Qualcomm aposta em IoT, edge IA e notebooks para ir além do mobile em LatAm

CEO da gigante de chips para a região, Luiz Tonisi conta em entrevista à Bloomberg Línea como a operação se prepara para cumprir uma meta global: obter 50% da receita em novos negócios que não voltados para smartphones

La sede de Qualcomm se adelanta a las cifras de beneficios
27 de Agosto, 2025 | 05:00 AM

Bloomberg Línea Brasil — A Qualcomm completa 40 anos com o foco em uma transição que deve redesenhar o balanço da companhia nos próximos cinco anos: sair de uma empresa que é sinônimo de chips para smartphones para se tornar referência em edge AI, automotivo, IoT e PCs com inteligência embarcada.

A meta, já apresentada a investidores em Wall Street pelo executivo brasileiro Cristiano Amon, CEO global da companhia, é ousada: até 2029, metade da receita global virá de negócios que vão além do mobile.

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Na América Latina, o desafio está nas mãos de Luiz Tonisi, CEO da Qualcomm para a região, que assumiu o posto no início da pandemia e está prestes a completar cinco anos na liderança.

“Comecei no momento em que não conhecia ninguém pessoalmente, só por vídeo. Ao mesmo tempo, tivemos que preparar as equipes para a chegada do 5G. Foi um período desafiador, mas que abriu muitas oportunidades com a digitalização acelerada”, disse Tonisi em entrevista à Bloomberg Línea.

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Os resultados da companhia, que encerrou o último ano fiscal com receita líquida de US$ 38,9 bilhões, por ora seguem concentrados nos dispositivos móveis: US$ 24,9 bilhões foram originados nessa frente de negócios.

Na jornada de diversificação da receita, o segmento automotivo, ainda pequeno, já cresce a taxas que remetem a uma startup: 55% em 2024, somando US$ 2,9 bilhões, contra US$ 1,9 bilhão no ano anterior.

“Hoje, o carro é um computador de quatro rodas. Ele tem que ter capacidade computacional, consumir pouco energia e contar com AI embarcada para tomar decisões em tempo real, sem depender da rede, o que pode comprometer a segurança”, afirmou Tonisi.

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Luiz Tonisi, CEO da Qualcomm Latam: IoT é uma das áreas que mais cresce para nós na América Latina e vai entrar no que chamamos também de Edge device

Se nos carros o Snapdragon já se tornou peça invisível de luxo, presente em modelos da Volvo aos da BYD, o próximo salto mira algo mais difuso: transformar qualquer objeto conectado em ponto de inteligência.

É nessa frente que entra o IoT (Internet of Things): trata-se da vertical que avança com mais força na América Latina e que Tonisi enxerga como motor de produtividade em setores tão distintos quanto energia, segurança, indústria, varejo e agronegócio. No último ano, a divisão encerrou globalmente com US$ 5,4 bilhões em receitas.

“IoT é uma das áreas que mais cresce para nós na América Latina e vai entrar no que chamamos também de Edge device. Ou seja, como eu transformo todos esses sensores e processadores espalhados no mundo de IoT em pequenas pontes de AI, pegando informação e tratando-a de forma local, trazendo mais inteligência”, explicou o CEO da Qualcomm para a América Latina.

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Entre o edge e a nuvem

O entusiasmo do executivo com o potencial de avançar em IoT parte da capacidade de processamento no chamado edge device, que pode permitir aumento da produtividade com redução de custos.

O edge device - ou edge AI - representa uma questão que Tonisi aborda com frequência em suas conversas e exposições públicas.

“Na Qualcomm, nós costumamos dizer que treinamento de LLM [Large Language Model] é na cloud, e inferência, no edge. E qual é a vantagem de fazer inferência no edge? O custo é muito menor por token, 70% ou 80 % menor. Isso vai ajudar a democratizar o edge pelas empresas”, disse o executivo.

Inferência representa o processo de usar um modelo já treinado para gerar respostas ou fazer previsões. Isso pode ser feito em dispositivos locais (celulares, laptops, IoT, carros conectados etc.), chamados de edge.

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A tese, hoje mais visível nos sensores, deve ganhar escala com as câmeras com visão computacional, nos próprios automóveis e também nos humanóides, cada dia mais midiáticos e que, em um futuro não tão distópico assim, estarão presentes no cotidiano de pessoas e empresas.

“Os humanoides vão ser um physical AI. Uma vez já treinado o modelo, ele gera toda a inferência dentro dele e, quem sabe no futuro, até poderá aprender também sem necessidade de estar conectado à cloud”, afirmou.

Enquanto esse momento não chega, outra vertical que se transformou em grande aposta dentro da Qualcomm para LatAm é a de PCs. Mais recente, a divisão entrou em um mercado concentrado em players como Intel e AMD.

A Qualcomm procura desafiar esse domínio com a força do Snapdragon, processador com o qual se tornou referência na linha de dispositivos móveis.

“Nós temos crescido bem nesse mercado, inclusive em outros países da América Latina”, disse Tonisi.

No momento, o principal movimento está na oferta de notebooks com IA.

No Brasil, as primeiras máquinas com IA serão fabricadas neste semestre, a partir de parcerias com empresas como Dell, Lenovo e Asus, com uso do Snapdragon X Elite, apresentado globalmente no ano passado.

Os aparelhos chegam com 40 tops, um nível apontado por especialistas como suficiente para rodar modelos grandes de IA (como LLMs compactados) diretamente no laptop.

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Segundo números da Qualcomm, a tecnologia permite que os notebooks tenham performance 55% superior a máquinas com outros processadores quando desconectados e ainda uma bateria que pode durar por dias.

“Nós sabíamos que no mercado já atuam duas empresas muito bem estabelecidas. Se não tivéssemos uma proposta de valor realmente diferenciada, a nossa chance de sucesso seria reduzida”, afirmou o executivo.

Segundo ele, a expansão e o potencial dessas divisões - e ainda de conectividade, como FWA (Acesso Fixo Sem Fio) - posicionam a operação regional em linha com os planos globais de diversificação de receita.

“Nós temos que manter - ou até mesmo expandir um pouco - o gatilho no mercado mobile, porque o AI mobile também vai ser importante e temos uma posição no segmento premium muito forte. E vamos buscar crescer a duplo dígito todo ano no restante das divisões de negócios”, afirmou Tonisi.

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Marcos Bonfim

Jornalista brasileiro especializado na cobertura de startups, inovação e tecnologia. Formado em jornalismo pela PUC-SP e com pós em Política e Relações Internacionais pela FESPSP, acumula passagens por veículos como Exame, UOL, Meio & Mensagem e Propmark