Mercados da América Latina buscam novo ‘gatilho’ para subir após ano de euforia

Região passou por meses de euforia com fraqueza do dólar, reposicionamento de fluxos estrangeiros e expectativa crescente de cortes nas taxas de juros globais, mas desaceleração global e volatilidades locais geram dúvidas sobre o futuro

Brazil Fights Cratering Real With Two Dollar Auctions In A Day
31 de Outubro, 2025 | 10:17 AM

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Bloomberg Línea — Nos mercados acionários latino-americanos, outubro trouxe saldos positivos, mas também preocupação.

A região passou por meses de euforia, impulsionada pelo enfraquecimento do dólar, pelo reposicionamento dos fluxos estrangeiros e por uma expectativa crescente de cortes nas taxas de juros globais.

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Depois de uma recuperação em mercados como Colômbia, Brasil e México, com aumentos de até 50% até agora neste ano, a última semana do mês foi marcada pela cautela.

As decisões do Federal Reserve enviaram uma mensagem mais severa do que o esperado e despertou temores.

“O principal desafio daqui para frente continua sendo a desaceleração do crescimento global, especialmente na China e nos EUA, dois parceiros importantes para a região”, disse Emanuel Juarez, analista da HF Markets.

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Em meio a esse cenário, analistas enfatizam que o equilíbrio é frágil.

“Os mercados acionários latino-americanos se movimentam em um ambiente de alta sensibilidade a fatores externos, como a evolução do dólar, as taxas de juros globais e o preço das matérias-primas“, explicou Felipe Sepúlveda, analista-chefe da Admirals para a região.

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Riscos à frente

Um dos principais riscos para os mercados é o arrefecimento do ciclo econômico global.

“Uma eventual pausa no ciclo de redução das taxas de juros dos EUA ou uma recuperação do dólar poderia amortecer os fluxos para a região”, disse Sepúlveda.

A vulnerabilidade das economias exportadoras, como Chile, Peru e Colômbia, as deixa particularmente expostas a qualquer queda nos preços do cobre ou do petróleo.

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As instabilidades internas também se somam.

“A volatilidade política interna em países como Argentina ou Peru tende a desacelerar os fluxos de investimento estrangeiro”, disse Juárez.

Ignacio Mieres, chefe de análise da XTB Latam, observou que “as eleições presidenciais e a evolução da inflação” são fatores-chave que podem mudar o humor do mercado.

Com a aproximação de 2026, os temores não estão mais relacionados apenas aos dados macroeconômicos, mas também à direção política e fiscal de cada país.

“Um eventual endurecimento das políticas comerciais, afetando as cadeias de suprimentos, pode se tornar um catalisador negativo“, alertou Mieres.

“Será essencial observar como o crescimento é equilibrado com a estabilidade fiscal em cada economia”, disse.

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Ressurgimento inesperado

A América Latina, que durante anos foi considerada retardatária e um mercado com pouco apetite, apresentou um dos ressurgimentos mais inesperados no cenário do mercado acionário global em 2025.

Várias ações da região não apenas saíram do marasmo, mas também subiram fortemente, surpreendendo até mesmo os gestores mais otimistas.

Ao analisar as ações que compõem o Msci Latam, um dos benchmarks da região, a Peñoles lidera a classificação com um aumento de mais de 180% até o momento neste ano.

A empresa mexicana de mineração capitalizou o aumento dos metais preciosos e isso se refletiu em seus resultados.

No final do terceiro trimestre, “a Peñoles apresentou um relatório robusto, com um crescimento de 14,2% nas receitas e de 27,5% no EBITDA, beneficiando-se do aumento acentuado dos preços do ouro e da prata. Seu lucro líquido aumentou mais de 650%, impulsionado por ganhos financeiros e cambiais, bem como por um controle de custos mais eficiente“, disse a Monex em seu último relatório.

Outro caso de destaque é o da Buenaventura, no Peru, com um avanço de quase 100%.

