Como a Coreia do Sul está vencendo a covid apesar de 600 mil casos por dia

Com foco na testagem e na vacinação - 88% da população - a Coreia do Sul conseguiu conter a maioria das mortes, apesar do altíssimo número de casos

Uma estação de testes Covid-19 fora do Estádio Olímpico de Seul
Por Sangmi Cha
17 de Março, 2022 | 08:41 PM

Bloomberg — A Coreia do Sul atingiu dois marcos pandêmicos aparentemente contraditórios: registrou mais de 600 mil novas infecções por covid-19 na quinta-feira (17), o número mais alto do mundo. Ao mesmo tempo, o país tem uma das menores taxas de mortalidade pelo vírus.

Enquanto em qualquer outro lugar uma infecção desse porte pode sinalizar um surto fora de controle, que logo será seguido por um aumento nas mortes, na Coreia do Sul - que é do tamanho do estado de Santa Catarina - o quadro é mais complexo.

O altíssimo número de casos reflete a implantação consistente de testes em massa no país, amplamente abandonados por muitos lugares, à medida que a covid se torna endêmica, mas uma das principais razões por trás da queda na taxa de mortalidade da Coréia.

Continuar a diagnosticar oficialmente a maioria das infecções permite que a Coreia identifique casos de risco e trate ou hospitalize preventivamente esses pacientes antes que suas condições se agravem.

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Com uma taxa de vacinação de 88% e uma das maiores taxas de doses de reforço do mundo, especialmente entre os idosos, a taxa de mortalidade é de 0,14%. Isso é um décimo das taxas nos Estados Unidos e no Reino Unido, e abaixo de 0,88% há dois meses, mesmo com um aumento de oitenta vezes no número de casos no mesmo período.

A abordagem pouco ortodoxa é típica da resposta da Coreia à pandemia, que está presente desde o início. O país foi pioneiro no uso de testes rápidos e rastreamento de contatos de alta tecnologia, usando as lições aprendidas com epidemias anteriores. Embora tenha tido mais de 8 milhões de casos desde o início de 2020, a Coreia nunca entrou em lockdown e conseguiu superar um início lento da vacinação, com uma visão que não se restringiu à primeira dose, mas que teve como prioridade o fornecimento de reforços, direcionados aos idosos.

O foco na testagem custa caro. O país gastou cerca de US$ 1,3 bilhão em testes de PCR até agora, disse a Agência de Controle e Prevenção de Doenças da Coreia, e agora tem capacidade para realizar um milhão de testes de PCR por dia.

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Mas a recompensa é imensurável, dizem autoridades do governo, já que os hospitais não ficaram sobrecarregados e o sistema de saúde permanece intacto.

Apesar dos casos diários terem subido para 621.328 na quinta-feira (17) - de menos de 9.000 antes do surgimento da variante ômicron no final de janeiro - as hospitalizações apenas dobraram, com a capacidade de unidade de terapia intensiva em 65%.

“Outro ponto crítico na prevenção de mortes é a capacidade da UTI e os hospitais coreanos, que geralmente têm um bom controle da situação”, disse Choi Jae-wook, professor de medicina preventiva da Korea University College of Medicine.

Agora, apesar do maior número de casos do mundo, a queda na taxa de mortalidade faz com que o governo considere afrouxar ainda mais as restrições da pandemia, incluindo a suspensão do limite de seis pessoas em reuniões privadas e a extensão do horário dos restaurantes.

Estratégia de Refinamento

As autoridades de saúde da Coreia do Sul dizem que estão mais bem preparadas para lidar com a dinâmica da pandemia de coronavírus, em parte por causa das lições aprendidas durante o tratamento precário de um surto de Síndrome Respiratória no Oriente Médio, em 2015. Entre as principais lições: seja ágil e responda rapidamente.

Como a ômicron se espalhou no final de janeiro, em vez de ficar sobrecarregada, a Coreia dobrou a quantidade de testes. Como muitos países, a estratégia de teste foi expandida para incluir testes rápidos de antígeno. Mas, ao contrário de outros lugares, aqueles que testam positivo em casa ainda precisam ir a um centro de testes de PCR administrado pelo governo para confirmação.

A partir daí, os casos positivos assintomáticos ou com sintomas leves são obrigados a ficar em quarentena em casa, enquanto os considerados de alto risco de doença grave são encaminhados aos hospitais para atendimento e tratamento.

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“O ideal é usar testes de PCR com alta precisão sempre que possível, mas a adoção do teste rápido de antígeno é uma medida para proteger o grupo de alto risco que tem maior chance de adoecer gravemente”, o KDCA disse em um comunicado.

Vacinação dos Idosos

Ao mesmo tempo, a Coréia intensificou sua distribuição de vacinas depois de inicialmente ficar para trás, concentrando atenção especial na inoculação de idosos e indivíduos de alto risco. Quase 86% da população estava totalmente vacinada quando a ômicron começou a se espalhar, com mais de 90% das pessoas com 60 anos ou mais já tendo recebido a dose de reforço.

“A taxa de mortalidade é próxima de zero entre aqueles com 60 anos ou menos que receberam a terceira dose”, disse Park Hyang, diretora-geral do departamento de prevenção e gerenciamento de resposta antiepidêmica do Ministério da Saúde, em um briefing nesta semana.

A maioria das mortes ocorreu entre o pequeno grupo de idosos que não foram vacinados. Aqueles com 60 anos ou mais que não foram inoculados têm dez vezes mais chances de morrer do que aqueles que receberam reforços, disse ela.

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Mas, apesar da queda na taxa de mortalidade, Choi, da Faculdade de Medicina da Universidade da Coreia, alertou estar muito cedo para suspender a obrigatoriedade do distanciamento social e outras restrições pandêmicas.

Outros países, incluindo os EUA e o Reino Unido, estão abandonando as restrições à medida que as populações se sentem mais confortáveis para conviver com a covid, mesmo em um momento em que o número de casos e as mortes voltam a aumentar novamente.

Afrouxar as medidas de prevenção da doença agora inevitavelmente levará a mais mortes e casos críticos, e o governo não deve ser o único a julgar que está tudo bem apenas porque há leitos de UTI suficientes”, disse Choi. “Eles devem notificar e repassar as precauções com antecedência ao público.”

– Esta notícia foi traduzida por Marcelle Castro, localization specialist da Bloomberg Línea.

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