Bloomberg Línea — A Reservas Votorantim (rV), “braço” do Grupo Votorantim dedicado à gestão de florestas e a negócios na “economia verde”, acaba de acertar um dos contratos mais importantes de sua trajetória aproximada de uma década.
O contrato é uma parceria de longo prazo com a IFF, empresa global com sede em Nova York e uma das maiores e mais longevas no desenvolvimento de fragâncias, essências e ingredientes para as indústrias de alimentos e cosméticos, para pesquisa e bioprospecção da maior reserva privada de Mata Atlântica do país, denominada Legado das Águas, no Vale do Ribeira, no sul do estado de São Paulo.
O acordo prevê que a IFF e sua subsidiária LMR Naturals - sua plataforma para ingredientes sustentáveis de alta performance - construam um laboratório em uma área de infraestrutura já existente dentro da área de mata, que possui mais de 31.000 hectares.
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As empresas terão acesso exclusivo para pesquisar cerca de mil espécies de flora para desenvolver novos extratos para perfumaria e cosméticos.
“Desenvolvemos muitas iniciativas para criar valor com reflorestamento, com outras oportunidades em nossos viveiros e assim por diante. Um dos potenciais em que acreditamos - e que faltava acelerar - é o da bioprospecção”, disse David Canassa, CEO da Reservas Votorantim, em entrevista à Bloomberg Línea.
“Quem sabe não possamos desenvolver algo semelhante para narrativa a um Vale do Silício da biodiversidade junto com a IFF no Legado das Águas”, disse Canassa em referência ao potencial de pesquisas envolvendo ingredientes do bioma, assim como a região na Califórnia se tornou sinônimo em pesquisa em tecnologia.
Segundo o executivo, o grupo realiza investimentos em pesquisa no Legado das Águas desde a sua criação há 13 anos - ou seja, em momento anterior à formação da Reservas Votorantim -, diante do entendimento de que “o conhecimento aprofundado da floresta tem a capacidade de destravar oportunidades”.
Atualmente a rV gerencia cerca de 130 mil hectares de florestas, com foco em negócios sustentáveis no modelo de múltiplos usos da terra, em frentes como crédito de carbono, reserva legal, biodiversidade e outras.
“Trabalhamos há muitos anos para transformar em realidade o potencial da biodiversidade”, disse Canassa, citando que o mercado brasileiro nessa área é estimado em US$ 6 bilhões, com crescimento médio acima de 5%.
“Esperamos que essa parceria sirva de inspiração para outros empreendedores sobre o potencial de transformar nossa biodiversidade em negócios, o que vai gerar mais riqueza para o nosso país”, disse o CEO da rV.
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Segundo Canassa, a pesquisa no bioma da Mata Atlântica tem um potencial que pode ser explorado de maneira mais ampla a exemplo do que já acontece com a Amazônia - bioma já consagrado com iniciativas de empresas como a Natura.
Charles Bouez, vice-presidente sênior de R&D da IFF Scent, destacou as perspectivas em pesquisas em florestas e na Mata Atlântica.
“Nós entendemos que muitas plantas têm um grande potencial em extratos para perfumes e outros usos. Desenvolvemos muitas pesquisas sobre isso e acreditamos que era necessário trazer um parceiro muito forte para trabalhar conosco dentro da floresta”, disse o executivo da IFF na mesma entrevista.
Segundo ele, a parceria marca um novo capítulo de envolvimento da IFF com o Brasil, cujo início aconteceu há quase 75 anos.
Bouez fala com conhecimento de causa do potencial de negócios aliado à preservação da natureza no Brasil. O executivo foi anteriormente vice-presidente de Pesquisa Avançada da L’Oréal Americas, o que envolveu liderar o Centro de Pesquisa & Inovação da gigante francesa de cosméticos na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, um de seus principais laboratórios de R&D do mundo.

Segundo os executivos, o projeto pretende beneficiar comunidades locais com programas voltados à orientação técnica sobre as melhores práticas de conservação e cultivo de plantas nativas com potencial para se tornarem os próximos ingredientes da indústria - com consequente geração de renda de forma sustentável.
A instalação de um laboratório dentro da reserva permitirá que a pesquisa com conexão internacional seja realizada ao longo do ano, nos diferentes ciclos da flora local, segundo Bouez. Essa é, aliás, uma das características que tornam a parceria um projeto “único”, disseram.
“Quanto mais avançarmos, mais voltaremos a mobilizar recursos e a recorrer à profunda expertise do Laboratório Monique Rémy”, disse o executivo da IFF citando o centro de pesquisa que é referência mundial na indústria de perfumaria, em Grasse, na França, e que leva o nome de sua fundadora.
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“É um laboratório que domina as técnicas de métodos específicos de extração de essências 100% naturais”, disse Bouez. Segundo ele, a IFF conta atualmente com uma paleta com mais de 850 ingredientes botânicos que as equipes internas utilizam para criar novas fragrâncias.
No caso da reserva Legados da Água, associado ao potencial abrangente, há um olhar particular voltado para o próprio país, disseram os executivos.
“O que nos motiva é pensar no consumidor brasileiro, porque ele quer uma solução baseada na natureza. Gostaríamos de desenvolver e levar uma solução do Brasil e do ecossistema local para os consumidores brasileiros”, disse o CEO da Reservas Votorantim sobre os objetivos perseguidos com a parceria.
“Eu sei o quão importante, o quão grande e o quão exigentes são os consumidores brasileiros. Se você consegue ter sucesso no Brasil, consegue em qualquer lugar, porque é um grande teste de estresse. E nós adoraríamos ter sucesso por ser um mercado enorme e impressionante”, complementou Bouez.
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