 deste mês.

Segundo Berttoti, a intensificação dos ruídos políticos do país, com a subida do tom nos embates entre os três poderes, e aumento do risco fiscal, provocado pela decisão do STF de que devem ser pagos precatórios de R$ 89 bilhões em 2022 e pela questão do teto de gastos, compõem o pano de fundo da atual queda livre do Ibovespa e das menores apostas dos investidores no mercado acionário brasileiro.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.