Atrasos já comuns em grandes aeroportos do mundo podem piorar devido a instabilidades causadas pelas temperaturas extremas
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Bloomberg Opinion — Você pode até achar que as viagens aéreas não poderiam ficar piores, mas a mudança climática vai provar que você está errado.

Da mesma forma que o calor extremo torna as pessoas lentas e improdutivas e pode ameaçar a vida humana, ele também dificulta muito a pilotagem de aviões.

O ar quente é menos denso do que o ar frio, suas moléculas se movimentam em velocidades mais altas, o que significa que os aviões têm menos sustentação quando as temperaturas sobem. Isso dificulta a decolagem e a permanência no ar.

As companhias aéreas e os pilotos geralmente optam por atrasar os voos ou descarregar passageiros e bagagens para reduzir o peso dos aviões quando a temperatura sobe demais. Isso leva a interrupções em todo o sistema, além de passageiros que ocasionalmente ficam presos por horas em pistas de decolagem dentro de aeronaves superaquecidas.

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Esse é um problema que só vai piorar à medida que o planeta se aquece e o calor extremo se torna mais rotineiro. Até 30% de todos os voos dos Estados Unidos, em média, podem estar sujeitos a restrições de peso durante períodos de calor intenso até meados do século, de acordo com um estudo de 2017 da Universidade de Columbia. E, a menos que haja um avanço tecnológico milagroso, o setor aeroespacial não tem uma solução real para superar as leis da física.

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“Trata-se de uma restrição física relacionada à densidade do ar, e não há muitas soluções tecnológicas diretas para isso”, disse Ethan Coffel, professor assistente da Universidade de Syracuse, que foi um dos autores do estudo.

Geralmente, pensamos em neve ou gelo como a maior ameaça à pontualidade dos voos, mas o calor causa muito mais atrasos, informou recentemente a Bloomberg News. O Aeroporto Internacional O’Hare de Chicago, por exemplo, sofreu cerca de duas vezes mais atrasos climáticos no verão de 2022 do que no inverno do mesmo ano.

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O problema do calor intenso é especialmente difícil de superar em aeroportos com pistas curtas com menos espaço para que aviões ganhem o impulso necessário para decolar. O Aeroporto LaGuardia, em Nova York, tem uma pista particularmente curta e não tem espaço para expansões, pois é limitado pela Baía de Flushing e pelos densos bairros do Queens.

Infelizmente, o Aeroporto LaGuardia também é o que a Administração Federal de Aviação chama de “pacing airport”, geralmente identificado por ter um alto volume de tráfego e frequentemente não conseguir lidar com esse volume, afetando as programações aéreas em todo o país. “A programação é um desastre todos os dias”, disse o consultor independente de aviação Robert Mann, “e o calor só piora as coisas”.

Aeroportos em grandes altitudes, como o de Denver, também são especialmente vulneráveis ao calor intenso, assim como as cidades em constante aquecimento do ‘Sun Belt’. Surpreendentemente, a mais quente dessas cidades, Phoenix, sofre relativamente poucos dias de restrição de peso graças às suas pistas mais longas do que o normal, que também são feitas de concreto especialmente reforçado.

É claro que nem todos os aeroportos podem arcar com as despesas e o atraso de uma reforma nas pistas. E os cancelamentos ainda acontecem, mesmo em Phoenix. Os funcionários que trabalham em pistas de taxiamento e pistas de pouso e decolagem expostas ao sol – que geralmente são muito mais quentes do que a atmosfera ao redor do aeroporto – também são especialmente vulneráveis ao efeito de “ilha de calor”. Os trabalhadores em condições extremas precisarão de pausas mais longas ou correrão o risco de adoecer e causar a falta de pessoal nos aeroportos.

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As fabricantes de aeronaves estão sempre trabalhando em maneiras de tornar os aviões mais leves e mais eficientes, mas a maior parte desse progresso já foi feita. Se não houver novos materiais revolucionários, quaisquer ganhos adicionais serão, na melhor das hipóteses, incrementais. Portanto, até que descubramos como fazer aviões de fibra de vidro, teremos que confiar em soluções antiquadas para o calor: transferir os voos para horários mais frescos, alongar e reforçar as pistas de pouso e decolagem e reduzir o peso.

O efeito líquido é que os atrasos nos voos provavelmente continuarão aumentando, somando-se ao crescente impacto da mudança climática sobre as viagens aéreas. Ela já está tornando as turbulências mais perigosas, prolongando os voos devido à mudança nos padrões de vento e alimentando o clima extremo que leva a mais atrasos. Como em todos os outros efeitos do aumento do calor, a solução mais eficaz seria parar de queimar os combustíveis fósseis que contribuem para o aquecimento – inclusive os combustíveis queimados pelos aviões.

--Com a colaboração de Brooke Sutherland.

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Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Mark Gongloff é editor da Bloomberg Opinion e escreve sobre mudança climática. Ex-editor-gerente da Fortune.com, ele liderou a cobertura de negócios e tecnologia do HuffPost e foi repórter e editor do Wall Street Journal.

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