Por que o Nubank adotou uma semana de trabalho presencial a cada trimestre

Banco digital vai na contramão do movimento de retorno gradual ao escritório; a Head de Cultura, Liderança e Performance, Deborah Abi-Saber, explica as razões à Bloomberg Línea

Um dos espaços do Spark, nome do prédio que abriga uma das sedes do Nubank, na Vila Leopoldina, na zona oeste de São Paulo (Foto: Divulgação)
15 de Abril, 2024 | 05:03 AM

Bloomberg Línea — Quando concluiu que era o momento de adotar um modelo híbrido de trabalho, há cerca de dois anos, o Nubank decidiu organizar um evento chamado Future of Work Summit, para treinar todos os seus profissionais, incluindo as lideranças.

Seriam três dias de apresentações, discussões e capacitação, o que levou o cofundador e CEO global David Vélez a perguntar as razões. “David, é um formato que não sabemos trabalhar”, disse à época Deborah Abi-Saber, Head de Cultura, Liderança e Performance do Nubank.

No evento, os executivos explicaram para os colaboradores as razões para a adoção do modelo escolhido naquele momento de uma semana de trabalho presencial com suas equipes a cada dois meses, enquanto lideranças foram treinadas e capacitadas para saber como conduzir reuniões, como utilizar novos espaços desenhados a promover a colaboração e como utilizar o tempo de forma mais produtiva.

Passados dois anos, o modelo híbrido do Nubank (NU) destoa em um momento em que muitas das maiores empresas do país ampliam a volta ao escritório. Na verdade, até na contramão, a flexibilidade aumentou para os mais de 7.000 colaboradores e, desde meados de 2023, a regra passou a ser uma semana de presencial a cada três meses.

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A opção por esse modelo não se deu por acaso e aconteceu depois de conversa com os líderes de áreas, do estudo de benchmarks e de dados, segundo a executiva.

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“Queríamos um modelo que fizesse sentido para o Nubank e para o momento do business. Tínhamos três objetivos: um modelo que pudesse atrair e reter os melhores talentos; que fosse adicionar à nossa cultura; e que fosse melhor para a produtividade”, disse Deborah Abi-Saber em entrevista à Bloomberg Línea.

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A decisão pelo modelo se deu em cima também de insights do time de People Analytics, com dados colhidos desde que a pandemia levou todos os colaboradores para casa no início de 2020. Números de produtividade e de entrega e outros KPIs (indicadores-chave) eram regularmente analisados.

“Todos os dados de produtividade e outros como os de qualidade do atendimento a clientes melhoraram quando todo mundo foi para casa”, disse Deborah.

Métricas de produtividade, entregas e engajamento, por sua vez, dialogam com a evolução dos resultados do banco, que têm melhorado e crescido ao longo dos trimestres.

Quando adotou o modelo híbrido, o Nubank tinha um desafio de funcionalidade que se estendia para além das lideranças: o equivalente a 80% dos colaboradores nunca tinha trabalhado lá presencialmente, dado que eles haviam sido contratados durante os pouco mais de dois anos da pandemia.

Houve coleta de dados, portanto, também para entender o que faria mais sentido. “A única certeza que tínhamos era a de que iríamos aprender, porque era um momento novo, assim para outras empresas”, disse. A cada ida ao escritório, os colaboradores respondiam a pesquisas sobre o tema.

A conclusão: havia um consenso que pedia por mais flexibilidade porque as pessoas diziam que produziam mais de casa, enquanto a semana presencial a cada bimestre era importante para ampliar a colaboração entre os times e para estimular a inovação.

Os dados também mostraram aumento gradual em pontos como engajamento dos profissionais e qualidade das relações pessoais dentro dos times, segundo ela.

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O calendário da semana de ida ao escritório é anunciado anualmente, para que os funcionários tenham uma ideia e possam se programar, e confirmado de forma semestral, ou seja, com seis meses de antecedência. “Temos um compromisso com os nubankers de que qualquer mudança não será feita sem que haja um aviso com pelo menos dois meses de antecedência.”

O modelo não é engessado, segundo ela: cada líder de área pode aumentar a frequência se assim entender como o mais recomendado, em decisão alinhada com o RH.