A empresa tem sido um dos principais veículos para capturar a alta do ouro e do cobre.

“A recuperação do ouro (52%) e do cobre (29%) tem sido decisiva para as empresas de mineração. No caso da Buenaventura, sua exposição ao ouro impulsionou as ações”, explicou César Huiman, analista da Renta 4.

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O Brasil também está passando por seu próprio momento de avanço.

Ações como as do BTG Pactual e da TIM Brasil se beneficiaram de um ambiente monetário mais favorável.

“A liderança de ações financeiras, como o BTG Pactual (BPAC11), e de ações de serviços, como a TIM Brasil(TIMS3), reflete o otimismo em relação a um ambiente de taxa Selic mais baixa e uma economia que mostra sinais de recuperação gradual“, disse Sepulveda, da Admirals Latam.

Juarez, da HF Markets, acrescentou que “empresas financeiras como o BTG Pactual e a TIM estão se beneficiando dessa dinâmica, e o apetite por ações locais pode ser sustentado se o real conseguir se manter e o banco central mantiver seu plano“.

Recuos

Mas, assim como algumas ações estão subindo fortemente este ano, outras recuam. Em meio ao entusiasmo com a alta das ações regionais, algumas empresas não conseguiram entrar no movimento de recuperação.

Seja devido a resultados fracos, pressões de custo ou deterioração das perspectivas, vários nomes da Msci LatAm caíram enquanto o restante do mercado comemora.

Uma das empresas mais atingidas foi a Suzano (SUZB3), com queda de 31,5% no acumulado do ano, afetada pelas tensões no mercado de celulose e por sua exposição à China.

De acordo com a XP, “os desafios na China persistem”, especialmente o excesso de capacidade e a concorrência de produtores integrados.

Embora a empresa busque novas oportunidades na Europa e na América do Norte, o relatório reconhece que “a visibilidade do fornecimento de madeira na China continua baixa” e que a pressão sobre as margens pode continuar no curto prazo.

A CMPC também não escapou do mau tempo no setor florestal e caiu 22,6% no ano.

O Bradesco BBI alertou sobre a fraqueza dos preços e das margens, enquanto o JPMorgan cortou as projeções devido à falta de catalisadores claros nos setores de celulose, Softys e embalagens.

No Brasil, a WEG (WEGE3) acumulou uma queda de 16,8%, após resultados trimestrais abaixo das expectativas. O Bradesco observou que “os resultados do terceiro trimestre confirmam o fraco momento das receitas”, refletindo uma desaceleração tanto no Brasil quanto no exterior.

Até mesmo gigantes como a Petrobras (PETR4), com queda de 10,2% no ano, foram penalizadas em meio à volatilidade dos preços do petróleo. Apesar dos bons números de produção, o JPMorgan destacou as preocupações com a política de dividendos e uma estratégia de investimento cautelosa.

Perspectivas para 2026

A recuperação da América Latina convocou os investidores globais para uma comemoração que poucos previram.

De acordo com Huiman, “os fundos de ações da América Latina receberam US$ 4,449 bilhões no acumulado do ano, superando a EMEA (US$ 2,169 bilhões)”.

Nos mercados andinos, os fluxos também se recuperaram fortemente e “atingiram mais de US$ 960 milhões, refletindo o renovado apetite estrangeiro por mercados com fundamentos sólidos e exposição a metais“.

Mas a política e as contas fiscais podem trazer de volta velhas preocupações.

“O principal risco para a sustentabilidade da recuperação vem do contexto político-eleitoral, que pode alterar as expectativas de investimento e a confiança das empresas“, alertou Julio Torres, da Inteligo.

Com as definições presidenciais a caminho e os desequilíbrios fiscais ainda latentes, os mercados regionais podem enfrentar mais problemas.

“Cortes orçamentários ou planos de ajuste fiscal confiáveis poderiam fortalecer a confiança dos empresários e sustentar o apetite por investimentos”, acrescentou Torres.