Para o Inter, tecnologia é base para ambição global que vai além dos EUA, diz CEO

Em entrevista à Bloomberg Línea em Miami, João Vitor Menin diz que o banco criou uma ‘espinha dorsal’ tech que permite a oferta de soluções financeiras e de pagamento a milhões de clientes no mundo

Banco Inter de Brasil apunta a expandir su cartera de crédito por hasta 50% en 2024
11 de Novembro, 2024 | 05:31 AM

Bloomberg Línea em Miami — O Inter & Co iniciou há cerca de dois anos uma rara incursão para um banco brasileiro no mercado de varejo dos Estados Unidos. No período, concluiu sua listagem na Nasdaq e tem realizado investimentos principalmente em tecnologia para crescer em base de clientes e receitas.

Se depender do tamanho de sua ambição, esse terá sido um passo importante mas não o único nos planos de se tornar um player com presença internacional relevante.

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Liderado pelo CEO João Vitor Menin, o banco digital enfrentou taxas de juros elevadas e desafios fiscais no Brasil, um dos mercados mais competitivos do mundo para bancos e que conta com benchmarks globais, para expandir sua carteira de crédito e alcançar mais de 30 milhões de usuários.

O Inter avalia que terá condições no futuro de ingressar em outros mercados da América Latina, como Argentina, Colômbia e México, e eventualmente chegar à Espanha e a Portugal - esclarecendo que não se trata de uma decisão já tomada e que, portanto, esses não são planos imediatos.

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“Agora que estamos focados na expansão global, não vemos mais o Brasil como nosso único mercado. Ele será um mercado importante, mas apenas um entre outros no futuro”, disse Menin em entrevista à Bloomberg Línea a partir de Miami, onde mora há alguns anos e de onde comanda o Inter como CEO global.

Essa expansão estratégica, com base em inovação digital e financiamento personalizado com uso de tecnologia, posicionou o Inter como um concorrente de destaque no espaço disputado dos neobanks.

No modelo do Inter (INTR) está uma abordagem diversificada de captação de recursos e ofertas de crédito. Menin atribui o custo de capital mais baixo e seu amplo ecossistema digital como fatores críticos para atrair clientes e manter a trajetória de crescimento constante.

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“Contar com a tecnologia como nossa espinha dorsal é algo que nos ajudou a evoluir muito rapidamente na oferta de produtos [...] Podemos fornecer soluções globais de pagamentos e finanças para milhões de clientes em todo o mundo”, disse Menin, que, há duas semanas, foi homenageado como o “Innovative CEO of the Year” em premiação conjunta da Americas Society com o Council of the Americas em Miami.

Nos Estados Unidos, onde o Inter lançou recentemente seu produto de conta global, Menin disse identificar oportunidades não apenas para expandir os serviços financeiros para expatriados brasileiros e da América Latina mas também para continuar a adicionar funcionalidades a um super app abrangente, que esteja adaptado também às demandas dos consumidores americanos.

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Com o plano de expansão pelo mercado americano em execução, Menin tem aproveitado alianças estratégicas, como uma parceria de marketing com o Orlando City, time de futebol local que compete na Major League Soccer (MLS) - e que acaba de chegar às semifinais da temporada -, para ampliar o awareness e conquistar participação de mercado.

Segundo o executivo, cerca de 10% da base de clientes de 34 milhões de clientes no Brasil utiliza a conta nos EUA para pagamentos, remessas, investimentos e outros produtos. E essa fatia pode chegar a algo entre 15% e 30%.

Veja a seguir a entrevista com João Vitor Menin a partir de Miami, editada para fins de clareza:

O Inter & Co está listado na Nasdaq há mais de dois anos. Desde então, o número de clientes, a receita e a carteira de empréstimos crescem acentuadamente no Brasil e nos EUA. Como isso tem sido possível em um ambiente de taxas de juros elevadas e quão sustentável isso é?

