Eleitorado recorde e apuração mais rápida: 7 fatos da disputa nas urnas em 2022

Pleito reúne de forma inédita na era democrática pós-regime militar o confronto entre um atual presidente e um ex-presidente da República

Mais de 156 milhões de brasileiros poderão ir às urnas neste domingo para eleger o presidente da República entre 2023 e 2026
02 de Outubro, 2022 | 11:14 AM

Bloomberg Línea — As eleições para presidente, governadores, deputados federais e estaduais e senadores deste domingo (2) apresentam sete fatos inéditos na história da democracia brasileira. Veja a seguir quais são:

1. Eleitorado recorde

Mais de 156 milhões de eleitores estão aptos a ir às urnas para escolher seus candidatos a presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual neste domingo (2).

É o maior contingente da história, quase 10 milhões acima do registrado em 2018, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Mas isso não significa que o comparecimento às urnas será igualmente recorde, ainda que o voto no Brasil seja obrigatório por regra constitucional. O voto só é facultativo para analfabetos e pessoas com mais de 70 anos de idade ou que tenham entre 16 e 18 anos.

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A punição por não votar é tão somente uma multa de R$ 3,51 por turno. Isso significa que a abstenção eleitoral deve ser novamente alta, como em eleições passadas recentes.

Em 2018, cerca de 20% dos eleitores não compareceram às urnas, o equivalente a quase 30 milhões de pessoas. Em 2020, quando as eleições municipais foram realizadas no primeiro ano de pandemia, a abstenção foi de 23%. Somando os votos brancos e nulos, a abstenção total chegou a 32%. Considerando os números superlativos das eleições deste ano, analistas esperam percentuais parecidos.

2. Número recorde de candidatos

As eleições deste domingo também apresentam o maior número de candidatos já registrados: 29 mil, ante 28,9 mil quatro anos atrás. Um exemplo do fenômeno está na Câmara dos Deputados.

Reportagem da Bloomberg Línea em agosto apontou que nunca antes na história deste país tantos deputados federais quiseram continuar na cadeira por mais quatro anos.

Historicamente, o índice de deputados que se candidatam à reeleição é considerado elevado, de 80% em média. Mas as eleições deste ano vão representar um recorde, com 88% do total.

São 10.271 candidatos a deputado federal nas eleições de 2 de outubro, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Trata-se do o maior número desde a redemocratização, em 1985.

3. Apuração mais rápida

Pela primeira vez, todos os Estados do país mais o Distrito Federal vão promover a votação no mesmo horário, o de Brasília. Isso significa que, às 17h de Brasília, as urnas serão fechadas. Não há horário de verão nem o fuso do horário do Acre (uma hora atrás do de Brasília) será levado em conta. Portanto, às 17h01 a apuração dos resultados estará apta para começar e para ser divulgada no site do TSE.

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Em eleições passadas, por exemplo, os resultados das votações para governadores, deputados e senadores dentro de cada estado eram divulgados a partir das 17h, mas não para presidente da República, algo que só começava a ser apresentado de forma sincronizada para todo o país a partir das 19h.

Não há uma informação oficial do TSE, mas especialistas em eleições dizem que, por volta das 19h ou no mais tarde às 20h, se não houver atrasos inesperados ou contagem muito apertada, com pouca diferença entre os candidatos, é possível que o resultado para presidente da República já seja conhecido.

4. Disputa inédita para presidente

O presidente Jair Bolsonaro (PL) é candidato à reeleição e enfrenta o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que comandou o país entre 2003 e 2010. Na nova era da democracia brasileira, iniciada com votação direta dos brasileiros em 1989, é a primeira vez que isso acontece.

Fernando Collor até cogitou disputar as eleições em 2018, bem como o então presidente Michel Temer, mas ambos acabaram desistindo. Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff não disputaram mais a eleição para presidente depois que deixaram o cargo.

5. Presidente atrás nas pesquisas

Pela primeira vez desde 1998, ano em que a disputa da reeleição foi permitida no Brasil pela primeira vez, o presidente incumbente não é o candidato favorito de acordo com as pesquisas. Esse posto fica com o ex-presidente Lula (PT), que tenta um terceiro mandato depois de 12 anos fora do poder.

