Elon Musk e Twitter levam batalha por acordo de fusão para tribunal
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Bloomberg Opinion — A juíza chefe do Tribunal de Chancelaria de Delaware, Kathaleen St. J. McCormick ouviu os advogados do Twitter (TWTR) nesta terça-feira (19), que pleitearam um julgamento rápido em seu processo contra Elon Musk, enquanto os advogados do bilionário tentaram adiar o caso para o próximo ano. Com a vitória do Twitter, o julgamento será em outubro de 2022.

Vale a pena ler na íntegra a petição do Twitter. O documento refuta diversos motivos de Musk para desistir da compra da empresa com a avidez de um leão faminto na caça por um antílope perneta. Os contra-argumentos do Musk são pouco convincentes, e ele criou um amplo registro digital – boa parte desses registros estão na própria plataforma que ele quis comprar. Este não é um caso de uma batalha de argumentos, mas sim argumentos contra provas.

Sabe o argumento central de Musk de que foi pego de surpresa pelo problema dos bots no Twitter? Há um tweet sobre isso.

Se o acordo com o Twitter der certo, acabaremos com os bots de spam a qualquer custo.

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Os advogados do Twitter expõem as exigências dos assessores do Musk que ficavam cada vez mais expansivas à medida que o negócio avançava, alegando de forma bastante convincente que esta era uma manobra para que Musk tivesse uma desculpa para desistir da oferta. O pedido de uma cópia do modelo de avaliação do próprio Twitter é uma prova de profunda falta de seriedade. A resposta à petição do Twitter, apresentada na sexta-feira (15), ecoa essa abordagem: os advogados de Musk solicitam uma avaliação mais detalhada (e bem lenta) da questão dos bots, que é o que eles desejam que seja o foco do caso. Mas o Twitter tem a razão: o bilionário assinou um acordo de fusão que não tinha nada a ver com bots.

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O Twitter alega ter mais provas de enrolação. Na página 46 da petição, os advogados da empresa detalham as preocupações de que Musk estava tentando conseguir os empréstimos necessários a tempo. Em 23 de junho, Musk informou à administração da empresa que havia demitido Bob Swan, ex-CEO da Intel, de sua equipe “pois não estavam alinhados”. Podemos pressupor que foi uma observação bem precisa.

No entanto, dois meses após a assinatura da oferta vinculativa e com Musk já sinalizando remorso (novamente, no Twitter), a empresa ficou alarmada (e com razão) com a saída de um assessor sênior.

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Os temores se agravaram quando Musk também exigiu as projeções de fluxo de caixa para seus credores muito mais tarde do que deveria – sugerindo, na melhor das hipóteses, uma abordagem caótica para um negócio de US$ 44 bilhões e, na pior das hipóteses, uma falta de interesse em fechar negócio. Musk acrescentou a visão útil de que os emissores de dívida “são muito mais conservadores do que os emissores de ações”. Dá para imaginar a tentação dos assessores do Twitter de enviar uma mensagem: “obrigado pela dica, Bud”.

Os advogados de Musk também reclamaram que o Twitter demitiu alguns funcionários sem seu consentimento. E mesmo assim, segundo o Twitter, ele não apenas abriu mão desse direito como também enviou uma mensagem para o presidente da empresa em 28 de abril afirmando que sua “maior preocupação era o tamanho do quadro de funcionários e o aumento dos gastos”. Dessa vez, Musk não escreveu um tweet, mas, pressupondo que a mensagem é legítima, ela também é uma prova.

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Todo o caso vem sendo tão simples e direto que ficou banal. Um bilionário fez um acordo para comprar uma empresa e depois se arrependeu quando o mercado foi contra ele. Ou, como os advogados do Twitter disseram:

Após montar um espetáculo para colocar o Twitter nos holofotes e fechar um acordo de fusão favorável ao vendedor, Musk aparentemente acredita que ele (ao contrário de qualquer outra parte sujeita às leis contratuais do estado americano de Delaware) pode mudar de ideia livremente, difamar a empresa, interromper suas operações, destruir o valor para os acionistas e sair como se nada tivesse acontecido.

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Outros aspectos relacionados do caso, como o fato de Musk ser proprietário do Twitter ser bom ou ruim ou a possibilidade de uma liquidação financeira, são interessantes mas não devem nos distrair do ponto central: será que Musk está acima da lei?

Os fãs mais ferrenhos de Musk admiram sua capacidade de (aparentemente) contornar convenções e órgãos reguladores. Pensando dessa forma, as conquistas comerciais de Musk significam que a sociedade deveria tolerar seus defeitos. Mas isso é um absurdo. Sim, ele está fazendo uma revolução na área de veículos elétricos, mas vem sendo generosamente recompensado por isso. De fato, considerando que a Tesla (TSLA) perdeu quase US$ 460 bilhões de valor nos últimos seis meses, mas ainda assim a ação é negociada por 66 vezes o valor do lucro, pode-se dizer que ele foi recompensado muito antes de sua conquista. Não precisa de mais nada.

O mais importante: durante a maior parte de seus 12 anos empresa de capital aberto, a Tesla sobreviveu com doses regulares de novos recursos de investidores. O sucesso de Musk, como o de muitos empreendedores nos EUA, dependeu muito de seu acesso à maior pool de capital acionário do planeta.

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O que explica a força notável dos mercados públicos americanos? Um elemento crítico é um conjunto de leis e diretrizes destinadas a garantir que quando alguém assinar um acordo vinculativo, o conclua de boa fé. Pressupor que uma das partes pode colher os frutos de um sistema financeiro criado com o suor e o sangue de outros durante décadas, mas desprezar as regras quando for conveniente, é uma grande audácia.

Estamos em um momento no qual a se questiona a capacidade de as instituições americanas fazerem valer as leis e normas mais fundamentais. O novo inimigo aparente de Musk, o ex-presidente Donald Trump, continua com suas falácias sobre as eleições de 2020 e, até agora, parece não ter sido punido. É claro que, na comparação, a compra do Twitter é ínfima. Mas há paralelos no culto a esses dois homens e seu óbvio desprezo pelas regras, devido em grande parte ao seu uso liberal das redes sociais.

Musk tem direito a uma audiência justa, e seus advogados ainda podem revelar algum argumento válido. Só que os apresentados até agora não são favoráveis. Ao contrário, eles ofereceram amplos motivos para que o juiz apresse o julgamento para mostrar que as leis que beneficiam a todos (inclusive Musk) não devem ser ignoradas.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Liam Denning é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia e commodities. Foi banqueiro de investimentos e editor da coluna “Heard on the Street”, do Wall Street Journal, e também escreveu para a coluna “Lex”, do Financial Times.

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