Copa do Mundo cria dilema para chefes sobre jogos no horário de trabalho

Enquanto milhões de trabalhadores buscam uma maneira de assistir às partidas, gestores avaliam pontos como produtividade ou melhora do ambiente

A Copa do Mundo é o evento com maior audiência do planeta, estimada em 5 bilhões de pessoas neste ano
Por Jo Constantz
09 de Dezembro, 2022 | 12:02 PM

Bloomberg — Enquanto as partidas da Copa do Mundo acontecem de forma dramática, cativando a atenção internacional e até diminuindo os volumes de negociação em Wall Street, chefes em todo o mundo enfrentam um dilema: permitir ou não que seus funcionários assistam aos jogos.

Com uma projeção de 5 bilhões de espectadores – mais da metade da população mundial – e muitas partidas disputadas durante o horário comercial, o evento de 28 dias tem algumas implicações para o mundo do trabalho.

Quase 40% dos horários das partidas da Copa do Mundo se sobrepõem ao trabalho no Reino Unido - definido como de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h. E quase metade conflita com o horário comercial dos Estados Unidos, de acordo com uma análise da empresa de software InvGate.

No Twitter, centenas de fãs de futebol estão compartilhando sua alegria (ou frustração) por poder assistir no trabalho (ou não). A plataforma está repleta de histórias de trabalhadores rebeldes: caixas com telefones apoiados para transmitir a ação, colegas amontoados em salas de conferência comemorando em silêncio e algumas almas ousadas isoladas em banheiros para sintonizar com o volume máximo.

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Na Suíça, funcionários do cantão de Basel-Landschaft receberam um e-mail severo proibindo-os de assistir por streaming a Copa do Mundo depois que eles travaram a rede Wi-Fi durante a partida de abertura do país contra Camarões, interrompendo temporariamente os serviços do governo.

No Brasil e na Argentina, onde o futebol é poderoso o suficiente para transformar dias de jogo em feriados não oficiais, alguns expatriados recorreram às redes sociais para reclamar sobre como isso se traduziu em dias sem aula. “Agora estarei torcendo por uma eliminação rápida para a seleção”, brincou um pai de São Paulo no Twitter.

No Reddit, um gerente do Reino Unido fez a pergunta em um post que até agora gerou mais de 900 comentários. O comentário principal, com mais de 3.000 votos positivos: “Equipe mais feliz = melhor local de trabalho. É uma pena que a maioria dos gerentes não tenha percebido isso.”

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Como muitos comentaristas observaram, mesmo que proibidos de assistir durante o horário comercial, muitos funcionários provavelmente contornarão essas regras assistindo a jogos ao vivo em seus notebooks de trabalho junto com suas planilhas do Excel ou chamadas de Zoom, especialmente se estiverem trabalhando remotamente ou simplesmente ligando para dizer que estão doentes (esta última estratégia pode colocar seu emprego em risco, alertam os escritórios de direito trabalhista).

Ainda assim, a plataforma de monitoramento de produtividade ActivTrak disse que seus dados mostram que os funcionários continuam trabalhando em níveis quase iguais às semanas fora da Copa do Mundo. Dados de mais de 4.500 trabalhadores baseados nos EUA no dia do confronto entre a seleção desse país e País de Gales, que aconteceu na tarde de uma segunda-feira às 14h no horário de Nova York, não mostrou nenhuma queda clara dos negócios como de costume com base nas medidas observadas pelo ActivTrak.

Trabalho ‘mais tarde’

Mas, mesmo que não haja mudança em quanto trabalho é realizado, há alguma evidência de que houve uma mudança em quando ele é feito.

A Hive.com, outro sistema de rastreamento de produtividade, apontou uma grande mudança para o trabalho sendo feito no final do dia, embora tenha havido apenas uma queda nominal na atividade geral até agora durante o torneio.

A empresa percebeu um aumento de produtividade entre 15h e 18h (horário de Nova York), já que a maioria dos jogos está terminando, bem como um aumento modesto nas atividades noturnas. A Hive, cujos dados incluem criação e conclusão de tarefas e outras atualizações de status, observou um declínio de 30% na atividade em seus espaços de trabalho enquanto a equipe dos EUA jogava contra o Irã.

