Entenda as consequências do fim da CPI da Pandemia no Senado

O dano político ao governo é mais provável, mas processos e responsabilizações judiciais são ainda incertos

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18 de Outubro, 2021 | 05:50 PM

A CPI da Pandemia deverá concluir seus trabalhos no próximo dia 26, com a votação do relatório do senador Renan Calheiros (MDB-AL). A leitura do relatório estava prevista para amanhã, terça (19), mas foi adiada para a quarta (20). A votação ficou para a semana seguinte.

De acordo com o relator, o presidente Jair Bolsonaro deverá ser apontado como responsável de ao menos 11 crimes – ainda há dúvidas sobre a imputação ao presidente por genocídio de povos indígenas, por conta da pandemia, de acordo com senadores que integram o G7, grupo de oposicionistas que dominou a pauta da CPI.

Nesta segunda (18), a CPI ouviu familiares de vítimas da Covid-19. Depoimentos emocionados de familiares ganharam as redes sociais e o noticiário dos canais de notícia – gerando desgaste para o presidente.

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Filho mais velho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) reagiu contra a estratégia de levar as vítimas à comissão para depoimentos transmitidos ao vivo: “O que estamos vendo é macabro, triste e lamentável. Pessoas foram escolhidas a dedo para virem à CPI e falarem mal do presidente Bolsonaro. Pessoas com histórico de militância contra Bolsonaro (...) É um desrespeito com as quase 600 mil vítimas deste vírus aqui no Brasil”.

Aqui estão as principais questões envolvendo a CPI, que apurou a responsabilidade do governo federal na gestão da crise da Covid-19, doença que provocou a morte de 603 mil pessoas desde o ano passado:

#1 – Quais foram as conclusões da CPI?

O objetivo da CPI era investigar erros do governo federal na pandemia, sobretudo a partir do colapso do sistema de saúde de Manaus, onde pacientes morreram sem oxigênio no final do ano. No curso de seis meses da investigação surgiram indícios de irregularidades na compra de vacinas e infrações a medidas sanitárias.

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O relatório de Renan Calheiros deverá responsabilizar ao menos 60 pessoas por condutas ativas ou de omissão que causaram mortes no país. O foco do relator, que é da oposição a Bolsonaro, recairá sobre o próprio presidente Bolsonaro, sobre o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e sobre Élcio Franco, número 2 de Pazuello no ministério.

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Entre as imputações penais que o relator deve fazer ao presidente, segundo declarações do relator e documentos que foram publicados pela imprensa nos últimos dias, estão os crimes de epidemia com resultado em morte e de infração a medidas sanitárias, ambos previstos no Código Penal.

Há dúvidas qual será o grau de responsabilização penal que o relator pedirá contra Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, filho do presidente suspeito de participar da gestão de um gabinete paralelo que seria o responsável de fato pelas ações do governo no enfrentamento à crise sanitária.

Jair Bolsonarodfd

#2 – O que acontece depois da votação do relatório?

A leitura e a votação do relatório final são as últimas etapas da CPI, que foi aberta em abril, por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal). Depois da votação do relatório, a CPI é dissolvida.

#3 – O relatório terá consequências jurídicas?

No caso de acusações de ilícitos civis e penais, o relatório deve ser enviado ao Ministério Público Federal, que vai avaliar se existem ou não elementos suficientes para oferecimento de denúncia (formalização de acusação e pedido de abertura de processo judicial).

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No caso de autoridades com prerrogativa de foro por função federal, como o presidente, as conclusões da CPI de eventuais ilícitos seguem para a Procuradoria-Geral da República, que deve decidir se oferece denúncia, arquiva o pedido ou se pede novas investigações.

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), e o relator, Renan Calheirosdfd

#4 – O presidente pode responder processos criminais com base nas conclusões da CPI?

Depende do procurador-geral da República, Augusto Aras, que vai decidir, com base nas informações da CPI, se há informações para denunciar o presidente. Em caso positivo, uma eventual denúncia teria que ser analisada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

#5 – E impeachment?

Se a CPI apontar indícios de que o presidente cometeu crime de responsabilidade, o foro para processar o presidente seria o Congresso Nacional. Primeiramente, caberia ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidir se acolhe ou não o pedido de abertura de impeachment.

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Em termos práticos, é muito difícil que as conclusões da CPI levem a processo de impeachment. Trata-se de um processo constitucional, que tem um elemento político, além do componente jurídico. Falta menos de um ano para a eleição e o presidente da Câmara não deu nenhum encaminhamento aos mais de 120 pedidos de impeachment já apresentados.

#6 – O que diz o governo da atuação na CPI?

O presidente Jair Bolsonaro e sua base aliada insistem que a CPI tem um viés político para prejudicá-lo a qualquer custo. O presidente tem insistido que a gestão da crise ficou a cargo dos Estados e municípios por causa de uma decisão do STF no ano passado que reafirmou a responsabilidade das três esferas da Federação no enfrentamento da pandemia. O Planalto nega que tenha havido irregularidades ou atraso na compra de vacinas.

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.