Em 1998, Fernando Henrique Cardoso foi eleito já no primeiro turno; em 2006, Lula derrotou Geraldo Alckmin no segundo turno; em 2014, Dilma Rousseff superou Aécio Neves no segundo turno. Nas três ocasiões, o presidente no cargo estava na liderança das pesquisas durante as campanhas.

Lula já era o favorito nas eleições de 2018, mas foi impedido de se candidatar pelo TSE. Naquela época, ele estava preso por ter sido condenado em segunda instância, mas com direito a recurso, por corrupção e lavagem de dinheiro em casos investigados na esfera da Operação Lava Jato. Depois, em 2019, foi solto por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF); e mais tarde teve as sentenças anuladas.

Em 2018, quem concorreu no lugar de Lula foi o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT), que corria como vice de Lula.

6. Financiamento recorde com dinheiro público

Na esteira das descobertas da Operação Lava Jato, o STF decidiu pela proibição do financiamento de campanha por empresas. A solução para a necessidade dos partidos de bancar as campanhas foi dada em 2017, com a criação do fundo especial de financiamento eleitoral, o chamado fundão. E as eleições deste ano tiveram o maior fundão até agora: R$ 4,9 bilhões.

Isso significa que as campanhas hoje são quase que inteiramente financiadas com dinheiro público. Um exemplo: a campanha de Lula arrecadou R$ 90 milhões, segundo a prestação de contas ao TSE. Desse total, R$ 89 milhões são do fundão, e apenas R$ 1 milhão, de doações de apoiadores.

7. ‘Terceiro turno’ além do TSE?

As eleições de 2022 envolvem o risco inédito de uma espécie de “terceiro turno” que extrapole as decisões do TSE, ou seja, para além dos tradicionais processos judiciais de tentativa de impugnar candidatos eleitos. Isso porque o presidente Bolsonaro e muitos de seus apoiadores já vêm preparando discursos sobre uma suposta fragilidade do sistema eleitoral, algo até hoje nunca comprovado.

Analistas políticos alertam para o risco de incidentes semelhantes ao que ocorreram nos Estados Unidos em janeiro de 2021, às vésperas da posse do então presidente eleito Joe Biden, quando simpatizantes do presidente Donald Trump promoveram uma invasão do Capitólio (o Congresso dos Estados Unidos).

Nas eleições de 2014, o então candidato pelo PSDB, Aécio Neves, questionou a vitória da presidente Dilma Rousseff a mais um mandato. O PDSB chegou a apresentar um pedido de impugnação da candidatura no TSE, mas a resistência acabou passando e ficou restrita aos palanques, de forma democrática e sem incitação de levantes populares. Aécio prometeu oposição “incansável” como senador.

“As eleições de 2014, para o Poder Judiciário, são uma página virada. Não haverá terceiro turno na Justiça Eleitoral. [...] Não há espaço para, repito, terceiro turno que possa cassar o voto destes 54.501.118 eleitores [que votaram em Dilma]”, afirmou o então presidente do TSE, ministro Dias Toffoli.

A mais recente tentativa de questionamento do presidente foi um documento elaborado por uma empresa contratada pelo PL, partido de Bolsonaro, dizendo que o sistema brasileiro não é confiável. Não são apresentadas provas, e o Tribunal Superior Eleitoral avaliou que “o documento reúne informações fraudulentas e atentatórias ao Estado Democrático de Direito e ao Poder Judiciário, em especial à Justiça Eleitoral, em clara tentativa de embaraçar e tumultuar o curso natural do processo eleitoral”.

O ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE e também ministro do STF, incluiu o PL no inquérito das fake news, que investiga o financiamento da divulgação de desinformação para desestabilizar as instituições. E a Corregedoria-Geral Eleitoral também investiga o caso. O corregedor, ministro Benedito Gonçalves, disse que o único objetivo da “auditoria” do PL foi o de “desacreditar as eleições”.

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Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.