Real estate rural: como a BrasilAgro saiu da tese para 320 mil hectares de terras

Empresa que tem o fundador da Cyrela, Elie Horn, como sócio vê oportunidade para consolidar o mercado de compra e venda de propriedades agrícolas, hoje muito pulverizado

BrasilAgro, listada na B3, tem como plano consolidar mercado de compra e venda de terras agrícolas
21 de Agosto, 2023 | 04:45 AM

Bloomberg Línea — Diferentemente do setor imobiliário tradicional, que já é amplamente explorado no país, o mercado de compra e venda de terras agrícolas ainda é fragmentado e pouco consolidado. Atentos à oportunidade de crescer nessa área, fundos imobiliários e empresas especializadas têm expandido as operações e os investimentos. Uma delas é a BrasilAgro (AGRO3) – uma das raras companhias do agronegócio listadas na B3 –, que já acumula 320 mil hectares adquiridos, com uma estratégia que combina custo de oportunidade na aquisição de propriedades com investimentos em produtividade.

Para a safra 2022/2023, a companhia planeja investir R$ 85 milhões em tecnologia, infraestrutura e transformação de área. O montante não inclui desembolso para aquisições.

“A agricultura brasileira é feita, hoje, em cerca de 9% do território nacional. O país continua com boas oportunidades”, afirmou o CEO da BrasilAgro, André Guillaumon, em entrevista à Bloomberg Línea.

A companhia foi fundada em 2006 a partir de uma tese de investimento. O plano saiu do papel por meio da Cresud, holding de negócios imobiliários da Argentina que já atuava na compra e venda de terras agrícolas, e do fundador da Cyrela (CYRE3), Elie Horn. O executivo detém hoje 5,8% do capital da companhia, enquanto a Cresud é dona de 34,4%. A Charles River Capital, gestora carioca de Camilo Marcantonio, tem outros 8,39%.

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Guillaumon contou que, antes da oferta pública inicial de ações (IPO), no mesmo ano de 2006, a BrasilAgro não tinha patrimônio, apenas uma ideia de adquirir propriedades rurais, colocar capital intensivo, gestão e transformar esses imóveis para, em um segundo momento, vendê-los.

“Normalmente as empresas nascem, crescem e depois vão ao mercado de capitais. Identificamos que não havia ninguém fazendo real estate rural [no Brasil]. Somos a primeira empresa a fazer o IPO de um plano de negócios [no país]”, disse. “Começamos com um cheque de R$ 500 milhões e hoje temos mais de R$ 3 bilhões em propriedades”, acrescentou.

Desde então, a BrasilAgro acumula o equivalente a 320 mil campos de futebol em terras adquiridas. As ações tiveram alta de 105% desde a abertura de capital, mas caíram 21% em 2023.

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Guillaumon afirmou que, quando a empresa foi criada, o cenário do agronegócio também era outro no país.

“O Brasil produzia pouco mais de 100 milhões de toneladas de grãos há 15 anos e hoje devemos ultrapassar 300 milhões de toneladas. Diante da necessidade de expansão da oferta global de commodities, o Brasil tem um potencial gigantesco. Poucos lugares no mundo têm a possibilidade de ter safra e safrinha”, disse o executivo ao se referir às duas colheitas que costumam acontecer no mesmo ano.

Ele avaliou que o mercado imobiliário rural no país é altamente pulverizado, com pouca profissionalização. Segundo o executivo, o racional por trás do negócio da BrasilAgro é buscar terras com oportunidade de expansão de área, produtividade, em regiões com chuvas regulares.

Para essa tarefa, a empresa tem uma equipe dedicada à prospecção de novos negócios. De acordo com Guillaumon, ao longo dos anos a empresa acumulou um banco de dados significativo.

“Mais de 4% do território nacional já foi oferecido para nós, temos milhões de hectares em nosso banco de dados.” A prospecção da empresa, conforme o executivo, é mais “passiva”. “Na maioria das vezes, são ofertas que chegam para nós. A prospecção ativa não necessariamente traz os melhores negócios.”

A partir daí, uma equipe trabalha para identificar, em diferentes níveis, as características do ativo, como chuvas na região, bioma, solo, entre outros mapeamentos de maneira remota. “Temos tecnologias próprias para fazer esse trabalho”, explicou.

O resultado desse levantamento é repassado para a área operacional, que contribui com informações sobre investimentos necessários para melhorar o ativo e, lá na frente, executar a transação.

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Produção de grãos

Em paralelo ao processo de compra e venda de terras, a BrasilAgro possui uma área de produção de grãos nas fazendas adquiridas. O objetivo é desenvolver o ativo para que possa ser vendido no futuro. O período de maturação das propriedades gira em torno de 5 a 8 anos.

“Nossa taxa média ponderada de retorno está na casa dos 20%”, disse Guillaumon. Atualmente, metade da receita da companhia é proveniente da produção agrícola, e o restante, do real estate.

Desde a fundação da companhia, já são 27 fazendas negociadas, com um total de 107,6 mil hectares. A última venda ocorreu em junho desse ano. A BrasilAgro vendeu 4.408 hectares da Fazenda Jatobá, no município de Jaborandi, interior da Bahia, por cerca de R$ 121 milhões.

A propriedade foi comprada em 2007. Desde então, a companhia investiu R$ 70,4 milhões no ativo, incluindo aquisição e desenvolvimento. A fazenda possuía uma área de 31.606 hectares, dos quais 22.738 foram vendidos pelo valor total de R$ 497,9 milhões.

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Na visão de Guillaumon, o modelo de negócio da BrasilAgro é um dos seus diferenciais. Segundo o executivo, geralmente a companhia compra as propriedades à vista. “Quem está no mercado de capitais tem acesso a um custo do dinheiro mais barato e assim conseguimos vender um pouco melhor”, disse.

O CEO da BrasilAgro, André Guillaumon, vê a empresa como grande consolidadora do mercado de compra e venda de terras agrícolasdfd

Já as vendas são feitas em sacas de soja, para evitar riscos. “Geralmente fazemos nossas vendas com um sinal de 20% e mais três ou quatro parcelas. Vendemos a prazo e recebemos em sacas de soja”, afirmou.

Na avaliação do analista da Suno Research João Daronco, o grande ponto positivo da BrasilAgro é justamente ter a propriedade das terras, o que garante ativos reais para a companhia. Por outro lado, a alta exposição a commodities agrícolas pode ser um fator negativo, a depender de eventos climáticos.

“A empresa deve ter na safra 2022/2023 margens menores, principalmente devido aos impactos de fertilizantes e defensivos agrícolas, que foram comprados a preços mais caros para serem usados na próxima temporada”, avaliou o especialista.

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Guillaumon reforçou que a companhia quer continuar sendo líder no negócio imobiliário. “Cada vez mais vejo um nicho gigante na área. As famílias do setor agrícola crescem e muitas querem sair da atividade, mas, em vez de saírem por completo, podemos comprar a fazenda, e o proprietário, continuar sendo um acionista e receber dividendos”, disse.

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.