Bloomberg — Hong Kong está passando por uma crise de covid maior do que a de Wuhan que deu início à pandemia, colocando em xeque a estratégia Covid Zero da China de testagem em massa, isolamento e quarentena.
O número de casos diários na cidade passou de 100 para 6 mil em menos de um mês, superando todos os números da onda inicial em Wuhan, exceto pelo dia 12 de fevereiro de 2020, quando um acúmulo de relatórios levou o número de casos diários para mais de 15 mil. Esse surto e os subsequentes na China foram controlados por lockdowns que, segundo a presidente-executiva de Hong Kong, Carrie Lam, estão fora de questão.


Em vez disso, as autoridades planejam testar cada um dos 7,5 milhões de habitantes da cidade enquanto transformam hotéis em centros de isolamento. No entanto, a blitz de testes só começará no próximo mês, gerando temores de que o vírus continue desenfreado até lá, sobrecarregando ainda mais um sistema de saúde já sobrecarregado.
“Formar filas e aglomerações para testagem apresenta um enorme risco de infecção”, disse Jin Dong-Yan, virologista da Universidade de Hong Kong. “Se o número de casos atingir dezenas de milhares como previsto, a testagem em massa só vai piorar as coisas. É necessário evitar contato o máximo possível”.
Os milhares de casos diários significam que a oportunidade de implantar a estratégia da China continental de testagem em massa para interromper a transmissão já foi perdida, disse Jin.
“Na China, isso só é possível porque as infecções são tão baixas que a detecção é possível”, disse ele, referindo-se à acachapante resposta que as autoridades do continente estabelecem ao detectar poucos casos.
Embora agora saibamos mais sobre o vírus e seu tratamento do que quando ele surgiu em Wuhan, Hong Kong também está lidando com a ômicron, variante mais infecciosa. E embora mais de 10 bilhões de doses de vacina tenham sido administradas em todo o mundo, cerca de 40% dos residentes de Hong Kong com 80 anos ou mais receberam a primeira dose, ficando particularmente vulneráveis.
Hong Kong anunciou 3.629 casos confirmados de covid-19 na sexta-feira (18), além de 7,6 mil infecções suspeitas. Este número reflete as amostras que aguardam um segundo teste confirmatório, e a diferença entre os dois dados é um indicador de um gargalo nos testes.
Há pelo menos 10 pacientes em estado crítico, e as autoridades de saúde disseram na sexta-feira que pretendem transferir todos os pacientes positivos que aguardam fora dos hospitais para áreas internas antes do final do dia, devido às previsões de tempo frio.
As autoridades devem visar mitigar a propagação da covid em vez de tentar reduzir os casos de volta a zero, disse Ben Cowling, epidemiologista da Universidade de Hong Kong.
“Isso significa isolamento domiciliar, quarentena e testes rápidos para informar o comportamento das pessoas”, disse Cowling em entrevista à Bloomberg Television. “No momento, ainda estamos considerando que todos os casos devem ser internados no hospital. Isso não pode continuar”.
Hong Kong busca aumentar sua capacidade de testagem do nível atual de apenas 20 mil por dia. Os hospitais também ficaram cheios devido à política rígida de admitir todas as infecções confirmadas, mesmo que as pessoas não apresentem sintomas. O governo de Hong Kong também está se esforçando para converter quartos de hotel em centros de isolamento enquanto espera que a China continental ajude a construir uma instalação de isolamento gigante.
“Eu não descartaria centenas de milhares de infecções que poderiam ser detectadas por este exercício de teste em massa”, disse Cowling. “Onde todos esses casos seriam isolados? Porque simplesmente não temos instalações de isolamento para tantas pessoas”.
O legislador Michael Tien descreveu a falta de amplas instalações de isolamento como o principal obstáculo à aplicação do manual Covid Zero da China continental. A testagem em massa só pode ser possível depois que houver entre 20 mil e 30 mil unidades de isolamento disponíveis, disse.
“Na verdade, no momento, acredito que se trata de controle de danos”, disse Tien.
--Com a colaboração de Kari Lindberg.
--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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