Bloomberg Línea — Os clubes da elite do futebol brasileiro (Série A) registraram um faturamento recorde de R$ 10,2 bilhões em 2024, uma alta de 10% em relação aos números de 2023.
As despesas avançaram em ritmo menor, de 6%, para R$ 7,8 bilhões. Mas as dívidas aumentaram em ritmo mais acelerado (15,7%), para R$ 13,8 bilhões.
Os dados são do estudo “Convocados 2025″, da Convocados Gestora de Ativos de Futebol em parceria com a OutField e a Galapagos Capital, conduzido por Cesar Grafietti.
Os números revelam a fragilidade da saúde financeira dos clubes que canalizam boa parte da riqueza gerada pelo esporte mais popular do país e os desafios crescentes para equilibrar o caixa, dado que as despesas financeiras decorrentes da dívida crescente deixam o resultado de muitos clubes no “vermelho”.
Pedro Oliveira, co-fundador da Outfield, disse que, por um lado, o setor está em um momento que classificou como transformação positiva, com aumento da receita, evolução das gestões, injeção de capital inorgânico dos investidores de SAF (Sociedade Anônima de Futebol) e maior apelo do futebol como produto.
“O principal ponto é que a gestão e a governança ainda não acompanham esse avanço como deveriam”, afirmou Oliveira.
“Falo de uma gestão que entenda que não pode gastar mais do que arrecada para ter sustentabilidade financeira. E de governança não só no nível dos clubes mas também de liga para que exista um fair play financeiro", completou.
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No lado das despesas, o principal componente para a alta anual foram os gastos com salários e contratações.
O salto foi de 37% na comparação anual e o valor total chegou a R$ 6,3 bilhões.
Os investimentos na contratação de jogadores mais do que dobraram na base anual e elevaram essa conta para R$ 3,4 bilhões em 2024.
Além disso, as dívidas com bancos também pesaram nas contas e atingiram a marca de R$ 3,8 bilhões, com 7% de expansão na base anual.
Clubes como Corinthians e Atlético Mineiro pagaram em juros o equivalente aos valores que Cruzeiro e o Fortaleza fizeram em receita, respectivamente.
“2024 foi o primeiro ano em que os clubes [da Série A] gastaram mais de R$ 1 bilhão [R$ 1,156 bilhão no valor exato] no acumulado de despesa financeira. É muito importante começar a reduzir o endividamento para que os times possam baixar as despesas financeiras”, disse Oliveira.
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Como proporção das totais, as despesas financeiras saltaram de 5% em 2020 para 11% em 2024, o que mostra uma dinâmica preocupante.
Pendências com impostos e acordos somaram R$ 4,96 bilhões, uma alta de 6%, o que completa o montante de dívida.
O aumento das dívidas fez com que a alavancagem financeira saísse do equivalente a 158% das receitas para 186% no intervalo de 12 meses.
Na relação entre dívida líquida e receitas totais, o Atlético Mineiro era o clube mais alavancado (3,8x), seguido pelo rival Cruzeiro (3,1x) e por Botafogo (2,2x), Corinthians (2,1x), Vasco (2,1x), Internacional (1,9x) e São Paulo (1,5x).
Segundo o relatório, entre os times com situações mais complexas, o Cruzeiro foi o único que reduziu a alavancagem (de 3,3x para 3,1x) no ano passado graças a um aumento considerado mais sustentável de receitas.
Os demais clubes tiveram oscilações na alavancagem, sob influência de receitas variáveis como premiações derivadas ou não de presença em finais.
Vendas de atletas: peso extra
Fazer frente ao cenário aparece no levantamento como um dos desafios para os clubes, que veem as receitas recorrentes crescerem em ritmo mais lento.
No ano inteiro, o avanço foi de apenas 4%, em dado que considera valores de direitos de transmissão, patrocínio e do chamado matchday, que inclui os recursos de bilheteria de jogos e os programas de sócio-torcedor.
No fim de 2024, as receitas recorrentes chegaram a R$ 7,9 bilhões.
Para os R$ 10,2 bilhões de receita total, os clubes contaram com a venda de jogadores, recursos não recorrentes que somaram R$ 2,3 bilhões - nesse quesito, uma alta de 31% contra um ano antes.
Essas receitas extraordinárias equivalentes a 22,6% do total ficaram concentradas em clubes como Palmeiras, Fluminense, Corinthians e Athletico Paranaense, donos de mais da metade das cifras arrecadadas somadas.
Em outras palavras, isso significa que alguns clubes usam a transferência de atletas para buscar um fôlego extra em suas contas.
Em outros mercados do futebol, os recursos com a compra e a venda de jogadores supera não mais do que 10% das receitas totais.
Avanço das bets
O relatório trouxe dados sobre a expansão das casas de apostas na elite do futebol brasileiras.
Os patrocínios representaram 7% das receitas recorrentes, com R$ 580 milhões. O valor estimado para este ano de 2025 é de R$ 988 milhões.
Além do impacto em si sobre a receita, o mercado do futebol entende a expansão das bets como uma forma de atrair fatias mais volumosas do chamado “bolo” do investimento publicitário.
De acordo com Oliveira, em países como Inglaterra, Espanha e Alemanha, o esporte detém uma participação entre 5% e 12% de todos os recursos empenhados em publicidade. No Brasil, o percentual fica em 2,5%.
“É muito importante que os clubes tenham consciência do poder deles como mídia e trabalhem essa força diante de casas de apostas e de outros anunciantes de forma ampla para que aumentem esse share de participação no total do investimento publicitário no Brasil”, afirmou o executivo.
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