Bloomberg Línea — Saxenda, Ozempic, Wegovy, Mounjaro.
A lista de medicamentos usados para a perda de peso, embora sua indicação principal seja reduzir a glicemia em pacientes com diabetes tipo 2, não para de aumentar à medida que a indústria farmacêutica avança nas pesquisas e nos testes clínicos para o desenvolvimento de novas moléculas.
Além da comunidade médica, há um mercado paralelo ilegal que também monitora a chegada de novas canetas emagrecedoras com inovações científicas.
O novo alvo desse mercado atende pelo nome de Retatrutida, uma molécula em fase experimental do laboratório americano Eli Lilly com prometida ação tripla na regulação de apetite, saciedade, níveis de insulina e glicose no sangue.
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Nas redes sociais, como TikTok e X, perfis de usuários entusiastas da musculação promovem o nome do medicamento com mensagens sobre efeitos como a rapidez da perda de peso e o fim da fome.
Em sites de vendas de produtos do Paraguai, há caixas com a caneta de Retatrutida sendo oferecidas a US$ 380 cada uma, como constatou a Bloomberg Línea.
Clínicas de endocrinologia também começam a esclarecer seus pacientes sobre as diferenças entre a Retatrutida e as outras moléculas vendidas no mercado — a semaglutida (Ozempic e Wegovy), a liraglutida (Saxenda) e a tirzepatida (Mounjaro).
Por exercer uma tripla ação, a Retatrutida (ainda sem nome comercial) é considerada por especialistas mais potente do que o Mounjaro, que tem dupla ação.
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) não aprovou ainda a comercialização da Retatrutida no Brasil, bem como órgãos reguladores de outros países, mas já há existe um mercado clandestino - ilegal, portanto - que utiliza o nome da molécula para vendê-la como caneta emagrecedora.
Na último dia 4 de junho, a Receita Federal apreendeu 60 unidades de canetas identificadas como Synedica Retatrutide e 30 unidades de Mounjaro no Aeroporto Internacional de Salvador.
Uma brasileira de 31 anos foi flagrada com o material após desembarcar de um voo da Air Europa, procedente de Madri, com origem em Bruxelas e tendo Fortaleza como destino final, segundo comunicado da Receita Federal.
“As canetas têm valor de mercado estimado em R$ 400 mil, embora o valor de aquisição tenha sido de R$ 50 mil, segundo o que foi declarado pela passageira”, acrescentou a Receita Federal, que encaminhou a mulher e os produtos para custódia da Polícia Federal, pelo flagrante de crime de contrabando.
O nome Synedica Retatrutide, impresso na caneta verde e branca, não é reconhecido como um produto de um laboratório oficial.
É atribuído a uma invenção do mercado de medicamentos falsificados, uma das principais preocupações atuais da indústria farmacêutica global, principalmente dos players que lançam essas novas moléculas depois de anos de pesquisa, pois os preços de desenvolvimento são elevados, bem como as margens de lucro.
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“O medicamento Retatrutide ainda está em fase de estudos clínicos e não foi liberado pela Anvisa, sendo ainda proibido no Brasil. Existe previsão de liberação da molécula somente em 2026”, informou a Receita Federal.
A Retatrutida é descrita pelo órgão do Ministério da Economia como um medicamento de “maior potencial que o Mounjaro, uma vez que é composto por três hormônios que agem no tratamento da obesidade, reduzindo o apetite e aumentando a queima de gordura”.
‘Irregulares, falsificadas e manipuladas’
Para combater a concorrência com o mercado de remédios falsificados, o laboratório do Ozempic, a dinamarquesa Novo Nordisk, tem usado sua política comercial como aliada no Brasil, o que significa praticar menos mais baixos.
No início de junho, a empresa anunciou a redução de preços de seus tratamentos à base de semaglutida (Wegovy e Ozempic) no Brasil. Ao justificar a medida, a Novo Nordisk fez referência aos produtos falsificados.
“A iniciativa visa não apenas tornar essas terapias inovadoras e clinicamente comprovadas mais acessíveis mas também conter o uso crescente de alternativas irregulares, falsificadas e manipuladas, que representam riscos à saúde dos pacientes”, destacou o laboratório em nota.
Isso não impede, por outro lado, o surgimento de soluções genéricas e consideradas perigosas por médicos e especialistas, como as do mercado clandestino.
As comunidades médicas, como a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, também), reforçam o alerta sobre a invasão dos medicamentos fakes, bem como o uso off label (fora da prescrição médica) das canetas emagrecedoras, inicialmente lançadas para tratamento de diabetes tipo 2.
A Anvisa, por sua vez, tem elevado o rigor com essa classe de remédios.
A partir do dia 23 de junho, entra em vigor a IN (Instrução Normativa) n⁰ 360/2025, publicada pela agência reguladora, que exige prescrição médica e retenção de receita (com validade de 90 dias) pelas farmácias de medicamentos como Ozempic, Wegovy, Saxenda e Moujaro, bem como em formulações que contenham suas substâncias em associação com outras drogas, como a IdegLira.
“Essa alteração demonstra a intenção da Anvisa de aplicar um nível de controle similar ao de antimicrobianos a essa nova classe de medicamentos, possivelmente devido ao seu crescente uso e potencial para uso inadequado", disse a agência.
Ao comentar a decisão do órgão regulador, a SBEM reiterou, em nota, a necessidade de Conselho Federal de Medicina, Anvisa e demais entidades, incluindo o Conselho Federal de Farmácia, intensificarem a fiscalização sobre o crescente mercado paralelo que envolve a manipulação dessas substâncias e o comércio de versões contrabandeadas.
“Essa medida contribuirá para o uso racional e ético dessas drogas, que representam um grande avanço no tratamento das doenças crônicas não transmissíveis, especialmente, da obesidade e do diabetes mellitus tipo 2, mas que, como qualquer outra classe terapêutica, apresentam contraindicações e potenciais efeitos colaterais, o que torna imprescindível o acompanhamento médico”, disse a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia na nota.
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