Bloomberg Línea — “Quem entra na gastronomia hoje para vender só comida já entra morto.”
A avaliação de Fernando Reis, CEO da Brasil Restaurant Week, em entrevista à Bloomberg Línea, reflete a transformação da cena gastronômica do país ao longo das quase duas décadas desde que o evento começou a ser realizado, em 2007.
De acordo com Reis, restaurantes e consumidores de todo o Brasil passaram por um processo de amadurecimento. Se no início o festival servia especialmente como vitrine para atrair mais clientes, hoje ele espelha um setor mais profissional e um público mais exigente.
E isso quer dizer que as pessoas não querem só boa comida, mas uma experiência de alto nível, que faça valer a pena o dinheiro gasto.
“Já fizemos pesquisas que mostram que, para os clientes, em primeiro lugar buscam limpeza, depois atendimento e ambientação. A qualidade da comida aparece em quarto lugar”, disse Reis.
O CEO observa que o consumidor mudou o modo de escolher e de consumir. “Você não sai de casa para gastar R$ 1.000 só para comer. Sai pela experiência, pelo o ambiente, a iluminação, o serviço, a temperatura do lugar. A comida é parte disso, mas não é o único fator.”
Leia também: Churrasco e planilha: como 2 executivos fizeram o Rincon Escondido driblar incertezas
Para o executivo, a Restaurant Week, que começou em São Paulo e hoje acontece em todas as regiões do país, não apenas acompanhou o processo, mas também deixou um legado estrutural.
Um dos símbolos disso, segundo ele, é a proliferação do conceito de menu executivo.
“Vinte anos atrás o conceito quase não existia, mas hoje a maioria dos restaurantes oferece menus executivos, com entrada, prato principal e sobremesa a preços mais acessíveis. E esse conceito foi implementado pela Restaurant Week”, explicou Reis.
Neste ano, o evento ocorre em São Paulo entre os dias 16 de outubro e 16 de novembro. Outras cidades que também participam do festival neste período são Salvador (02/10 a 02/11), Goiânia (19/09 a 19/10), Fortaleza (26/09 a 26/10), Recife (10/10 a 09/11), Belo Horizonte (23/10 a 23/11), Rio de Janeiro (30/10 a 30/11), entre outras.
Segundo o CEO, o festival funciona como um laboratório para novas práticas de gestão e atendimento. “A gente trabalha muito junto aos restaurantes em termos de treinamento, para que ofereçam essa experiência”, afirmou.
Para Reis, o avanço do festival acompanha a evolução da gastronomia brasileira e a formação de um público disposto a pagar mais por qualidade e experiência. “Hoje você não precisa sair mais do Brasil para comer nada em especial”, disse.
“A qualidade da gastronomia brasileira andou muito. E a Restaurant Week faz parte dessa história”, disse.
Leia também: A política da boa mesa: como Juscelino Pereira fez do Piselli um negócio de sucesso

Impulso de vendas
A Restaurant Week nasceu em Nova York, nos anos 1990, e foi trazida ao Brasil por Reis em 2007 com o objetivo de estimular o consumo em períodos de menor movimento e democratizar o acesso à boa gastronomia.
O formato, que oferece menus fixos a preços reduzidos, se expandiu desde então e atualmente está presente em 20 cidades brasileiras e mais de 2.000 restaurantes inscritos.
A evolução é um sinal de que a proposta deu resultado ao aumentar as vendas das casas, segundo Reis. A organização do evento diz que o festival deve gerar um incremento superior a 20% nas vendas das casas participantes.
Mas Reis é ainda mais otimista em sua leitura. “Em alguns casos, o fluxo de pessoas aumenta até 70% e o faturamento dos restaurantes sobe de 50% a 60% durante o festival”, disse.
Leia também: ‘Anti-restaurante’: como Daniel Sahagoff inovou com o Cantaloup há três décadas
Segundo o executivo, o volume de crescimento varia dependendo de cada mercado, mas que só em São Paulo deve movimentar cerca de R$ 35 milhões na edição atual, entre outubro e novembro deste ano.
“O evento reúne 190 restaurantes participantes, cada um com expectativa de servir em média 1.200 menus, o que, a um ticket médio de R$ 150, deve gerar um fomento estimado em R$ 35 milhões apenas na capital paulista”, disse.
Além do aumento de vendas, Reis alega que o evento também se consolidou como ferramenta de fidelização.
Segundo levantamento da organização, 27% dos clientes retornam aos restaurantes após o evento. “Isso mostra que mostra que ele também fideliza público”, disse Reis.
‘Circo’ armado
Reis admite que, na teoria, a Restaurant Week correu o risco de ser vítima do próprio sucesso.
O resultado positivo de fidelização e de transformação do mercado gastronômico, com a incorporação de menus executivos, poderia fazer com que os restaurantes não precisassem mais do evento para aumentar vendas.
“A diferença é que, quando a gente faz a Restaurant Week, a gente arma todo um circo”, explicou.
Leia também: Como Alain Poletto recriou um bistrô francês em SP com gestão e técnicas próprias
Com assessoria de imprensa, plano de mídia, influenciadores, patrocinadores e ativações, a organização do evento “cria um momento”, disse.
“O modelo já existe em muitos restaurantes, mas é algo perene, e portanto as pessoas às vezes nem se interessam tanto. Nós trazemos a questão mais pontual, temática, o que gera mídia e contribui para impactar o número de pessoas maior, consequentemente um giro maior nos restaurantes”, disse.
Enquanto os restaurantes ganham com aumento de vendas e fidelização, o modelo de negócios da própria Restaurant Week não depende do faturamento das casas participantes, e combina patrocínios de grandes marcas com a inscrição paga pelos restaurantes, sem participação no faturamento das casas. O festival não revela o seu faturamento total.