É uma combinação de duas coisas. Primeiramente, temos uma carteira de crédito muito diversificada. Alguns desses créditos não são muito impactados pelas taxas de juros, como financiamentos imobiliários e empréstimos consignados no Brasil. Portanto, independentemente de as taxas subirem ou descerem, isso não afeta muito o crescimento da carteira.

Em segundo lugar, conseguimos atrair muitos clientes para nosso ecossistema, principalmente por meio da conta digital. Com isso, conseguimos fortalecer a base de captação. Hoje, temos o melhor custo de captação no Brasil, melhor que o dos os bancos tradicionais, e isso nos ajuda a conceder crédito para milhões de clientes de forma muito fácil, por meio do app. Esses fatores nos ajudaram a expandir a carteira.

No fim das contas, essa carteira nos trouxe mais receita, o que ajudou a diluir os custos fixos, gerando melhores lucros trimestre a trimestre. Essa é a forma como o Inter tem operado.

Jarrod Dillan, presidente de Operações Comerciais do Orlando City, e João Vitor Menin, CEO do Banco Inter, em evento nesta quinta-feira (14 de setembro de 2023) no Exploria Stadium, estádio do clube da MLS (Foto: Divulgação)

Quanto da receita atualmente vem dos EUA?

Não divulgamos esse número, mas o que informamos é que temos 34 milhões de clientes no Brasil hoje, e 10% desses clientes também possuem o produto de conta global, que é a conta nos EUA. Temos também outros 250 mil clientes em solo americano que utilizam a nossa conta. Ou seja, cerca de 10% de nossa base de clientes utiliza a conta nos EUA para pagamentos, remessas, investimentos e outros.

Esperamos que esse número cresça consideravelmente no futuro. Observamos que o ritmo de crescimento aqui é maior que o do Brasil. Acreditamos que esses 10% podem chegar de 15% a 30%.

Você possui algum número concreto para compartilhar sobre o impulso de marketing no mercado americano, em parte graças à parceria com o Orlando City?

Sim. Ao observarmos esses 250 mil clientes que temos aqui nos EUA, percebemos que uma grande parte está na Flórida Central, onde Orlando está localizado e temos essa parceria, que inclui o Inter & Co Stadium. Após o anúncio dos naming rights do estádio, houve um aumento acentuado no número de contas da região. Isso mostra como essas parcerias são importantes para promover o negócio e a marca nos EUA.

Quais são suas principais conclusões sobre a diferença entre aumentar a penetração no mercado bancário digital do Brasil em comparação com o dos EUA?

É diferente. Ainda estamos aprendendo, para ser honesto. Estamos expandindo aqui há cerca de dois anos. Eu diria que os brasileiros eram propensos a experimentar algo novo. Eles costumavam ser sub-bancarizados, então estavam ávidos por algo diferente. Nos EUA, a abordagem é outra.

Por outro lado, no sistema americano, o setor bancário de varejo não é tão evoluído como no Brasil, o que significa que os consumidores buscam mais conveniência. Será que é necessário ter cinco, seis, sete apps diferentes, diferentes relações bancárias para gerir sua vida financeira? Talvez não seja necessário.

Talvez você possa ter a conveniência de um super app, em que pode realizar investimentos, contratar seguros, hipotecas, fazer pagamentos de cartão de crédito, remessas e muito mais em um só lugar. E estamos muito empolgados em trazer essa conveniência para os clientes aqui nos EUA. E, claro, tentamos aproveitar ao máximo os ventos a favor, focando primeiro nos latinos e nos brasileiros.

Quais serão as principais fontes de receita de sucesso no mercado dos EUA?

Estamos muito focados em ter uma fonte de receita diversificada. Não queremos ser como um monolito. Somos fortes em receitas provenientes de remessas, pagamentos e hipotecas. Queremos manter essa diversificação.

Hoje, não divulgamos a receita específica nos EUA, mas ela é muito bem equilibrada e diversificada. Temos quatro ou cinco fluxos de receita diferentes, cada um representando cerca de 20% da receita.

