Ford não atende demanda por veículos elétricos (e talvez nem queira)

Modelos abastecidos por gasolina são mais rentáveis para a montadora, então a Ford não será a próxima Tesla

Ford encerrou sua lista de pedidos de veículos elétricos; são mais de 200 mil reservados
Por Kyle Stock
15 de Dezembro, 2021 | 05:44 PM

Bloomberg — A Ford, por anos atrasada na corrida por veículos elétricos, adotou uma abordagem contraintuitiva para as vendas de veículos elétricos: pisar no freio.

Há alguns dias, a Ford parou de aceitar reservas de sua picape F-150 Lightning totalmente elétrica que deve ser lançada no início do ano que vem. Cerca de 200 mil camionetes elétricas foram reservadas em uma fábrica que planeja produzir apenas 80 mil por ano. Da mesma forma, a Ford encerrou os pedidos da versão híbrida de seu novo Maverick, uma pequena picape que faz 42 milhas por galão (aproximadamente 18 quilômetros por litro).

Enquanto isso, na sexta-feira (10), o CEO da Ford, Jim Farley, foi ao Twitter para dizer que triplicaria a capacidade de produção de seu outro veículo elétrico, o Mustang Mach-E. A empresa planeja produzir 200 mil unidades movidas a bateria por ano até 2023.

É difícil produzir veículos Mustang Mach-E rápido o suficiente para atender à incrível demanda, mas com certeza vamos tentar. Portanto, a partir de 2022 aumentaremos a produção e esperamos atingir mais de 200 mil unidades por ano na América do Norte e Europa até 2023. Isso é o triplo da nossa produção de 2021.

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A Ford finalmente entregou um concorrente dos veículos Tesla e agora se encontra com problemas dignos da Tesla. Durante anos, Elon Musk disse que a única restrição em seu negócio era a rapidez com que ele conseguia fazer carros; não a rapidez com a qual conseguia vendê-los. Sim, 200 mil veículos por ano parece muito, mas a Ford consegue fabricar a mesma quantidade de sua picape de sucesso em cerca de três meses.

Na verdade, calibrar a produção de veículos deve ser uma das tarefas mais difíceis nos negócios. Para crescer, uma empresa como a Ford não só precisa descobrir onde pode instalar linhas de montagem, mas também encontrar mais trabalhadores e ampliar sua cadeia de suprimentos de peças, incluindo coisas valiosas como chips de computador e baterias de mais de mil libras (aproximadamente 450 kg).

Todos esses obstáculos levam meses, até anos no mercado atual de veículos elétricos. No momento em que a Ford comemora 12 meses de vendas do Lightning, a onda inicial de demanda pode estar caindo um pouco, principalmente com os concorrentes chegando ao mercado. Além disso, a economia é incerta.

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Por enquanto, é jogo no qual só há um vencedor. Para construir mais Mustangs elétricos, a Ford está assumindo uma fábrica em Cuautitlán, no México, onde planejava construir versões elétricas de seus utilitários esportivos Explorer e Lincoln Aviator. Esses modelos agora estão com atraso de 18 meses, enquanto a Ford mexe na produção como se jogasse um jogo de estratégia.

Os números do modelo Lightning da Ford aumentarão quando ela terminar a nova linha de montagem no Tennessee, que faz parte de um complexo de US$ 11,4 bilhões que inclui três fábricas de baterias. “Não aposte contra a Ford sendo que tivemos de aumentar a capacidade”, disse Farley recentemente na emissora CNBC. “Isso é o que fazemos”.

No entanto, a equação é um pouco mais complexa do que Farley deixa transparecer – e certamente mais sutil do que a situação de Musk – porque a Ford tem muitos outros produtos para colocar em suas concessionárias. Não quer esperar por um Mustang com 350 km de autonomia com energia solar? Que tal um Bronco que rende apenas 8,5 quilômetros por litro? É claro, o Bronco provavelmente é mais lucrativo para a montadora. E um modelo F-150 a gasolina que custa US$ 40 mil adicionará mais ao resultado final de 2022 que outro com o mesmo preço que funciona com elétrons.

O analista da Bloomberg Intelligence Kevin Tynan diz que empresas como a Ford não vão pisar fundo na produção de veículos elétricos até que a economia melhore. “Se a Ford conseguisse vender um milhão de Lightnings por ano, ela não o faria”, explica ele. “A razão pela qual a penetração de veículos elétricos é tão baixa nos Estados Unidos porque é isso que as montadoras querem que aconteça. As pessoas pensam que é pela demanda do consumidor – mas não é. É decisão da montadora”.

A Ford pode ter subestimado amplamente a demanda por seus primeiros veículos elétricos, ou pode estar apenas trilhando um caminho conservador para largar o vício em gasolina. Ou os dois. De qualquer forma, boa sorte em conseguir veículo elétrico da marca; é a reserva mais difícil que há por aí.

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