Ativos brasileiros decolam com eleição. Analistas contam o que esperar a seguir

Menor diferença de pontos entre Lula e Bolsonaro contribui para um otimismo dos mercados, que esperam discursos mais moderados no segundo turno

Congresso Nacional terá uma composição mais à direita a partir de 2023 do que o projetado por analistas políticos
03 de Outubro, 2022 | 12:24 PM

Bloomberg Línea — Impulsionada por uma disputa mais acirrada do que a prevista no primeiro turno das eleições presidenciais, a bolsa brasileira operou com forte alta nesta segunda-feira (3).

Com uma disparada de 5,54% do Ibovespa (IBOV) no fechamento, a sessão foi de ganhos para as estatais, com alta de 8,86% e 7,99% para as ações ordinárias e preferenciais, respectivamente, da Petrobras (PETR3; PETR4); e de 7,63% para as do Banco do Brasil (BBAS3), em reação ao desfecho das urnas.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) liderou as votações, como previsto, fechando a primeira fase do pleito com 48,43% dos votos. A surpresa veio do atual mandatário, Jair Bolsonaro (PL), que chegou na segunda colocação com 43,20%, em uma posição mais vantajosa do que o projetado pelas pesquisas até então.

A menor diferença de pontos entre Lula e Bolsonaro contribui para um otimismo dos mercados, que veem discursos mais moderados e de centro de ambos os candidatos no segundo turno, a ser realizado em 30 de outubro.

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Além disso, apesar de a cena externa ter tido mais peso sobre os ativos domésticos nos últimos meses, diferentemente de eleições anteriores, a avaliação é de que as próximas quatro semanas até o segundo turno deverão ser mais voláteis para ativos de risco, com sinalizações de ambos os lados podendo impactar o desempenho da bolsa.

Confira, a seguir, a avaliação de economistas e estrategistas sobre o resultado do primeiro turno das eleições e o impacto na bolsa:

Ativa Investimentos

Na avaliação da Ativa Investimentos, um resultado do primeiro turno mais apertado do que o esperado aumenta a possibilidade de reeleição do presidente ou de um Lula mais ao centro, podendo trazer uma equipe econômica mais responsável à questão fiscal. A casa destaca uma possibilidade de anúncio da equipe econômica antes do dia 30 de outubro.

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“O evento da eleição, por si só, era o que mais pesava na bolsa e com um primeiro turno mais apertado e um legislativo que pode trazer mais equilíbrio, numa eventual vitória de Lula, afasta riscos maiores à agenda econômica. Esperamos então que a percepção de risco se reduza bastante e que a bolsa possa experimentar uma alta relevante nos próximos dias”, escreve o time.

Em nota, o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, afirma que ainda que a vitória de Bolsonaro tenha ganhado probabilidade, dado o desempenho forte do atual presidente, o cenário mais provável ainda é de vitória de Lula no segundo turno.

“Para se ter uma ideia de quão forte foi o resultado de Lula no primeiro turno, o candidato petista precisa de apenas 1,8 milhão de votos para se consagrar presidente. Supondo votos válidos constantes para o segundo turno – o que já é uma hipótese forte –, restaria cerca de 10 milhões de votos em disputa”, escreve.

Credit Suisse

Em relatório divulgado nesta segunda (3), o Credit Suisse diz ver um primeiro turno favorável para companhias do setor de utilities na bolsa brasileira.

“Esperamos uma reação positiva da Sabesp (SBSP3), pois Tarcísio de Freitas é considerado favorável ao mercado e pró-privatização. No caso da Copasa e de outras empresas estatais em Minas Gerais, a reação deve ser ligeiramente positiva com a confirmação do atual status quo pró-privatização e abordagem de mercado, mas não uma surpresa, pois o mercado já esperava a reeleição do governador”, escreve.

Com relação à eleição presidencial, o banco diz que empresas de utilities poderiam se beneficiar de uma percepção de risco menor, pois a concorrência é mais acirrada do que o previsto. “Acreditamos que os candidatos provavelmente serão mais cautelosos em qualquer agenda para cativar os eleitores de centro, favorecendo assim o respeito aos contratos e ao marco regulatório”, avalia o time do Credit Suisse.

Segundo os analistas, Eletrobras (ELET3; ELET6) poderia ser um nome favorecido nesse cenário.

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HCI Invest

Para Pedro Patrão, economista e sócio da HCI Invest, independentemente de quem vencer a disputa eleitoral, a principal preocupação dos investidores para o próximo governo seguirá sendo a agenda fiscal e a trajetória dos gastos públicos.

“Os dois candidatos fizeram campanha por mais gastos nas contas públicas e o presidente eleito terá esse desafio à frente, de como equilibrar as contas públicas e a trajetória futura da dívida”, diz.

Segundo Patrão, embora os níveis de volatilidade tenham sido mais contidos do que em eleições anteriores, com o mercado doméstico reagindo mais a fatores externos que políticos, não é descartada uma maior volatilidade entre o primeiro e segundo turnos.