Cartões de crédito? Investimentos?

Cartões de crédito, investimentos, parcerias comerciais, remessas e investimentos.

Você mora em Miami há alguns anos. Acredita que isso teve algum impacto na sua abordagem de liderança e gestão, ou na cultura do Inter de forma geral?

Sim, com certeza. Nasci e fui criado no Brasil, em Belo Horizonte. É a primeira vez que moro fora do país, enquanto gerencio uma empresa com mais de 4.000 pessoas. Claro, viajo ao Brasil todo mês e passo uma semana lá. Mas aprendo como gerenciar a empresa de fora e também para me inspirar e estar em contato com as tendências que surgem aqui nos EUA, que é o lugar da inovação e da tecnologia.

Busco disseminar essas tendências e essa cultura entre nossos executivos de alto nível. Tem sido uma experiência muito interessante. Me pergunto como posso antecipar essas tendências e traduzir isso para nossa equipe, para que eles me ajudem a conduzir o negócio na direção certa.

É um novo tipo de liderança que estou aprendendo, mas até agora acredito que tem funcionado muito bem e estou muito satisfeito vivendo em Miami. Agora que estamos focados nessa expansão global, não vemos mais o Brasil como nosso único mercado. Ele será um mercado importante, mas apenas um entre outros no futuro. Estar aqui em uma das cidades mais interconectadas do mundo é muito útil.

Inter & Co Sets Eyes on Rest of LatAm, Europe After US Expansion

Qual é a sua estratégia de retenção de talentos em um mercado hipercompetitivo, no centro financeiro do mundo?

O que temos feito no Inter há algum tempo e que funciona muito bem, e a razão pela qual conseguimos reter muitos de nossos talentos em todos os níveis, é porque temos essa cultura de incentivar as pessoas a experimentar, testar, inovar e entrar em contato com as coisas mais interessantes que acontecem no setor. Portanto, eles gostam de fazer parte disso.

Sei que se estiver no Inter e trabalhar na área de TI, vou usar e testar a tecnologia mais avançada. Se eu estiver na equipe jurídica, também poderei experimentar coisas diferentes. Assim, por exemplo, fizemos nossa migração da bolsa brasileira para a Nasdaq em 2022, e esse tipo de transação foi a primeira do gênero no mundo.

Um banco regulamentado e listado no Brasil se converteu em uma empresa regulamentada e listada na Nasdaq. Portanto, se você perguntar à nossa equipe jurídica que trabalhou nessa transação, eles nunca poderiam imaginar que fariam parte de tal inovação.

Esse é o tipo de coisa que mantém as pessoas motivadas e engajadas. E, no final das contas, elas têm um bom desempenho e a empresa tem um bom desempenho, portanto, também podemos pagá-las de acordo. Mas ressalto que a questão não é o salário, e, sim, a capacidade de fazer coisas diferentes e experimentar coisas novas. E é isso que as pessoas, a maioria das pessoas, estão procurando.

Qual foi o racional por trás da decisão de realizar a listagem na Nasdaq em vez de permanecer no Brasil?

Em primeiro lugar, fazer um IPO aqui com a empresa já listada no Brasil seria muito complicado. E o motivo pelo qual decidimos mudar do Brasil para os EUA é bem fácil de entender. Vemos os EUA como, de longe, o maior mercado de capitais do mundo.

E quando vemos o Inter como uma empresa de tecnologia, de super crescimento, queríamos estar perto dos investidores de longo prazo que nos ajudariam a financiar o crescimento da empresa no futuro. Por isso, decidimos fazer a listagem nos EUA. Fico muito feliz em ver que hoje temos mais liquidez aqui nos EUA do que tínhamos no Brasil. Eu diria que, dois anos depois, foi um projeto de muito sucesso.

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Você vê uma tendência de desvalorização do real no futuro? Como isso impacta seus negócios?

