Quem são e o que fazem os generais de confiança de Bolsonaro na campanha

Presidente delegou a quatro generais missões estratégicas na busca pela reeleição; um deles prevaleceu sobre o Centrão como vice da chapa

Jair Bolsonaro, presidente de Brasil, a la izquierda, y Walter Braga Netto, jefe de gabinete de Brasil, llevan una máscara protectora mientras hablan durante un evento en el Palacio de Planalto en Brasilia, Brasil, el viernes 15 de mayo de 2020.
24 de Julho, 2022 | 11:32 AM

Bloomberg Línea — O presidente Jair Bolsonaro foi formalizado neste domingo (24) como candidato à reeleição em convenção nacional do PL no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro. Ao seu lado estava o general Walter Braga Netto, escolhido como vice da chapa na disputa.

A escolha de Braga Netto representa não só uma decisão de Bolsonaro em favor de alguém de sua irrestrita confiança como um dos melhores exemplos da ascensão da ala militar no governo e na campanha eleitoral. A ala política do governo, “personificada” pelo Centrão, por exemplo, defendia a escolha como vice de Tereza Cristina (PP), ex-ministra da Agricultura, que poderia em tese reforçar uma posição mais moderada e algum apelo junto ao eleitorado feminino.

Braga Netto é um dos quatro generais proeminentes do governo Bolsonaro: também estão nesse seleto grupo, que dispõe da confiança do presidente acima da conquistada pelas lideranças do Centrão, Augusto Heleno (chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o GSI), Luiz Eduardo Ramos (secretário-geral da Presidência da República) e Paulo Sérgio Nogueira (ministro da Defesa).

O protagonismo e o aumento do papel das Forças Armadas no governo federal são evidenciados não só em fatos como também em números. Em 2020, eram 6.175 militares no governo, mais que o dobro dos 2.765 que havia em 2018, antes de o governo Jair Bolsonaro (PL) começar, segundo levantamento feito pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

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Daqueles mais de 6 mil militares de 2020, 2.643 estavam em cargos comissionados, ou seja, foram requisitados por algum chefe de órgão ou de ministério. Outros 1.249 estavam lotados no Ministério da Saúde. O levantamento foi feito a pedido pelo ministro Bruno Dantas, hoje vice-presidente do TCU. Na época, ele disse que havia risco de “possível militarização excessiva do serviço público civil”.

Hoje, há militares convocados ao governo que participam da campanha para reeleger Bolsonaro. A liderança cabe aos generais, que costumam ser assessorados por coronéis.

Além de escolhido a vice na reta final da disputa eleitoral, Braga Netto é o único general envolvido na campanha de Bolsonaro de forma oficial, segundo integrantes ouvidos pela Bloomberg Línea ao longo dos últimos dias.

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General da reserva, Braga Netto ficou incumbido na campanha de coordenar os trabalhos em parceria com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho de Bolsonaro, além de ajudar a elaborar o plano de governo.

Braga Netto é hoje um dos generais mais próximos de Bolsonaro. Chegou ao governo em fevereiro de 2020, quando foi nomeado chefe da Casa Civil - a primeira vez que um militar ocupou o cargo desde o fim da ditadura militar, em 1985.

Ficou um ano à frente da pasta e depois foi nomeado ministro da Defesa. Deixou o cargo em 31 de março deste ano, quando se filiou ao PL já diante da possibilidade de ser indicado como vice na chapa de Bolsonaro e tornou-se assessor especial da Presidência da República, cargo que não o impede de concorrer às eleições. A confirmação de que Braga Netto será anunciado como vice de Bolsonaro foi feita pelo próprio presidente, em entrevista ao canal 4x4, no YouTube, no início de julho.

O general Braga Netto desempenhou também papel importante durante a pandemia de covid-19: foi chefe do Centro de Coordenação das Operações do Comitê de Crise da Covid-19, criado pelo Planalto para reunir todos os órgãos envolvidos no combate à pandemia e centralizar as decisões.

Ele foi depois indiciado no relatório final da CPI da Pandemia, na qual o Senado investigou a forma como o governo buscou combater a pandemia e supostos erros nessa condução. Alguns senadores disseram que Braga Netto foi conivente com a suposta postura “negacionista” de Bolsonaro diante da covid. Ele nega as acusações e diz ter documentos que atestam que sua conduta foi correta.

Base de apoio com o Centrão

Informalmente, a campanha também recebe auxílio dos generais Augusto Heleno, Luiz Eduardo Ramos e Paulo Sérgio Nogueira, de acordo com os integrantes da campanha ouvidos pela reportagem. A Bloomberg Línea tentou contato com os generais por meio de suas assessorias de imprensa, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Ramos é atualmente o mais ativo. Cabe a ele a conexão entre a campanha e as Forças Armadas para medir o tamanho do apoio do presidente entre os militares e amealhar sugestões para o programa de governo. Um dos que contribuíram foi o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde durante a maior parte da pandemia.