“Achamos que a passagem do evento das eleições pode trazer uma descompressão de risco. Com um caminho mais claro, o apetite ao risco pode voltar e isso deve sustentar ainda mais o desempenho superior do Ibovespa em relação aos demais mercados”, avalia.

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RB Investimentos

Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, o segundo turno é bem visto pelo mercado financeiro.

“O mercado entende que no primeiro turno os candidatos estão disputando com outros que têm uma linha de pensamento, filosofia parecida, mas no segundo turno não, é preciso conquistar um eleitor que já não é seu, muitas vezes indeciso e de centro”, disse.

Segundo Cruz, para conquistar o eleitor de centro, tanto Bolsonaro quanto Lula terão que amenizar um pouco os discursos, com Bolsonaro dando mais acenos à questão ambiental e Lula, à questão econômica. “Lula vai ter que começar a dar mais pistas do que faria [no âmbito econômico] e tirar algumas das polêmicas envolvendo estatais e reformas”, avalia.

Segundo o estrategista, como uma disputa em segundo turno, o cenário para a bolsa brasileira tende a ser diferente. “Talvez o rali não seja tão forte em outubro para alguns setores; ele pode ficar mais para novembro e dezembro.”

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Em setembro, diz, os grandes destaques foram os setores de educação e de construção civil, em especial o voltado para baixa renda. Isso porque o mercado estava antecipando uma possível vitória de Lula, que falou em revigorar o Fies e em deixar o programa Minha Casa Minha Vida “mais intenso”.

“Agora, com um segundo turno e com Bolsonaro tendo chance de vitória, talvez as estatais sejam destaque (Banco do Brasil e Petrobras), além dos setores de agronegócio e frigoríficos, principalmente após falas de Lula de que ele restringiria a exportação de carne, embora o setor também tenha tido impactos externos em setembro por uma demanda mais fraca”, disse.

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Cruz chama a atenção para o grande descolamento das pesquisas em relação ao resultado final das urnas. “As pesquisas erraram muito, então o mercado financeiro não vai mais conseguir se apoiar tanto nelas quanto antes”, vai ter que achar outros meios, disse.

De forma geral, estrategista da RB Investimentos diz ver um segundo turno como positivo. “Qualquer que seja a vitória, será mais pé no chão e menos ‘carta branca’ para fazer o que quiser num possível mandato.”

Warren

Em uma pesquisa da Warren com agentes de mercado após o desfecho das urnas no primeiro turno, 54,8% avaliaram o resultado como melhor do que o esperado, 30,8% em linha e 14,4% como pior do que o previsto.

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“Com isso, tudo o mais constante, as principais posições de nossa carteira deverão ser favorecidas com o evento de ontem”, escreveu o time de alocação da casa.

Dentre as implicações políticas, a Warren escreve que independente de quem seja eleito, o novo presidente terá que convergir ao centro para negociar com o Congresso. “O cenário base de vitória do Lula não mudou, mas a disputa está em aberto.”

XP Investimentos

Em relatório, os estrategistas da XP Fernando Ferreira e Jennie Li escrevem que o resultado mais apertado do que o esperado das urnas foi bem recebido pelos investidores.

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“O pleito segue em aberto para o 2º turno, e o mercado deve acompanhar de perto as próximas evoluções dos candidatos e suas propostas. Isso pode vir a elevar um pouco a volatilidade do mercado, que segue em um patamar baixo em relação ao histórico durante períodos eleitorais”, escreve o time.

Eles destacam que as eleições do Congresso nacional também indicam uma força relevante dos partidos de Centro e de Direita, o que indica que o próximo presidente, seja ele Lula ou Bolsonaro, terá que seguir negociando com a Câmara e o Senado nas pautas mais importantes.

Dentre as ações e setores que tendem a ser mais sensíveis às eleições estão as estatais – como Petrobras (PETR3; PETR4) e Banco do Brasil (BBAS3) –, e setores domésticos como educação, imobiliário e varejistas.

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Além disso, papéis ligados às eleições estaduais também podem ter bom desempenho por conta da eleição de candidatos da direita, segundo a XP, como Sabesp (SBSP3), com o forte resultado do candidato Tarcísio de Freitas no 1º turno, Cemig (CMIG4), com a reeleição do governador Zema, e Banrisul (BRSR6), com o 2º turno entre Onyx Lorenzoni e o ex-governador Eduardo Leite.

A XP afirma que segue vendo a bolsa brasileira como atrativa, negociando em um indicador de preço sobre lucro (P/L) de 6,6 vezes, um desconto de 40% em relação à média histórica.

Os estrategistas reforçam, contudo, que o cenário global segue desafiador, o que pode também seguir pesando nos ativos brasileiros nas próximas semanas, durante o segundo turno.

- Matéria atualizada às 18h com o fechamento dos mercados.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.