Por que o preço do azeite não deve voltar ao pré-crise, segundo este produtor global

Aumento da produção na Europa levou a uma redução de quase 50% do valor na região, mas redução para o mercado brasileiro deve se limitar a 10%, diz Eduardo Casarin, country manager da marca italiana Filippo Berio, à Bloomberg Línea

Freshly harvested green olives in crates on a grove ahead of olive oil production. Photographer: Konstantinos Tsakalidis/Bloomberg
Por Daniel Buarque
01 de Julho, 2025 | 03:09 PM

Bloomberg Línea — Depois de uma crise global que aumentou os preços do azeite no mundo, finalmente a produção de azeitonas nos principais países produtores globais ganhou força e passou a indicar uma saída do momento mais grave.

Os consumidores brasileiros, entretanto, terão que se acostumar com a realidade gerada pela crise que levou à inflação do produto a mais de 50% no ano passado.

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Por mais que o cenário internacional tenha melhorado, com queda acentuada nos preços globais e com medidas fiscais que beneficiam as importações, o valor do produto no Brasil segue elevado em termos históricos, em torno de R$ 40. E deve continuar distante dos patamares praticados antes da crise.

A avaliação é de Eduardo Casarin, country manager da marca italiana Filippo Berio para o Brasil e a América Latina.

Segundo o executivo, embora exista uma expectativa concreta de redução de até 10% no preço do azeite no Brasil ao longo de 2025, diversos fatores limitam o repasse dessa queda ao consumidor final.

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Nos últimos 12 meses até maio, na verdade, o preço subiu praticamente 1%, segundo os dados mais recentes do IPCA, do IBGE.

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“O mercado doméstico não vai voltar a preços como nós tivemos lá no passado, com valores de cinco, seis anos atrás”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.

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“Nós estamos percebendo já uma queda dos preços, mas ela não está no mesmo nível que na origem, na Europa”, explicou.

Segundo um levantamento da empresa, o preço internacional do azeite extravirgem caiu de cerca de US$ 10.000 para US$ 5.500 por tonelada entre fevereiro de 2024 e janeiro de 2025. Um recuo da ordem de 45%.

No Brasil, a queda não chega nem deve chegar de forma tão acentuada ao consumidor final.

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Parte do motivo está na defasagem entre a recuperação da safra na Europa e a chegada dos novos lotes ao mercado brasileiro, explicou Casarin.

“Leva tempo para o azeite sair da Europa com custo reduzido e chegar aqui. E ainda existe o reflexo dos estoques anteriores. Portanto o reajuste não é automático”, disse Casarin.

Eduardo Casarin, country manager da marca italiana Filippo Berio para o Brasil e a América Latina

Além do tempo de trânsito, uma série de outros elementos complica a transmissão das quedas externas de preços ao consumidor local.

Entre eles estão a valorização do euro frente ao real - cerca de 90% das importações brasileiras de azeite são negociadas em moeda europeia -, os custos logísticos internacionais ainda elevados e os impostos no Brasil.

“Nós temos estoque remanescente. Nós temos valorização do euro em relação ao real. Nós tivemos um benefício que foi a redução do imposto de importação de 9% para zero, mas isso vale só para os novos lotes”, resumiu Casarin.

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Outro fator relevante é a tentativa do varejo de recompor margens de lucro, pressionadas durante o período de alta abrupta de preços, disse.

Isso vale também para quem está no campo.

“O produtor de azeite tem um custo fixo. Ele pode decidir segurar um pouco a oferta para estabilizar os preços.”

Embora ainda distante do patamar histórico de preços mais baixos, o mercado brasileiro de azeite começa a dar sinais de normalização.

“Estamos diante de um cenário de ajuste progressivo, no qual as condições de oferta melhoram, mas a complexidade da cadeia impede uma rápida repercussão nos preços finais”, resumiu Casarin.

O Brasil, que compra de outros países praticamente todo o azeite que consome, é hoje um dos maiores mercados importadores do mundo, atrás apenas da União Europeia e dos Estados Unidos, segundo o executivo.

O consumo per capita, por sua vez, é considerado baixo. “A Itália talvez tenha um quarto da nossa população e tem o mesmo consumo absoluto de azeite”, disse Casarin, indicando o potencial de crescimento do mercado nacional.

O aumento dos preços no ano passado levou a uma retração expressiva no consumo. “Houve um impacto no consumo da ordem de 20%.”

O aumento dos preços afastou consumidores, que passaram a buscar alternativas com preços mais baixos.

“O consumidor que comprava o azeite de oliva passou a consumir um blend, outro azeite de marca mais acessível ou óleo de girassol”, disse Casarin.

Nos supermercados, o fator decisivo passou a ser o preço.

“O consumidor chega, olha várias marcas, faz análise de vários rótulos e, de repente, o que ele leva? O que está mais barato no ponto de venda.”

Com a redução de preços, ainda que gradual e em menor magnitude do que no exterior, há uma expectativa de recuperação da demanda.

Essa recomposição das vendas, por sua vez, pode contribuir para uma estabilização dos preços e também impedir uma queda maior, ao equilibrar a relação entre oferta e procura.

“Se a demanda aumentar, ela vai regular o preço”, disse o executivo.

Para os próximos meses, a expectativa do setor é positiva, especialmente se a safra europeia de 2025/2026 repetir o desempenho da anterior.

“A florada foi boa, houve um período de chuva muito benéfico para a produção da oliva”, afirmou.

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Desafio português

No Brasil, a Filippo Berio possui cerca de 4% de market share e detém 75% das vendas de azeites italianos, mas enfrenta uma competição com o produto português, mais consolidado no país.

A estratégia da marca é se posicionar como um produto de qualidade superior, mas com preço competitivo em relação às líderes de volume, como Gallo e Andorinha - ambas de origem portuguesa e que juntas concentram mais da metade do mercado nacional.

“Não vamos chegar a ser um azeite de primeiro preço no Brasil. Também não vamos ser um produto de nicho. Vamos estar sempre no nível de precificação das marcas de maior volume”, disse Casarin.

Durante a recente crise de consumo com a escalada dos preços, a marca conseguiu preservar sua distribuição e manteve presença nos principais pontos de venda do país. Agora começa a colher os frutos dessa estabilidade.

“Estamos com uma performance que consideramos excelente em todas as regionais. A Filippo Berio está com uma das melhores performances da América Latina. O Brasil está um pouco aquém, mas acredito que em pouco tempo vamos recuperar esse número”, afirmou.

A empresa também investe em comunicação, marketing e educação do consumidor. “Queremos que o consumidor olhe para a nossa marca e fale: ‘Vou levar um produto que está na mesma percepção de preço das outras marcas, mas com qualidade superior’.”

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Daniel Buarque

Daniel Buarque

É doutor em relações internacionais pelo King’s College London. Tem mais de 20 anos de experiência em veículos como Folha de S.Paulo e G1 e é autor de oito livros, incluindo 'Brazil’s international status and recognition as an emerging power', 'Brazil, um país do presente', 'O Brazil é um país sério?' e 'O Brasil voltou?'