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O general Ramos é um dos principais articuladores de Bolsonaro. Está no governo desde junho de 2019, quando substituiu o também general Santos Cruz na Secretaria de Governo (Segov).

Foi de Ramos a articulação para a entrada do Centrão na base de apoio de Bolsonaro, a partir de abril de 2020, época em que Bolsonaro já enfrentava mais de 30 pedidos de impeachment. Naquele momento, ele começava a ser acusado de omissão na gestão do combate à pandemia e a responder a inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por causa de suposta interferência política indevida na Polícia Federal. Corria também investigação sobre atos considerados antidemocráticos da qual participou.

A fidelização do Centrão se concretizou um ano depois, quando Ramos foi para a Casa Civil e a deputada Flávia Arruda (PL-DF) foi para a Segov.

O general permaneceu na Casa Civil, responsável pela coordenação do trabalho de todos os ministérios, até julho do ano passado, quando cedeu lugar ao senador Ciro Nogueira (PP-PI), nomeado em uma estratégia de contenção: Bolsonaro vivia um de seus momentos eleitorais mais delicados (nas pesquisas eleitorais para 2022, tinha 21% das intenções de voto contra 48% de Lula, segundo a Quaest), com protestos populares nas ruas e novas ameaças de impeachment no Congresso.

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Nogueira segue no cargo e é o comandante do chamado orçamento secreto, como ficaram conhecidas as “emendas de relator”. É o sistema de distribuição de emendas parlamentares que não identifica os deputados e os senadores que pedem aos relatores do Orçamento no Congresso a destinação de dinheiro a estados e municípios, ao contrário do que acontece com as emendas parlamentares “normais”.

Antes do senador, Ramos também se ocupava da função, conforme documentos enviados pelo Congresso ao Supremo. O general aprovou 26 ofícios com pedidos de recursos da Segov em 2020, de acordo com levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Generais e as urnas eletrônicas

Os generais Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, por sua vez, têm desempenhado papel relevante na frente estratégica de questionamento da segurança e da confiabilidade do sistema eleitoral, uma das prioridades do presidente Jair Bolsonaro no que diz respeito à disputa.

Heleno tem atuação considerada discreta e se dedica mais a municiar a campanha e integrantes do governo com informações sobre o sistema eleitoral. É uma frente que conta também com o apoio de outras esferas de governo. Bolsonaro já teria orientado a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) para ajudar o governo em suas teses contra as urnas eletrônicas, segundo O Estado de S. Paulo.

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A AGU funcionaria como uma espécie de braço jurídico da campanha, atuando nos tribunais, e a CGU atuaria por meio de um representante indicado à Comissão de Transparência das Eleições (CTE), criado pelo TSE, segundo o jornal.

Paulo Sérgio tem sido mais vocal nessa missão entre os generais. No início deste ano, as Forças Armadas enviaram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) 15 sugestões de “aprimoramento” do sistema eleitoral com críticas ao funcionamento das urnas eletrônicas. O tribunal respondeu que acolheu sete das sugestões e deixou duas para eleições futuras.

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Em 14 de julho, o ministro da Defesa foi a uma audiência na Comissão de Fiscalização e Controle do Senado e disse que as informações do TSE “diferem” das dele em relação às alegações de fragilidade no sistema. “Esse número não bate, por vezes, com as considerações do TSE, porque eles têm o ponto de vista deles”, disse o general. Para ele, se a corte adotasse as “sugestões” das Forças Armadas, “resolveria muita coisa”.

O general reconheceu na ocasião que há uma “pressão” das Forças Armadas sobre o TSE. Mas disse que, “com certeza, essa pressão e essas discussões seriam minimizadas se conseguíssemos isso”.

Ele se refere a três sugestões expostas na audiência: teste de integridade, teste de integridade envolvendo as urnas modelo 2020 e “incentivo” a auditoria por entidades externas ao TSE. Todas as práticas já são adotadas pelo tribunal eleitoral há alguns anos.

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Paulo Sérgio também escalou o coronel Marcelo Nogueira de Souza para falar na audiência do Senado. E o coronel foi mais um a colocar em dúvida a segurança das urnas. “No que tange à vulnerabilidade interna, até o momento não temos disponível a documentação que nos leve a formar uma opinião conclusiva que a solução é segura em relação a uma ameaça interna”, disse.

Segundo ele, seria possível que um “código malicioso” seja inserido na urna dentro do TSE e burle os testes feitos pela corte eleitoral.

O TSE afirmou que “não é possível que um código malicioso seja inserido internamente, visto que o código-fonte é continuamente inspecionado pelas instituições que acompanham o desenvolvimento dos programas.

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Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.