Petroleo
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Bloomberg Opinion — O mercado global de petróleo está sofrendo o que está começando a parecer a maior crise desde a Guerra do Golfo de 1990-91.

Uma grande parte das exportações russas de petróleo bruto e produtos refinados não está encontrando compradores agora e os sinais apontam para ainda mais problemas na próxima semana. O petróleo Brent e West Texas Intermediate estão acima de US$ 105 o barril pela primeira vez desde 2014. Na terça, o WTI chegou a subir 10% em um dos maiores picos de um dia de todos os tempos.

Mais importante, os parâmetros que medem a tensão de curto prazo do mercado estão subindo. A diferença de preço entre um barril de Brent entregue agora e um em um ano aumentou para um recorde de mais de US$ 23,50 por barril, superando o nível atingido depois que Saddam Hussein invadiu o Kuwait, há quase 32 anos.

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A situação exige medidas de emergência, semelhantes às adotadas pelos bancos centrais durante a crise financeira global de 2008-09, para superar o choque de oferta. Aqui estão seis pontos principais:

# 1 - Primeiro, um problema que os traders chamam de “auto-sanção”: os participantes do mercado estão simplesmente se recusando a negociar petróleo russo, mesmo que os governos ocidentais o permitam dentro das sanções que impuseram à Rússia por sua invasão da Ucrânia. Os motivos incluem confusão sobre o que é legalmente permitido, temores sobre danos à reputação ou objeções morais.

A Rússia exporta cerca de 5 milhões de barris por dia de petróleo bruto, além de quase 3 milhões de barris de produtos refinados. As estimativas das perdas potenciais são difíceis de obter, mas traders de petróleo acreditam que as exportações provavelmente sofrerão uma queda notável no final da próxima semana, refletindo o colapso na demanda das refinarias. Todos eles sugerem que pelo menos 2 milhões de barris por dia de exportações de petróleo russo (produtos brutos e refinados) estão em risco, ou cerca de 25% do total. A situação é fluida, e alguns traders e executivos estão projetando perdas maiores, com alguns dizendo que 30% a 70% dos fluxos marítimos de petróleo russo não estão conseguindo encontrar compradores no momento. Se os números estiverem corretos, o número pode ultrapassar 5 milhões de barris por dia.

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O sinal mais claro até agora de que quase todos os compradores de petróleo russo deixaram o mercado, é que o principal petróleo do país foi oferecido na terça-feira (1) com um desconto recorde de US$ 18,60 por barril sob o Brent. Mesmo com esse desconto excepcional, várias vezes maior do que a diferença usual de alguns dólares, não houve um único lance pelos barris.

# 2 - O maior obstáculo ao comércio de petróleo russo é o transporte. A Sovcomflot, empresa russa controlada pelo Estado – a maior proprietária mundial de navios-tanque de médio porte, chamados Aframaxes – está sendo amplamente evitada. Outras empresas e gerentes importantes de navios-tanque, incluindo a Maersk Tankers e a Torm, anunciaram que, por enquanto, não estão assumindo novos contratos de transporte de petróleo russo. Hoje, quando um navio-tanque independente fica disponível, ele custa até 300% a mais do que há apenas alguns dias, tornando o comércio proibitivamente caro. Além do transporte, muitos bancos também se recusam a negociar em petróleo russo, mesmo que a Europa e os Estados Unidos tenham concedido licenças gerais sobre suas sanções para permitir pagamentos em energia.

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# 3 A Agência Internacional de Energia (IEA) concordou na terça-feira (1) em liberar 60 milhões de barris das reservas estratégicas de petróleo de seus membros, mas isso não é suficiente para cobrir a queda potencial nas exportações de petróleo da Rússia se a auto-sanção continuar. Se a liberação pretende cobrir apenas 30 dias, equivale a 2 milhões de barris por dia, correspondendo ao que os traders acreditam ser as perdas atuais. Mas as perdas podem ser maiores. Os membros da IEA mantêm estoques de emergência de 1,5 bilhão de barris – para que possam liberar muito mais petróleo e mais rapidamente.

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A IEA deve pedir à China e à Índia que também usem seus estoques de emergência. A lição que as crises financeiras deste século deixou foi que as autoridades usem medidas esmagadoras. A liberação de emergência é, no entanto, uma batalha perdida: a IEA está lutando contra uma demanda constante com um estoque finito. A gestão da procura é, portanto, crucial. Mesmo correndo o risco de trazer de volta as memórias do cardigã de Jimmy Carter, os líderes ocidentais devem incentivar a conservação de energia agora.

# 4 - Os EUA, o Japão e a Europa devem usar a pressão diplomática para convencer a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos a aumentar imediatamente a produção bem acima de suas cotas atuais da OPEP+. É do interesse de Riad e Abu Dhabi ajudar a estabilizar o mercado. Até agora, tanto a Arábia Saudita quanto os Emirados Árabes Unidos parecem estar do lado da Rússia. Se o fizerem, estarão do lado errado da história. A Opep+ se reúne virtualmente na quarta-feira (2) e provavelmente manterá seu plano de aumentar a produção em 400.000 barris por dia a cada mês. Considerando a crise atual, isso não será suficiente.

# 5 - Embora o presidente Joe Biden não tenha usado seu discurso do Estado da União para encorajar os perfuradores de petróleo americanos a aumentar a produção, a produção de xisto dos EUA precisa estar a postos para a guerra. Muitos na indústria petrolífera americana podem ficar tentados a responder com um “nós avisamos!” sobre o esquecimento da indústria nacional. Talvez eles estejam certos, mas este é o momento errado para recriminações. Continue com o trabalho e perfure. Com mais de US$ 100 o barril, todo produtor de xisto dos EUA pode pagar dividendos, reduzir dívidas e aumentar os gastos. A indústria não deve – e isso é crucial – usar esta oportunidade como um cheque em branco; deve reconhecer que este é um momento de crise. O momento não é um retorno para os tempos do “perfurar, perfurar, perfurar!”

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# 6 - Finalmente, um acordo nuclear com o Irã ajudaria a aliviar a crise, garantindo o retorno de talvez 500.000 barris por dia em um prazo relativamente curto, e outros 500.000 barris por dia em seis meses ou mais. Mas um acordo entre Teerã e EUA, Europa, China e Rússia é incerto, com diplomatas correndo contra o relógio nas negociações em Viena nesta semana. O Irã parece ver a atual escassez de petróleo como alavanca para extrair mais concessões. Sem um acordo com o Irã, as perspectivas para o mercado de petróleo seriam ainda mais perigosas. Atualmente, parece que as chances de um acordo estão à mercê da sorte.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.

Javier Blas é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre energia e commodities. Anteriormente, ele foi editor de commodities do Financial Times e é coautor de “The World for Sale: Money, Power, and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.

– Esta coluna foi traduzida por Marcelle Castro, localization specialist da Bloomberg Línea.

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