É muito difícil prever como o câmbio se comportará. Há muitos fatores em movimento. Há eleições, questões fiscais e dívidas de um país para outro. O que vemos historicamente é que o dólar americano ganhou mais valor em relação ao real, com certeza. E esse é um dos motivos pelos quais criamos esse conceito de conta global.

Assim, você não está limitado a ter sua poupança, sua capacidade de pagamento apenas em pesos ou apenas em reais. Por que não tê-la também em dólares? Porque talvez você vá viajar para os EUA em breve, talvez vá morar nos EUA em breve. Portanto, posso economizar em dólares americanos.

Acreditamos que hoje em dia as pessoas se conectam cada vez mais com diferentes países, culturas e moedas. Esse conceito de um aplicativo global de compartilhamento de viagens, como a Uber, não é visto em pagamentos. Não se vê isso em banco de varejo.

Portanto, esse é o conceito de conta global, para ajudar hoje os brasileiros, mas quem sabe no futuro os argentinos, os colombianos, outros países da América Latina ou até mesmo outros países da Europa. É isso que estamos construindo pouco a pouco.

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Há muita concorrência de outros super apps que já se expandiram pelo mundo, como a Revolut. O quanto você acha que está atrasado em relação a essa concorrência?

Eu diria que estamos alcançando [esses players mais avançados]. É importante mencionar que eles estão muito bem focados na construção desse ecossistema com remessas.

No Inter, começamos de um ângulo diferente, com essa franquia robusta de banco digital com um balanço forte, com uma carteira de crédito no Brasil. Mas, como mencionei, gostamos de combinar crédito com serviços. E lançamos recentemente a iniciativa de conta global que compete com a Revolut.

Conseguimos nos atualizar muito rapidamente. E, novamente, ter a tecnologia como nossa espinha dorsal é algo que nos ajudou a evoluir muito rapidamente na oferta de produtos. E também vejo que o sucesso de alguns players nesse espaço nos ajuda a cristalizar a visão de que precisamos. Podemos fornecer soluções globais de pagamentos e finanças para milhões de clientes em todo o mundo.

Você comentou a expansão geográfica para novos mercados. Um de seus concorrentes, o Nubank, mencionou que acompanha de perto a evolução da economia com Javier Milei e que considera uma eventual reentrada. Esse é um país no qual vocês estariam interessados?

Sim, estamos interessados nesse país especificamente. Avaliamos outros países também. Ainda não decidimos qual deles e quando faremos o lançamento. Mas, com certeza, a Argentina é um país que merece ser monitorado. Uma coisa importante: estamos construindo nossa expansão de forma que possamos eventualmente lançar não apenas na Argentina mas talvez em vários países ao mesmo tempo.

Porque queremos aproveitar o que construímos em termos de tecnologia, portanto, o login único, todos os microsserviços na rede de pagamentos e também a ajuda de provedores locais. Por que não se juntar com um player na Argentina? Por que não se juntar com um player da Colômbia ou do México?

E se você realmente ganhar massa crítica, como temos no Brasil, e também como estamos fazendo aqui nos EUA, você pode ter sua própria operação, seu próprio balanço nesses países.

Portugal e Espanha seriam um primeiro passo lógico se você olhasse para a Europa?

Sim, quando pensamos na Europa, é claro que Portugal e Espanha são os primeiros países que nos vêm à mente. Porque, por exemplo, em Portugal se fala a nossa língua, o português, enquanto a Espanha tem muitas conexões com o país, há muitos brasileiros. É difícil, por exemplo, se pensarmos na Alemanha ou na Europa Oriental.

Portanto, eu diria que esses países são algo que pode representar um roteiro. Eles ainda não estão em um roteiro para o futuro, mas eu diria que podem ser duas boas opções para nós.

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Francisco  Aldaya

Periodista argentino con más de 10 años de experiencia. Francisco cubrió al sector financiero latinoamericano en S&P Global Market Intelligence, y trabajó en las secciones de economía y política del Buenos Aires Herald. También ha colaborado con el Buenos Aires Times.