Foto de duas mulheres em protesto. A mulher centralizada carrega um cartaz feito de cartolina verde no qual é possível ler, em inglês, os dizeres "pagamentos iguais por trabalhos iguais"
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Bloomberg Opinion — A pandemia foi tão ruim para as mulheres que trabalham, principalmente as mães, que ficou conhecida em alguns setores como a “recessão das mulheres”. Mas a recuperação tem sido muito boa para elas.

Nos últimos anos, após décadas de estagnação, as mulheres progrediram na redução da diferença de trabalho e da diferença salarial nos Estados Unidos.

O mercado de trabalho passou por algumas grandes mudanças que favorecem as mulheres, embora também as tornem mais vulneráveis em caso de mudanças.

Durante a maior parte da era industrial, o trabalho das mulheres foi uma questão secundária. Não só as mulheres enfrentavam discriminação no local de trabalho como também havia uma expectativa de que elas parariam de trabalhar quando tivessem uma família.

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No entanto, quando as normas sociais e a tecnologia mudaram, o mesmo aconteceu com a influência das mulheres na força de trabalho.

As mulheres progrediram durante a segunda metade do século XX: no ano 2000, mais de 75% das mulheres com idade entre 25 e 54 anos estavam trabalhando, em comparação com 40% na década de 1960, enquanto a diferença salarial (quanto uma mulher ganha para cada dólar que um homem ganha) passou de 62,3 centavos de dólar em 1979 para cerca de 77 centavos de dólar.

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Então o progresso diminuiu. A diferença salarial permaneceu na casa dos 80 centavos de dólar, e a taxa de participação da população economicamente ativa no mercado de trabalho ficou na casa dos 70%.

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Após a pandemia, as coisas começaram a mudar. A participação das mulheres na força de trabalho nunca foi tão alta, e a diferença salarial até diminuiu um pouco. A tecnologia alterou as opções de trabalho, permitindo que mais mulheres tenham a flexibilidade de que precisam.

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A existência ou não da diferença salarial entre gêneros tornou-se um ponto controverso.

Atualmente, ela é de 83,8 centavos, a menor já registrada. Depois de levar em conta as horas trabalhadas e as áreas que as mulheres escolhem – o mercado valoriza mais engenheiras que assistentes sociais, por exemplo –, essa diferença é ainda menor: na casa dos 90 centavos, ou seja, uma diferença de menos de 10%.

Isso é um progresso, mas uma mulher que ganha 10% menos do que um homem pelo mesmo trabalho não é algo digno de comemoração.

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E a diferença aumenta com o tempo: passa por uma quase paridade quando as mulheres se formam na faculdade e depois atinge uma lacuna maior quando entram na meia-idade. Ela também é maior entre as pessoas com formação universitária.

O que explica essa diferença?

Uma pesquisa realizada por Claudia Goldin, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia em 2023, estima que isso se deve, em grande parte, ao fato de que as mulheres geralmente precisam de mais flexibilidade no trabalho quando têm filhos. Para empregos que pagam muito bem, as empresas querem trabalhadores que possam estar disponíveis na maioria das horas do dia.

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A flexibilidade, assim como o plano de saúde ou as férias remuneradas, é um benefício. E, como outros benefícios, ela impõe um custo aos empregadores.

Isso ajuda a explicar por que ainda existe uma diferença salarial entre médicos obstetras do sexo masculino e feminino, por exemplo: acontece que os médicos homens têm maior probabilidade de fazer partos no meio da noite e são pagos por sua disposição de trabalhar nessas horas.

Em contraste, a diferença de remuneração é praticamente inexistente para os farmacêuticos, em que há pouco retorno por fazer jornadas longas ou trabalhar em horários pouco convencionais.

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Mesmo antes da pandemia, o mercado de trabalho estava mudando de forma a beneficiar as mulheres. Os empregos na área de manufatura, que tendem a exigir mais força e trabalho manual, estavam em declínio, enquanto os chamados empregos na área de cuidados estavam aumentando. Mas o que realmente mudou o jogo pode ter sido o aumento da popularidade do trabalho remoto.

O trabalho remoto permite que as mulheres trabalhem por mais tempo e estejam mais disponíveis para suas famílias. E essa flexibilidade agora é mais fácil e barata de ser oferecida pelos empregadores.

Esse é um grande motivo pelo qual mais mulheres do que nunca estão trabalhando, enquanto a participação da população masculina economicamente ativa continua no mesmo nível pré-pandemia, apesar de um mercado de trabalho muito forte nos Estados Unidos.

A opção pela flexibilidade continuará mesmo quando mais pessoas retornarem ao escritório, porque a tecnologia melhorou e as normas do local de trabalho mudaram. Ainda existem os “esforçados ansiosos”, mas será que eles realmente precisam trabalhar por uma quantidade absurda de horas?

Também valha a pena observar que, embora mais mulheres estejam trabalhando, elas estão trabalhando menos horas.

De modo geral, de acordo com o ADP Research Institute, os americanos estão trabalhando menos, e a tendência foi impulsionada pelas mulheres. Isso sugere que a flexibilidade recém-descoberta pode ser uma faca de dois gumes.

Em um mercado de trabalho apertado como o atual nos EUA, empregadores ficam felizes em oferecer flexibilidade. Mas o mercado de trabalho está fadado a mudar e, então, o trabalho presencial poderá implicar em um prêmio maior e aumentar a diferença salarial.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Allison Schrager é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de economia. É pesquisadora sênior do Manhattan Institute e autora de “An Economist Walks Into a Brothel: And Other Unexpected Places to Understand Risk”.

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