De crédito a livros: como o TikTok se tornou uma plataforma de negócios no país

Com estratégias que incluem um marketplace para criadores de conteúdo, empresa chinesa cresce 151% em anunciantes na América Latina, diz à Bloomberg Línea head da área para a região

Shouzi Chew, CEO do TikTok, em entrevista no começo do ano ao programa de David Rubenstein, da Bloomberg: estratégia de crescimento passa pela divisão de negócios com empresas (Christopher Goodney/Bloomberg)
08 de Dezembro, 2022 | 08:42 AM

Bloomberg Línea — Em um momento marcado pela desaceleração da economia global diante do aumento dos juros, o TikTok deve encerrar o ano com a marca de US$ 12 bilhões em receitas, o triplo do alcançado em 2021, segundo projeções da empresa de inteligência de mercado eMarketer. A maior parte virá de publicidade, evidenciando uma face ainda não tão conhecida da gigante chinesa que ganhou notoriedade em seus primeiros anos como uma rede social popular principalmente entre jovens.

Redes sociais como Facebook e Instagram e plataformas de vídeos como o YouTube, para citar três das mais populares do mundo, enfrentaram o desafio da monetização em cima da base de usuários em seus primeiros anos. Depois se tornaram máquinas de ganhar dinheiro em cima de anúncios.

No caso do TikTok, os números refletem uma operação com crescente capacidade de gerar receitas em cima do engajamento e da conversão para a venda de uma base que avança em ritmo acelerado: a plataforma chegou a 1 bilhão de usuários ativos no mundo em setembro de 2021, cinco anos depois de ter sido fundada. Facebook, Instagram e YouTube levaram oito anos cada para atingir a marca.

E um dos mercados prioritários tem sido a América Latina. A empresa alcançou um crescimento de 151% do número de anunciantes no último ano (encerrado no terceiro trimestre) na região, em raro dado divulgado pela chinesa ByteDance, a qual pertence.

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É uma operação que teve como mercado de entrada o Brasil em novembro de 2020. Depois Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru passaram a contar com o TikTok for Business, nome dessa divisão de negócios, em julho de 2021. E, mais recentemente, Equador e Uruguai em julho deste ano.

Um passo adicional da estratégia foi o lançamento de um canal dedicado a pequenas e médias empresas no mercado brasileiro há pouco mais de um ano, em outubro de 2021. E que acaba de chegar ao México.

“Temos lançado cada vez mais recursos para os latinos, que são early adopters e heavy users de tecnologia e possuem alto engajamento”, disse Gabriela Comazzetto, head de Soluções Globais para Negócios do TikTok para América Latina, à Bloomberg Línea.

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A estratégia do TikTok na América Latina inclui escritórios próprios em São Paulo, na Cidade do México e em Miami, nos Estados Unidos, pelo fato de ser um hub para a região de muitas empresas. Segundo ela, o próximo país a receber será a Colômbia.

Um dos formatos mais demandados é o TopView, um ad (anúncio) em vídeo que aparece assim que o usuário abre o aplicativo já com a possibilidade do call to action, como o direcionamento para uma compra. Uma empresa que decida expor a sua marca por um dia pode chegar a pagar até US$ 2,6 milhões, segundo a Bloomberg News reportou em junho com base no acesso a documentos.

Segundo estimativas da eMarketer citadas pela Bloomberg News, o TikTok, liderado pelo CEO Shouzi Chew, deve alcançar o YouTube como principal plataforma de mídia em receitas publicitárias em 2024, com cerca de US$ 23,6 bilhões. Neste ano, a projeção da consultoria é que a plataforma que pertence ao Google tenha US$ 17,4 bilhões, enquanto o TikTok alcance US$ 11,6 bilhões.

Outros formatos populares, segundo a executiva, envolvem desafios que companhias podem promover entre usuários de comunidades, em busca de engajamento, reforço da marca - awareness -, propagação da campanha em questão e, claro, monetização para os envolvidos, incluindo o próprio TikTok.

“Falamos para as marcas: ‘Don’t make ads, make TikToks [Não faça anúncios, faça TikToks]’, para que elas trabalhem com a comunidade, como se fossem criadores de conteúdo”, disse Comazzetto.

Uma das maiores comunidades no Brasil é a dos fãs de livros, conhecida como BookTok, que já conta com mais de 9 bilhões de visualizações, segundo a executiva. Há recomendação de livros, compartilhamento de trechos e livrarias com lojas físicas com espaço para exemplares com a hashtag booktokers. “É o chamado community commerce, a força da comunidade de impulsionar o consumo”, disse.

A operação tem clientes corporativos de segmentos variados, segundo a executiva. Em ação recente, a Serasa Experian, empresa de análise de crédito, conseguiu a adesão de 500 mil pessoas em campanha para “limpar o nome” de quem estava no cadastro destinado ao registro de inadimplentes. O que abre caminho para que consigam retomar o acesso ao mercado de crédito.

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O Itaú Unibanco (ITUB4) anuncia produtos financeiros como consórcio, enquanto a McDonald’s, por sua vez, realiza ações para a distribuição de cupons de desconto e downloads na plataforma.

Marketplace para criadores

Para estimular a interação, o TikTok lançou um marketplace de criadores de conteúdo. “Quando uma marca que encontrar um criador de qualquer tamanho, mas que trabalhe com um tema específico, ele pode encontrá-lo por meio do marketplace e daí construir essa relação”, disse Comazzetto.

Segundo a executiva, o marketplace viabiliza que pequenas e médias empresas, que dispõem de recursos limitados para ações comerciais e de marketing, tenham acesso a criadores de conteúdo em geral. “Não estamos falando só de criadores com 10 milhões de seguidores. Há de todos os tamanhos.”

Comazzetto ressaltou, no entanto, que não há uma fórmula única para a geração de conteúdo. “Há empresas que desenvolveram seus próprios criadores como fortaleza primária de sua comunicação. Um exemplo é o Magazine Luiza (MGLU3), que tem a Lu como criadora nativa do Magalu. E há marcas que desenvolveram seu conteúdo sem criadores próprios, com uma linguagem mais neutra.”

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O que prevalece, segundo ela, é a necessidade do engajamento em um momento em que as pessoas consomem cada vez mais conteúdo, o que passa pela recomendação de uso de ferramentas como música e legendas, além da atenção das marcas às tendências - trends - dentro da plataforma.

A executiva disse que, no fim, o TikTok funciona para os usuários como uma plataforma de entretenimento, e não como uma rede social.

“As pessoas não entram no TikTok para saber o que os amigos estão fazendo. Entram para assistir conteúdo e entretenimento, que são movidos pelas comunidades e direcionados a partir de algoritmos que entendem as preferências de cada pessoa a partir da maneira como ela navega”, afirmou.

É uma capacidade que, por vezes, coloca a empresa na mira de autoridades, como aconteceu recentemente no Reino Unido, segundo a Bloomberg News. A suspeita, em fase de investigação, é que a empresa teria coletado dados de crianças sem a devida autorização dos pais. A empresa disse discordar da avaliação.

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Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.