Além da cratera do metrô, Doria enfrenta investida de Bolsonaro em SP

Tucano, que tem simpatia do mercado, tenta se firmar como nome da terceira via com um partido dividido

Governador João Doria no local do desabamento da obra da Linha 6
02 de Fevereiro, 2022 | 03:17 PM

A pré-campanha do governador João Doria à Presidência da República está enfrentando simultaneamente outros dois teses de estresse nesta semana: 1) a cratera da obra do metrô na Marginal Tietê, uma das principais vias da capital paulista e; 2) a investida do presidente Jair Bolsonaro e do ministro Tarcísio Freitas (Infraestrutura) junto a prefeitos de municípios atingidos pelas chuvas no Estado.

O desabamento da obra da Linha 6, que não deixou vítimas, trincou uma das principais vitrines eleitorais do tucano. A obra – celebrada no passado por Doria como a maior em curso na América Latina – está sendo tocada através de PPP (parceria público-privada) pelas empresas Linha Uni Acciona. Os motivos do desabamento ainda estão em apuração. O local começou a ser concretado e a interdição da marginal, no sentido Ayrton Senna, deve levar ao menos mais dez dias.

POR QUE ISSO É IMPORTANTE: Um dos pré-candidatos a presidente mais próximos do mercado, o tucano João Doria tem patinado nas pesquisas eleitorais. Ele tem aparecido em quinto lugar – distante do líder, Lula (PT) e do presidente Jair Bolsonaro, e atrás de outros nomes que visam emplacar a chamada terceira via, como Sergio Moro (Podemos) e Ciro Gomes (PDT).

Doria venceu a prévia do PSDB no ano passado, mas políticos influentes no partido, como o senador Tasso Jereissati (CE) e o governador Eduardo Leite (RS), resistem a apoiar o seu nomes. Em Minas, segundo maior colégio eleitoral do país, o deputado Aécio Neves opõe-se à candidatura de Doria.

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Além desses problemas domésticos do partido, o impacto do desabamento da obra do metrô ainda é incerto para as pretensões do governador.

Veja mais: Estas imagens mostram, quadro a quadro, o colapso da obra do metrô em SP

CONTEXTO: Desde ontem, políticos de esquerda e também ligados ao bolsonarismo buscam responsabilizar politicamente o governador pelo acidente. Nesta quarta (2), falando a apoiadores na saída do Alvorada em Brasília, Bolsonaro alfinetou Doria: “Semana que vem a gente conclui a transposição do São Francisco. Em São Paulo aí, eu vi ontem a transposição do Tietê”

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Márcio França (PSB), um dos principais adversários de Doria e pré-candidato ao governo, divulgou em seu perfil no Twitter um vídeo editado com Doria visitando a obra e fazendo promessas, colado com imagens da água do rio Tietê invadindo o canteiro na terça.

“Só mentira e vergonha para SP”, escreveu França, que foi derrotado pelo tucano no segundo turno de 2018.

Políticos bolsonaristas conseguiram levar ao trending topics do Twitter a hashtag #DoriaChamaOTarcisio, referência ao ministro da Infraestrutura, que é o escolhido por Bolsonaro para disputar o governo paulistas.

A APOSTA DE BOLSONARO CONTRA DORIA EM SP: Numa segunda frente, o próprio Bolsonaro resolveu investir pessoalmente nos redutos de Doria. Chuvas deixaram 27 mortos e 660 famílias desabrigadas em São Paulo nos últimos dias.

Diferentemente do que ocorreu com as chuvas de Minas Gerais e da Bahia, quando Bolsonaro não interrompeu as férias em Santa Catarina para visitar os locais atingidos, agora o presidente visitou municípios afetados em São Paulo, levou consigo seis ministros, reuniu-se com prefeitos e prometeu liberação rápida de recursos.

Veja mais: Maia vai de secretário a coordenador de campanha de Doria

De acordo com um ministro palaciano que falou à Bloomberg Línea reservadamente, o presidente recebeu a sugestão de visitar Minas e a Bahia, mas avaliou que não era necessário porque os ministros já tinham se deslocado para os Estados. A ausência do presidente foi fortemente criticada na época. Agora, Bolsonaro resolveu ir pessoalmente.

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Bolsonaro e ministro Rogério Marinho, antes de sobrevoar áreas atingidas pela chuva em SPdfd

Não houve contato do presidente com o governador para coordenar ações – o que levou o entorno de Doria a acusar o presidente de tentar politizar as chuvas.

O secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo, Marcos Penido, disse que o governo federal negou o pedido de recursos para a construção de piscinões em Franco da Rocha, um dos municípios atingidos.

O ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) confrontou o auxiliar de Doria hoje em uma entrevista à Globo News. Segundo ele, o governo paulista apenas enviou um ofício em 2020 e foi orientado a como captar os recursos necessários através do Congresso ou de se habilitar a recursos do FGTS para obras.

Segundo Marinho, este era o caminho como se tratava de obras de contenção e prevenção, não de obras emergenciais (à época em que os recursos foram pedidos).

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.