Nesta semana, gestores de equipes tiveram um breve alívio: nenhum jogo foi agendado para quarta ou quinta-feira. O torneio recomeça com as partidas das quartas de final nesta sexta (9).

As semifinais serão realizadas na próxima terça (13) e quarta-feira (14), às 16h (horário de Brasília), e a final será disputada no domingo seguinte - uma vitória para gestores de todos os lugares.

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Daqueles trabalhadores que planejam assistir à Copa do Mundo no Reino Unido, quase 16% disseram que planejavam sintonizar a partida de 21 de novembro entre Inglaterra e Irã - uma disputa na tarde de segunda-feira - no expediente com a permissão de seu gerente, de acordo com uma pesquisa YouGov.

Enquanto isso, 13% planejavam tirar folga para a partida e 9% disseram que pretendiam faltar ao trabalho para assistir sem avisar o chefe (um terço das pessoas entrevistadas disse que não estava escalado para trabalhar na hora da partida e então não precisou lidar com o conflito de agenda).

Enquanto Inglaterra x Irã aconteceu às 13h (no horário de Londres), perfeito para uma pausa para o almoço, o jogo do País de Gales contra o Irã em uma sexta-feira foi realizado às 10h, muito menos conveniente.

O jornal The Guardian aconselhou torcedores que pretendiam assistir aos jogos no trabalho a praticar expressões de dissimulação, a marcar reuniões em paralelo ao horários das partidas e a criar atalhos em computadores para ocultar rapidamente as guias abertas da internet. E até mesmo investir em um mini espelho retrovisor para que os supervisores não os pegassem de surpresa.

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‘Você é adulto’

Michaela Ricketts, recrutadora do Reino Unido para a HackerOne, uma empresa global de segurança cibernética, estava vendo o debate se desenrolar no LinkedIn: um lado dizendo que as pessoas não deveriam assistir durante o horário de trabalho e o outro lado argumentando que isso pode estimular o trabalho posterior em equipe.

Ricketts interrompeu a discussão: “se você quiser assistir, legal - certifique-se de reservar em seu calendário. Se você não quiser assistir, tudo bem também!”

O HackerOne opera de forma assíncrona, para que seus funcionários façam seu trabalho em seu próprio tempo, comunicando-se com os colegas quando estão trabalhando por meio de seus calendários. Isso significa que eles estão livres para assistir a uma partida no meio do dia e simplesmente terminar as tarefas no início ou no final do dia, sem se preocupar em manter a aparência de produtividade.

“Você é um adulto”, disse Ricketts. “Você não precisa esconder que está assistindo a Copa do Mundo.”

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Diversão no escritório nos EUA

Embora a fase de mata-mata (jogos eliminatórios) da Copa do Mundo seja particularmente forte na Europa e na América Latina, sua popularidade nos Estados Unidos está aumentando.

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Quase 60% dos fãs de futebol dos EUA planejam assistir neste ano, de acordo com uma pesquisa da Morning Consult realizada no mês passado, acima dos 45% que relataram assistir em 2018. Quanto à população dos EUA em geral, cerca de um quarto espera assistir “alguns” ou “muitos” jogos.

‘Copa é um investimento para o time’

Robin Pou, coach executivo e fundador de uma empresa de desenvolvimento de liderança com sede em Dallas, disse que recentemente procurou 30 líderes com quem trabalha para convidá-los a assistir à Copa do Mundo, e todos disseram que não, pois estavam muito ocupados.

“Entendo, foi no último minuto [o convite], eles podem não gostar de futebol, mas apenas surgiu em mim esse tipo de questão existencial de liderança”, disse Pou. “Por que estamos trabalhando tanto?” ele disse, descrevendo clientes que reclamam de exaustão e esgotamento ao sair de uma crise pandêmica e entrar em uma recessão.

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É uma visão míope se preocupar com a perda de produtividade quando as pessoas dedicam tempo para construir relacionamentos e se divertir um pouco no escritório, costuma dizer Pou aos CEOs. Ele os incentiva a pensar nas duas horas necessárias para assistir a uma partida como um investimento em relacionamentos.

“É uma solução real para um desafio atual que ouço de todos os líderes de todos os setores e organizações de todos os tamanhos”, disse ele. “É útil, e não apenas fofo.’’

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