Como os cortes de custos afetam as big techs no Brasil

Empresas de tecnologia se adequam à nova realidade com virada do mercado nos Estados Unidos e em outras partes do mundo com demissões e controle de despesas

Google lidera a ocupação de novos escritórios de alto padrão em São Paulo neste ano, ao mesmo tempo em que busca ampliar a eficiência da operação com a fusão de áreas como a de mapas virtuais
11 de Dezembro, 2022 | 12:14 PM
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Bloomberg Línea — Além da perspectiva de carreira em uma das áreas que mais crescem da economia e dos salários, trabalhar em uma gigante da tecnologia significou nos últimos anos ter acesso a pacotes generosos de benefícios.

No maior escritório do Google (GOGL) na América Latina, por exemplo, os funcionários desfrutam de três restaurantes onde podem almoçar, além de copas, sala de jogos e ambiente de “descompressão” com videogames, mesa de pingue-pongue, sinuca e cafeterias nos quatro andares no Edifício Pátio Malzoni, na da Faria Lima, que também é ocupado por banqueiros do BTG Pactual (BPAC11).

Embora não tenha anunciado demissões em massa como Twitter (TWTR), Meta (META) e Amazon (AMZN), o Google desacelerou novas contratações e está cortando custos, como a que envolve a fusão recém-anunciada dos times do Waze com o Google Maps.

Em comunicado à Bloomberg Línea, o Google disse que “continua profundamente comprometido com a marca Waze, seu aplicativo único e sua próspera comunidade de voluntários e usuários”.

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“Ao trazer a equipe do Waze para o portfólio de produtos de mapeamento de Geo, como Google Earth, Street View e Google Maps, as equipes se beneficiarão de uma maior colaboração técnica, ao mesmo tempo em que oferecem aos usuários as mesmas experiências que eles já conhecem”, disse a empresa.

A Bloomberg Línea conversou com uma pessoa com experiência em trabalhar em big techs no Brasil, que pediu para não ser identificada, que disse as “mordomias” oferecidas aos funcionários vinham como contrapartida das grandes margens de ganhos dessas empresas. São orçamentos grandes para áreas fora do negócio principal, em uma cultura que gerava “um pouco de desperdício”.

“Cria-se um grupo de mimados”, disse essa pessoa, contando que já viu funcionário reclamando porque tinha acabado o açaí do escritório que tinha geladeiras com sorvetes, energéticos e refrigerantes à vontade, e pessoas demandando da empresa benefícios como congelamento de óvulos.

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O Facebook, que faz parte da Meta, por exemplo, tinha um curador de arte para ajudar na decoração do escritório e as viagens corporativas dos funcionários eram em classe executiva, segundo essa pessoa familiarizada com o assunto, que pediu anonimato porque as conversas são privadas.

Mas, quando há uma crise global com aperto monetário e o crescimento desacelera, as empresas são obrigadas a buscar eficiência. A empresa holding do Facebook recentemente anunciou que está cortando mais de 11 mil empregos, na primeira grande rodada de demissões na história da empresa.

Os cortes também afetaram o Brasil, em áreas que vão desde produtos até vendas e parcerias. A Meta não divulgou o número de demissões no país, mas uma planilha que circula no LinkedIn com nomes dos demitidos tem ao menos 80 pessoas afetadas pela política de cortes.

Corte de custos

A virada das condições de mercado e a desaceleração do crescimento pegam empresas de tecnologia em um momento em que elas estão - ou estavam - liderando a ocupação de andares em edifícios de alto padrão, conhecidos como A e A+, em particular na região da Faria Lima.

O Google é a empresa à frente desse ranking neste ano, segundo levantamento realizado pela SiiLA, empresa de análises do mercado imobiliário comercial, com dados até o terceiro trimestre.

O Google alugou mais de 14,8 mil metros quadrados neste ano. Foram 8 mil metros quadrados em um dos dois prédios de altíssimo padrão da São Paulo Corporate Towers, na Vila Olímpia, e mais de 6,4 mil no Sky Corporate. No ano passado, já havia expandido a área ocupada no Pátio Malzoni.

Em segundo lugar na ocupação de escritórios de alto padrão na cidade de São Paulo ficou a Shopee, do grupo Cingapura Sea, que tem a gigante chinesa Tencent como maior acionista.

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A empresa asiática de e-commerce acertou a locação de 13,9 mil metros quadrados no Berrini One e no Faria Lima Plaza. Por outro lado, a Shopee recentemente deu um passo para trás na estratégia para a América Latina, dizendo que terá foco no Brasil, o mercado com melhor desempenho.

A Shopee tem 12% de participação de visitas mensais entre os 10 maiores sites de e-commerce do Brasil, segundo a pesquisa Beyond Borders 2022-2023 da empresa de pagamentos Ebanx. Fica atrás do Mercado Livre (MELI34), que tem 21%, e da Amazon, com 16%.

Em terceiro lugar em novas locações ficou a Kavak, startup mexicana que alugou 9 mil metros quadrados no Parque da Cidade. A empresa de tecnologia de capital fechado mais valiosa da América Latina, por outro lado, também anunciou recentemente cortes de pessoal, inclusive executivos no México, seu mercado originou, conforme a Bloomberg Línea reportou.

No início do ano, a startup mexicana de compra e venda de carros usados por meio de plataforma digital tinha alcançado 8 mil funcionários. Mas o negócio vem sendo impactado pela alta de juros.

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A Kavak foi avaliada em US$ 8,7 bilhões depois de uma rodada em setembro do ano passado e conseguiu US$ 810 milhões com linhas de crédito com o HSBC, o Goldman Sachs e o Banco Santander.

Na ponta de devolução de área ocupada no mercado de escritórios de alto padrão em São Paulo, a liderança indesejada coube a empresa de tecnologia. A 99, que pertence à chinesa Didi Chuxing, devolveu 11,6 mil metros quadrados no edifício Carlos Bratke Jacarandá, na altura do início da Berrini.

A Bloomberg Línea também revelou recentemente que a Amazon desistiu de ocupar cerca de 20 mil metros quadrados no Edifício Faria Lima Plaza, em São Paulo, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. A Amazon planeja cortar cerca de 10 mil empregos globalmente, segundo a Bloomberg News.

É um movimento que tem relação com a readequação da operação ao novo momento de mercado, de menor crescimento, e não ao aumento da automação nas linhas produtivas da empresa.

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“Robôs nos ajudam a crescer, mas não necessariamente substituindo pessoas”, disse Scott Dresser, vice-presidente de robótica da Amazon, em entrevista recente à Bloomberg Línea.

“Nós empregamos meio milhão de robôs, mas também contratamos meio milhão de pessoas. Isso está relacionado ao fato de que estamos crescendo como uma organização, e os robôs estão nos ajudando a fazer isso, não necessariamente substituindo pessoas, mas trabalhando junto a elas”, disse.

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— Colaborou Mariana D’Ávila.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups