4 lições deste país com uma das menores taxas de mortalidade por covid do mundo

Do acompanhamento dos casos à boa saúde pré-existente da população, o Japão surpreendeu com sua receita sem grandes restrições à circulação

As mortes por covid per capita no Japão são de 246 por milhão de pessoas, a menor entre os 38 membros da OCDE
Por Bloomberg News - James Mayger - Kanoko Matsuyama
19 de Junho, 2022 | 03:36 PM

Bloomberg — A taxa de mortalidade por covid no Japão é a mais baixa entre os países mais ricos do mundo. Por trás disso está o uso contínuo de máscaras e uma ampla população vacinada - e muitos hábitos saudáveis.

A população japonesa continua a aderir às medidas básicas de controle de casos, como evitar multidões e locais com pouca ventilação, enquanto grande parte do mundo enfrenta uma fadiga da pandemia. O país também reforçou suas medidas através de um robusto programa de vacinação e da assistência médica gratuita.

Mas o que realmente o diferencia de outros países, principalmente vizinhos asiáticos como a China, é que o Japão conseguiu limitar o número de mortes sem impor grandes restrições. A constituição impede a imposição de bloqueios apoiados por ações policiais, o que significa que, mesmo durante um estado de emergência, o governo coloca a responsabilidade sobre empresas e indivíduos para uma mudança efetiva de comportamento.

Essa abordagem mais suave mostrou grandes resultados. As mortes por covid per capita no Japão são de 246 por milhão de pessoas, a menor entre os 38 membros da OCDE, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, de acordo com o portal de dados globais Our World in Data.

PUBLICIDADE

Isso é ainda mais significativo porque o Japão tem a maior proporção de idosos – normalmente alguns dos mais vulneráveis ao coronavírus – do mundo. A taxa da Nova Zelândia, antes a mais baixa, ficou em 257 por milhão depois que o país enfrentou sua primeira onda substancial do vírus ao “reabrir” o país e suspender suas restrições.

No Brasil, a taxa é de 3.125 mortes por milhão de habitantes, segundo a mesma fonte.

Mas ter certeza disso é um pouco confuso se levarmos em consideração que o padrão de metodologia de cada país varia. Um exemplo disso é que a Organização Mundial da Saúde (OMS) disse que o excesso de mortalidade, que é definido como a diferença entre os números observados de mortes em períodos de tempo específicos e os números esperados de mortes no mesmo período, diminuiu no Japão entre 2020 e 2021.

PUBLICIDADE

Ao mesmo tempo, um estudo publicado na revista científica Lancet, em março deste ano, diz que o excesso de mortalidade no país foi seis vezes maior do que as mortes por coronavírus relatadas durante 2020-2021. Mas números do governo mostram que houve cerca de 9.000 mortes a menos em 2020 do que em 2019, embora isso tenha se recuperado no ano passado.

Mesmo que cada nação tenha seu próprio padrão para identificar mortes por coronavírus e diferentes políticas de testagem que podem até mesmo dificultar as comparações, a baixa taxa de mortalidade do Japão mostra que sua estratégia funciona, disse Takao Ohmagari, chefe do centro de controle e prevenção de doenças do Centro Nacional de Saúde e Medicina Global e também conselheiro do governo.

Japão tem as menores taxas de mortes por Covid per capita dos países da OCDEdfd

As medidas do Japão podem ensinar lições sobre como outros países podem lidar com as pandemias atuais ou futuras. Veja o que dizem os especialistas sobre a receita de sucesso em 4 pilares:

1. Respeito Social

A estratégia bem-sucedida de combate ao vírus no Japão contou com a adesão voluntária da população às orientações de distanciamento social, principalmente enquanto os casos estavam em alta. Isso se mostrou mais eficaz do que as medidas autoritárias de outros lugares, que em alguns casos tornaram as pessoas resistentes e contrárias.

“As pessoas estão usando seu próprio julgamento para evitar riscos e modificar seu comportamento e isso desempenha um papel extremamente importante”, disse Ohmagari.

