Como investir e se proteger do aumento do risco fiscal, segundo 5 especialistas

Incertezas fiscais, recessão nos Estados Unidos e altas taxas de juros preocupam investidores no começo de 2023 ; veja as recomendações de corretoras e gestoras

O momento pode ser instável e indica a necessidade de diversificar a carteira de investimentos
02 de Janeiro, 2023 | 09:11 AM

Bloomberg Línea — Os primeiros anúncios do novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda na fase de transição nos dois meses finais de 2022, exacerbaram as preocupações de investidores com o risco fiscal de médio e longo prazo no Brasil.

O cenário de incertezas fiscais se soma às perspectivas de recessão nos Estados Unidos e na Europa, ao agravamento da pandemia na China e às taxas de juros cada vez mais altas dos bancos centrais desenvolvidos: o resultado é um quadro mais complexo para investidores.

Segundo analistas ouvidos pela Bloomberg Línea, o momento indica muita instabilidade e recomenda a necessidade ainda maior de diversificar a carteira de investimentos.

Cenário macro

Em relatório no fim de 2022, a XP Investimentos afirmou que o cenário para o Brasil pode continuar positivo, com um eventual afastamento das tensões geopolíticas (como a guerra na Ucrânia) e a alta no preço das commodities, que beneficia o país. Os riscos globais, destacou a corretora, existem, mas “o Brasil parece estar bem posicionado para eles”.

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A XP disse ainda ser cedo para definir como deve ser o terceiro mandato de Lula.

“Além do fiscal, outros temas como a reforma tributária, o modelo das parcerias público-privada, o papel do BNDES e o da Petrobras (PETR3, PETR4) também serão fundamentais para o desempenho econômico brasileiro em 2023 e nos anos seguintes”, afirmaram os analistas.

A Guide Investimentos indicou que ainda existem incertezas quanto à política econômica a ser adotada pelo novo governo, o que deixa o cenário doméstico mais instável.

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“Em nossa visão, a falta de clareza sobre a política econômica do próximo governo está por trás da queda no preço dos ativos no Brasil. O efeito da incerteza parece maior que o da piora das expectativas”, disse a corretora em relatório, citando o relatório Focus, do Banco Central, e as projeções para o crescimento do PIB, a inflação e os juros em 2023.

No domingo, Lula afirmou em discurso que “o Estado quem vai induzir o investimento para retomar o crescimento econômico”, como defendeu e repetiu ao longo da campanha eleitoral.

“Os bancos públicos, especialmente o BNDES, e as empresas indutoras do crescimento e inovação, como a Petrobras, terão papel fundamental nesse novo ciclo”, disse Lula.

A Guide afirmou no relatório que não é momento para investidores entrarem em pânico. Calma e cautela são as palavras-chave para o ano que acaba de começar.

É a hora da renda fixa?

Para a Toro Investimentos, plataforma do Santander Brasil, é hora de se proteger, alocando recursos em renda fixa e aproveitando a alta nos juros, que estão no patamar de 13,75% ao ano desde agosto passado.

“Mesmo com grande incerteza tanto no cenário macro quanto internamente, ter uma carteira dividida é o ideal. Uma forma de se proteger contra a instabilidade política seria aplicar em produtos de renda fixa, principalmente os pós-fixados com duração curta de um ou dois anos, já que as perspectivas são as de que não haja corte na taxa de juros até meados de 2023”, disse a analista Gabriela Sporch.

Segundo Sporch, da Toro, a depender de como o cenário econômico ficará em 2023, “isso pode estressar as curvas de juros longas e, então, surgir oportunidades de investimentos mais atrativas”.

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“Outra possibilidade, seria uma exposição direta ao mercado internacional ou por fundos cambiais, acreditando que o dólar pode se fortalecer frente a outras moedas e se beneficiar deste movimento”, completou.

