Ouro ou bitcoin: tarifas, taxas de juros e ETFs ampliam debate sobre portos seguros

O metal precioso mantém sua força como um clássico porto seguro, enquanto o bitcoin ganha legitimidade com um apoio institucional sem precedentes, mas enfrenta riscos regulatórios e de volatilidade

Cryptocurrency Kiosks Ahead of Eagerly Awaited ETF Decision
11 de Agosto, 2025 | 12:19 PM

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Bloomberg Línea — A disputa entre o ouro e o bitcoin como reserva de valor ganhou novo impulso em 2025 pelo fato de a criptomoeda permanecer acima de US$ 100.000, um nível que pode se consolidar como suporte.

Para James Seyffart, analista sênior de ETFs da Bloomberg Intelligence, “os defensores do ouro continuam a apontar para a longa história e a estabilidade de preços do metal, enquanto a crescente presença do bitcoin nas finanças institucionais e um ambiente regulatório mais favorável fortaleceram seu argumento de longo prazo“.

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Seyffart acredita que esses ativos não são mutuamente exclusivos. “Eles podem se complementar em um portfólio. O ouro tem melhores aplicações em alguns casos, e o bitcoin em outros“. Ele explicou que a criptomoeda “é mais transportável e divisível, e provavelmente mais aplicável como moeda”, enquanto o ouro “é mais estável, com um histórico comprovado de vários séculos”.

Ambos os ativos apresentam baixa correlação com instrumentos tradicionais - próxima de zero no caso do ouro - embora o bitcoin “apresente comportamento de preço e respostas de mercado que se assemelham às de um ativo especulativo”, com uma correlação crescente com ações que atingiu 0,17 nos últimos anos.

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12,5 kilogram gold ingots ready for distribution. Production of gold, silver, platinum and palladium ingots at the JSC Krastsvetmet precious metals plant in Krasnoyarsk, Russia, July 12, 2021.

Essa dinâmica fez com que “algumas instituições e muitos investidores convertessem pequenas porções de suas posições em ouro em bitcoin como proteção e diversificação“, disse o especialista.

Emanoelle Santos, analista de mercado da XTB Latam, acredita que esse argumento “ganhou força em 2025, impulsionado por uma confluência de fatores estruturais, políticos e tecnológicos”. Entre eles, ele destaca “o crescente apoio institucional, refletido na explosão de fluxos para ETFs de bitcoin, como o iShares Bitcoin Trust da BlackRock, que registrou bilhões em entradas líquidas”.

Apoio institucional e riscos latentes

Para Santos, o contexto político também foi um fator determinante. “A mudança pró-regulamentação em Washington, especialmente após o impulso para novas leis, como a Lei Genius, consolidou uma estrutura regulatória que reduz o risco legal para os investidores institucionais”.

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Isso permitiu que o bitcoin fosse percebido como um ativo mais legítimo, reforçando seu perfil como um porto seguro contra políticas monetárias expansionistas ou instabilidade financeira. “Ao contrário do ouro, que tem oferta limitada, mas é fisicamente caro para manter e transferir, o bitcoin oferece um modelo de escassez programada (21 milhões de unidades) com vantagens operacionais em termos de velocidade, portabilidade e divisibilidade“.

Quanto à oferta, Seyffart enfatiza que “a oferta fixa e a inflação controlada do bitcoin são sua espinha dorsal monetária” e lembra que “espera-se que o último bitcoin seja minerado em 2140, de acordo com um cronograma desinflacionário”.

O ouro, por sua vez, tem uma disponibilidade que está crescendo em uma média de 1-2% ao ano e pode aumentar, se forem descobertos depósitos maciços ou se a mineração espacial se tornar viável, embora essas possibilidades permaneçam remotas.

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Bitcoin monument located at the San Bartolo Plaza in Ilopango, El Salvador, on Monday, Nov. 11, 2024. The value of El Salvador's Bitcoin rose to a record $488 million amid the cryptocurrency's rally, according to the governments Bitcoin website.  Photographer: Juan Carlos/Bloomberg

De um ponto de vista mais cauteloso, Gregorio Gandini, analista financeiro, enfatiza que “o apoio institucional, especialmente dos ETFs, permitiu que alguns investidores institucionais assumissem posições no bitcoin dessa forma. Mas não acho que ele deva ser visto como um porto seguro devido ao nível de risco envolvido”.

Ele adverte que “há um risco regulatório significativo, mas também a falta de transparência na compreensão dos fatores e as forças que o afetam é muito relevante“. Ele reconhece que a vantagem “poderia ser a diversificação das fontes de risco às quais o portfólio está exposto e, no momento, a postura da Casa Branca torna isso atraente”.

Ouro e geopolítica

Como meio de pagamento, Seyffart acredita que “o bitcoin é superior ao ouro como meio de troca: ele é digitalmente nativo, facilmente divisível e transferível sem intermediários, resolvendo muitos dos atritos que tornam o ouro impraticável como moeda cotidiana“.

Entretanto, a volatilidade continua sendo um obstáculo “e seu histórico de quedas profundas limita seu uso como reserva de valor ou meio de troca”, pois “um ativo propenso a quedas de 70% não pode funcionar de forma confiável como reserva de valor”.

Em relação ao ouro, Felipe Barragan, estrategista de pesquisa de mercado da Pepperstone, lembra que “o ouro retomou a tendência de alta nas últimas semanas, impulsionado por uma combinação de fatores econômicos e geopolíticos”.

Entre eles, ele cita “o crescente consenso em torno de futuros cortes nas taxas pelo Federal Reserve” e o impacto da incerteza em torno das mensagens confusas sobre as tarifas dos EUA sobre barras de ouro de 1 kg e 100 oz, embora a Casa Branca tenha esclarecido a medida.

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32, one kilogram bars of gold bullion, worth one million pounds sterling, sit on a table in this arranged picture at the Sharps Pixley bullion shop and showroom  in London, U.K., on Thursday, Jan. 18, 2018. Photographer: Luke MacGregor/Bloomberg

Nesse cenário, o contraste entre o ouro e o bitcoin como ativos portos-seguros está sendo redefinido em um momento em que ambos estão se beneficiando de fatores estruturais e conjunturais. O ouro preserva seu papel como reserva tradicional de valor, apoiado por sua estabilidade e pela atual tensão geopolítica, e o bitcoin é impulsionado por um apoio institucional sem precedentes e por uma estrutura regulatória mais clara nos Estados Unidos.

Para os analistas, a decisão não parece ser uma substituição direta, mas uma avaliação de como equilibrar a segurança comprovada do metal com o potencial - e os riscos - da alternativa digital em seus portfólios.

Carlos  Rodríguez Salcedo

Periodista colombiano, especializado en economía. Fui periodista, editor y macroeditor del diario La República, con experiencia en temas macroeconómicos, empresariales y financieros. Además, pasé por la agencia de noticias Colprensa.