Isso inclui o uso de máscaras, hábito já comum no país em casos de gripes comuns, por exemplo, reforçado durante os primeiros dias da pandemia e que permanece, mesmo quando o governo relaxou sua recomendação de uso ao ar livre. O uso de máscaras no Japão normalmente se manteve acima de 90%, um limite que outros países do G7 apenas ocasionalmente se aproximaram, de acordo com dados do Institute for Health Metrics and Evaluation.

O Japão supera pares do G7 (grupo de sete dos países mais ricos do mundo) no uso de máscarasdfd

O slogan do governo, que prega evitar espaços fechados, lugares lotados e situações de contato próximo, também reforçou como eles querem que a população aja. Além disso, espaços públicos melhoraram a ventilação, implementando o uso de monitores de dióxido de carbono para mostrar que o ar interno está sendo trocado.

PUBLICIDADE

A natureza relativamente leve das restrições também mostra que o Japão não enfrentou uma bruta interrupção na vida cotidiana diante de bloqueios severos, implantado em países desde a Itália até a China e Nova Zelândia.

Mesmo que outras populações tenham voltado à vida normal, os japoneses parecem permanecer cautelosos: as atividades num bairro boêmio de Tóquio caíram quase 40% em relação a 2019, de acordo com uma estimativa.

2. Adesão à vacinação

Antes da pandemia, o povo japonês tinha uma das taxas mais baixas de confiança nas vacinas do mundo. Mas eles estão agora entre as populações mais bem protegidas do G7 (grupo que reúne sete das maiores economias do mundo). Mesmo assim, especialistas apontam a lenta implementação inicial da vacinação e uma escassez precoce de doses, o que criou um senso de urgência, especialmente entre os idosos.

Cerca de 93% dos japoneses com 65 anos ou mais tomaram duas doses e 90% receberam a de reforço, segundo dados do gabinete do primeiro-ministro. Isso se compara a 81% da população total que tomou duas doses e 61% que recebeu uma terceira.

PUBLICIDADE
A população do Japão está altamente vacinadadfd

Nos EUA, 94% das pessoas com idades entre 65 e 74 anos estão totalmente vacinadas e 88% da população com 75 anos ou mais receberam duas vacinas.

“Graças à proteção que o povo japonês obteve por meio da vacinação, não espero que a hospitalização ou as mortes do Japão aumentem”, disse Kenji Shibuya, epidemiologista da Fundação de Pesquisa Política de Tóquio.

3. População Saudável

Um pilar central que sustentava a baixa taxa de mortalidade é a considerada boa saúde pré-existente da população japonesa. O país tem a maior expectativa de vida do mundo e foi um dos seis membros da OCDE a não ver uma redução na expectativa ao longo de 2020. Apenas 5% dos japoneses são obesos, uma das condições que aumentam o risco de doença grave por covid, contra 36% da população nos EUA e 28% no Reino Unido, de acordo com a Federação Mundial de Obesidade.

Ações amplamente adotadas, como o uso de máscaras e higienização das mãos, também eliminaram outras doenças como a gripe, que normalmente matava mais de 10 mil japoneses por ano.

PUBLICIDADE

As mortes no país ocorreram quase que completamente em pessoas com mais de 60 anos. Isso contrasta com uma distribuição mais ampla das mortes nos EUA, por exemplo, onde cerca de um quarto das mortes ocorreu em pessoas com menos de 65 anos, segundo dados do governo.

4. Rastreamento dos casos

Como a maior parte do mundo, o sistema de saúde do Japão foi sobrecarregado durante os piores surtos da doença. Mas, mesmo assim, ainda foi possível manter um forte nível de rastreamento dos casos durante a pandemia.

PUBLICIDADE

Uma rede de saúde pública local que rastreia casos e encontra positivados é gratuita. Aqueles que se isolam em casa são constantemente contatados pela equipe do centro de saúde, que envia enfermeiros e médicos, se necessário.

“Sabemos que a intervenção precoce salva mais vidas”, disse Ohmagari. “Embora eu sinta que podemos fazer mais, o sistema do Japão tenta não deixar ninguém para trás e monitora os pacientes minuciosamente e intervém desde cedo.”

– Esta notícia foi traduzida por Melina Flynn, Content Producer da Bloomberg Línea.

PUBLICIDADE

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

O tamanho do crescente mercado de armas para pessoas físicas no Brasil

Como a inflação se tornou o maior adversário eleitoral de Bolsonaro