Para a BlackRock (BLK), maior gestora do mundo em ativos administrados, um cenário mais benigno é possível “à medida que as avaliações passem a refletir esses impactos econômicos, ou se acreditarmos que os mercados têm clareza suficiente para aumentar o risco de forma sustentável”. A gestora, porém, não antecipa uma “nova década de alta simultânea no mercado de ações e renda fixa”.

“Finalmente, a renda fixa está oferecendo retornos atraentes, em especial nos títulos governamentais de curto prazo e nos títulos corporativos de alta qualidade”, disse Cristiano Castro, diretor do segmento wealth da BlackRock Brasil.

“Mas o novo manual neste novo regime não considera que os títulos governamentais de longo prazo cumprirão o papel tradicional de serem um seguro contra correções em ativos de risco como, por exemplo, as ações”, afirmou o especialista da divisão de gestão de patrimônio.

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A BlackRock ainda afirmou que, na renda fixa, “o novo manual destaca a atratividade dos títulos corporativos com grau de investimento, bem como dos títulos indexados à inflação, em um cenário de inflação persistente”.

Fundos multimercados ganham espaço

Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset, indicou que fundos multimercados devem se beneficiar do ambiente incerto de 2023, pois podem “reagir de maneira mais rápida e realizar investimentos nos mercados internacionais caso uma deterioração doméstica mais pronunciada venha a se materializar”.

O mesmo ponto de vista de alocação é defendido pela XP, que afirmou em relatório que deve ser mantida uma alta exposição a essa classe de ativos, “sendo bastante seletivos na composição dos fundos (locais e globais) escolhidos para o portfólio”.

ETFs e BDRs

Para a BlackRock, podem ser considerados na carteira BDRs (recibos de ativos negociados no exterior) de ETF e ETFs locais.

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“No contexto de volatilidade, ETFs são veículos flexíveis e ágeis. A navegação nos mercados exigirá mudanças frequentes de portfólio e visões mais granulares em setores, regiões e classes de sub-ativos, em vez de exposições mais amplas. E os ETFs são os veículos ideais para alocações táticas e oportunistas”, disse Paula Salamonde, diretora do segmento institucional e iShares ETF da BlackRock Brasil.

Renda variável

Segundo a BlackRock, no mercado de ações globais, a estratégia é mais defensiva, “favorecendo indústrias como a da saúde e a dos produtores de energia”, que devem se beneficiar de políticas esperadas durante o governo Lula.

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Outros setores, como os de educação, mineração e siderurgia, papel e celulose e petróleo e gás, devem ter alta no Brasil em 2023, segundo a XP Investimentos.

A corretora afirmou estar otimista com os preços de petróleo, acreditando se tratar de um bull market existente já há alguns anos.

Para educação, “ainda há espaço para consolidação do setor e não descartamos a possibilidade de uma ou mais transações transformacionais”, de acordo com os analistas.

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Alguns setores, segundo os especialistas, podem não ter um ano tão positivo não somente por causa do cenário doméstico mas em razão de pressões externas como a recessão, os juros altos e o aumento dos casos de covid-19 na China.

O setor de tecnologia, por outro lado, continua a ser avaliado pela XP, mas esta aconselhou cautela “a despeito da pressão recente no preço de algumas ações na nossa cobertura, refletindo em boa medida o cenário de aperto monetário no Brasil e no mundo”.

Para a Toro, o momento é de passar longe de ativos de tecnologia e de varejo, “pois são instituições que sofrem bastante em um cenário de juros altos, com o aumento na inadimplência e aumento das taxas de desconto em seu fluxo de caixa, respectivamente”.

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A XP afirma, no entanto, que no varejo é favorecida a exposição a segmentos mais defensivos, “com varejo alimentar sendo a preferência, mas farmácias sendo uma alternativa possível”.

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Tamires Vitorio

Jornalista formada pela FAPCOM, com experiência em mercados, economia, negócios e tecnologia. Foi repórter da EXAME e CNN e editora no Money Times.