“Temos alguns dados que já indicam que os produtos que são mais novos tendem a precisar mais dos times presencialmente, porque têm mais momentos de criação, de brainstorming... e esses times acabam mesmo trabalhando mais juntos, por decisão própria”, afirmou a head da área.

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É o caso do time à frente do Nucoin, a criptomoeda do Nubank que foi lançada há cerca de um ano, sob liderança de Fernando Czapski. “É um time que vai ao escritório em uma cadência de uma semana por mês e que entende que essa ida é importante para desenharem o produto, pivotarem quando necessário, discutirem problemas e também soluções”, disse a executiva.

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Por outro lado, times que existem há mais tempo, como os de engenharia, estão de forma 100% remota, porque o trabalho exige a criação de códigos, em que o presencial pouco acrescenta. A pedido deles, no entanto, há uma ida semanal ao escritório a cada seis meses.

A adoção de um modelo próprio para os times de engenharia, segundo Deborah, não se deu por acaso. “Assim como fazemos com os nossos clientes, buscamos segmentar os colaboradores. Um deles é o de engenharia. Outro, a de figuras parentais, para os quais pensamos em benefícios específicos e em como a volta do trabalho presencial poderia gerar impacto”, afirmou.

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Outro ponto fundamental para estimular o engajamento são os chamados rituais, segundo a head de Cultura, Liderança e Performance do Nubank.

Um deles é uma reunião quinzenal híbrida - de forma presencial e aberta para acompanhamento virtual - em que Vélez e Cristina Junqueira, cofundadora e que hoje lidera a estratégia de crescimento global, e outras lideranças atualizam o momento do banco para todos os colaboradores.

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Outro ritual é a premiação de produtos ou times que tenham sido exemplos de determinados valores da cultura do banco a cada trimestre.

Nova sede ‘fora da caixa’

A ida dos colaboradores ao escritório envolve as duas principais sedes do Nubank em São Paulo, a mais conhecida na rua Capote Valente, na esquina com a avenida Rebouças, em Pinheiros, que existe desde antes da pandemia, e a “nova” na Vila Leopoldina, em um empreendimento chamado Spark. O desenho prevê o trabalho presencial em cada uma das sedes ao menos uma vez por ano.

Antes da pandemia, em momento de hyper growth, em que contratava 200 pessoas por mês, o Nubank chegou a contar com seis escritórios espalhados pela capital paulista. Com as restrições à circulação, ficaram dois prédios de escritórios na Capote Valente, um de frente para o outro.

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Espaço no Spark, galpão reformado que abriga uma das sedes do Nubank no bairro da Vila Leopoldina, em São Paulo (Foto: Divulgação)dfd

Com o crescimento contínuo do quadro, o banco entendeu que logo precisaria de um novo espaço. “Sabíamos que não queríamos um escritório nos mesmos lugares em que todos ficam. Um dos pilares do Nubank é desafiar o status quo. Começamos a buscar algo novo”, disse.

Essa missão foi endereçada a um time liderado por Cristina Callamari, Head de Real Estate & Workplace Solutions do Nubank, que contou ainda com Lucas Pedro, no time de Workplace Solutions, que começou a conduzir pesquisas de diferentes áreas e prédios em São Paulo.

O local escolhido foi um antigo galpão industrial reformado próximo à Ceagesp e à marginal Pinheiros, em uma área revitalizada que abriga outros prédios semelhantes que já foram armazéns.

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A sede mais recente foi inaugurada no fim de 2022 e pode receber até 2.000 colaboradores, em um espaço de aproximadamente 10.000 metros quadrados.

Segundo Deborah, o Spark foi planejado com o objetivo de promover a colaboração, dado que foi concebido já na realidade do pós-pandemia - esse norte levou a reformas e adaptações no prédio da Rebouças, cuja construção aconteceu há mais tempo, antes da covid.

Isso significa menos paredes e mais espaços abertos que favorecem a conversa de times, em vez de andares só com baias. E um uso potencializado justamente com a capacitação feita no Future of Work Summit.

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“As pessoas me perguntam qual o melhor formato de trabalho ou se uma semana a cada três meses não é pouco... não tem um certo ou errado. Tem o modelo que está mais alinhado com a cultura e o business de cada empresa”, disse a head de Cultura, Liderança e Performance do Nubank.

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Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.