Opinión - Bloomberg

Reguladores do Reino Unido miram Zuckerberg com novas normas de internet

O Reino Unido vai ameaçar prender os magnatas das redes sociais se eles quebrarem as novas normas de segurança; e essa até que é uma boa ideia

CEO da Meta pode acabar atrás das grades?
Tempo de leitura: 4 minutos

Bloomberg Opinion — O governo do Reino Unido está prestes a fazer algo aterrador para o Vale do Silício, ou que pelo menos vai fazer os executivos de mídia social pensarem duas vezes antes de pisar no Reino Unido.

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O primeiro-ministro Rishi Sunak parece estar convicto de fortalecer o Projeto de Lei de Segurança Online do Reino Unido com sanções criminais para os mandachuvas das mídias sociais, depois de uma forte pressão do partido conservador do país. O projeto de lei visa proteger adolescentes menores de idade de conteúdo prejudicial; portanto, se os órgãos reguladores descobrirem que o Instagram está direcionando os britânicos para conteúdo que incite o suicídio, Mark Zuckerberg pode pegar até dois anos de prisão.

Por mais que isso pareça rígido, políticos de todos os principais partidos anseiam por normas mais rigorosas. O projeto deve ser votado na Câmara dos Lordes neste semestre. Salvo qualquer evento relevante – como uma nova troca de primeiro-ministro – o Projeto de Lei de Segurança Online deve ser aprovado antes de novembro deste ano, quando acaba a atual sessão do Parlamento britânico.

Naturalmente, nada disso funcionou com os magnatas da tecnologia. Jimmy Wales, cofundador da Wikipédia, chamou a decisão de uma forma de tirania, ao passo que outros suspeitem de uma vingança dos políticos britânicos contra o Vale do Silício.

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Na verdade, é uma decisão prudente. Sanções penais “tirânicas” fizeram parte da vida regulatória dos setores bancário e de construção da Grã-Bretanha há anos, e sua mera existência ajudou a manter contabilidades na linha e facilitou o processo de regulamentação. Nos últimos seis meses, foram proferidas sentenças de prisão a pelo menos quatro pessoas do setor de construção civil devido a acidentes fatais, incluindo a queda de um funcionário de 69 anos que estava trabalhando em uma reforma no ano passado; o gerente que supervisionava a obra ficou preso nove meses depois que inspetores constataram que o andaime em que o funcionário trabalhava não tinha guarda-corpo.

As condenações foram menos comuns em normas financeiras introduzidas após a crise de 2008 para impedir a má conduta, mas criaram uma cadeia de responsabilidade mais clara para os bancos, que foram forçados a traçar mapas das funções e responsabilidades dos executivos para a agência reguladora financeira do país.

As empresas de mídia social, por outro lado, não precisam divulgar quem está encarregado de cada coisa, mesmo que tenham divisões inteiras dedicadas a trabalhos fundamentais, como impedir a incitação de violência, assédio e desinformação em suas redes.

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Aliás, apenas sabemos que o chefe de segurança do Facebook responde para o principal lobista Joel Kaplan porque um membro do Parlamento britânico fez essa pergunta vezes em uma audiência no final de 2021. Essa cadeia de comando não inspira muita confiança nas preocupações da empresa com a segurança dos usuários, já que Kaplan é encarregado de melhorar a postura política do Facebook.

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A denunciante do Facebook, Frances Haugen, revelou que o Instagram sabia que seu aplicativo piorava problemas de imagem corporal para mulheres e que os sistemas de ranking baseado em engajamento da Meta (META) levava mais pessoas a se sentirem ultrajadas para mantê-las navegando na rede. Durante anos, a empresa priorizou o lucro em detrimento de segurança, mas só recebeu repreensões leves dos órgãos reguladores – multas multimilionárias que são trocados para a gigante receita da empresa.

Frustrados com o fato de as empresas de tecnologia não cumpriram as promessas de deixar de prejudicar a saúde mental de crianças e adolescentes, grupos britânicos de proteção à criança pressionando por punições mais assustadoras para os executivos das empresas de mídia social.

E a ideia não é tão estranha do ponto de vista judicial. Stephen Bainbridge, professor de direito na UCLA, indica que a punição de uma empresa inteira pelo mau comportamento de seus diretores – como a maioria dos processos judiciais contra a Meta e outras Big Techs até agora – acaba prejudicando injustamente inocentes. Acionistas perdem dinheiro e funcionários podem perder seus empregos.

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Sanções pessoais contra a liderança de uma empresa são uma forma mais eficaz de repreender mau comportamento, diz ele. Afinal, empresas não são personagens morais. “As empresas são apenas um nexo de contratos entre fatores de produção”, diz Bainbridge. “Não há base moral para aplicar uma justiça retributiva a uma empresa. Não há nada para ser punido”.

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Um projeto que prevê pena de reclusão realmente faria Zuckerberg acabar atrás das grades? A Meta e seus pares provavelmente farão tudo em seu alcance para impedir esse resultado, mas só a possibilidade quase certamente levará as empresas a cooperar com os órgãos reguladores e a colocar as normas em vigor. Seria uma grande melhoria para o status quo.

O timing também é apropriado, pois os líderes das Big Techs estão cortando empregos, freando sua cultura de benefícios custosos e dizendo à equipe que é necessário trabalhar mais. Essa mudança na cultura é necessária para as Big Techs há algum tempo.

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Agora chegou a hora de as pessoas no poder perderem alguns luxos também, incluindo as proteções legais das quais gozam há anos.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “We Are Anonymous.”

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