Bradesco usa estratégia jurídica do caso Americanas para cobrar executivos da Ambipar

Banco, que é um dos principais credores da companhia de gestão de resíduos, tem buscado alcançar o patrimônio pessoal de executivos; empresas não comentam

Ambipar
Por Matheus Piovesana - Giovanna Bellotti Azevedo - Rachel Gamarski
24 de Outubro, 2025 | 06:24 PM

Bloomberg — Um dos principais bancos credores da Ambipar recorreu a uma tática jurídica semelhante à que utilizou quando a varejista Americanas entrou em colapso: tentar alcançar o patrimônio pessoal de executivos para recuperar o que lhe é devido.

O banco Bradesco (BBDC4) — que detém R$ 390 milhões da dívida da empresa de gestão de resíduos — tenta impedir que o diretor de integração e finanças da Ambipar, Thiago da Costa Silva, venda bens, segundo ação protocolada na Justiça de São Paulo na terça-feira (21).

PUBLICIDADE

O processo alega que Costa Silva e outros executivos podem ser responsabilizados pelos problemas financeiros da companhia.

O Bradesco afirmou que apresentará ações semelhantes contra outros diretores da Ambipar, incluindo o fundador e presidente-executivo da empresa, Tércio Borlenghi Junior. Pessoas próximas ao assunto que falaram à Bloomberg News disseram que, no mês passado, ele tentava vender seu jato particular.

Leia também: No mercado de empresas brasileiras em crise, este banco global ganha protagonismo

PUBLICIDADE

A iniciativa é uma forma de o banco abrir caminho para uma ação judicial que busque responsabilizar pessoalmente a administração da Ambipar (AMBP3) por aquilo que descreve como uma possível “fraude ostensiva” nas demonstrações financeiras da companhia e uma “manobra contábil” destinada a criar “liquidez artificial”, segundo o documento.

O Bradesco também afirmou que os principais executivos da Ambipar pareciam estar dilapidando o caixa da empresa há algum tempo, antes do pedido de recuperação judicial.

Bradesco, Ambipar e Borlenghi não comentaram o assunto.

PUBLICIDADE

O banco, um dos maiores credores da Ambipar entre as instituições financeiras brasileiras, apresentou uma ação semelhante em 2023, quando a Americanas pediu recuperação judicial após a descoberta de um rombo contábil de R$ 25 bilhões.

Naquela ocasião, o Bradesco tentou impedir que os principais acionistas da Americanas — os bilionários brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira — vendessem seus bens, alegando que poderiam ser responsabilizados por compensar os credores. O caso terminou com um acordo entre a empresa e seus credores ainda naquele ano.

Agora, o Bradesco afirma que o caso da Ambipar pode ser classificado como fraude. O processo se baseia no fato de que o caixa da companhia “desapareceu”, com um fundo de recebíveis supostamente usado para inflar artificialmente as finanças da empresa e, ao mesmo tempo, esvaziar seus recursos. O banco já havia perdido, no início deste mês, uma ação com alegações semelhantes contra Borlenghi.

PUBLICIDADE

O Bradesco também vendeu parte das ações da Ambipar pertencentes a Borlenghi, dadas em garantia de um empréstimo — medida que o executivo classificou como ilegal.

Caminho até a recuperação judicial

A Ambipar estreou no mercado internacional de dívida com a emissão de um green bond em janeiro de 2024. A operação levantou US$ 750 milhões, superando a meta inicial de US$ 500 milhões. A empresa chegou a ser destaque da revista LatinFinance como “Emissora de Dívida do Ano”.

Mas, para uma companhia que promovia suas credenciais em ESG, foram justamente os problemas de governança que determinaram sua queda, após uma série de investigações e saídas de executivos. Em questão de semanas, a Ambipar foi de uma empresa que buscava tranquilizar investidores à recuperação judicial, depois que alguns credores declararam inadimplência da companhia em meio à crise de governança.

Os títulos, que vinham sendo negociados próximos ao valor de face até o início de agosto, agora giram em torno de US$ 0,22 por dólar, depois de atingirem mínimas de cerca de US$ 0,12 nos dias que antecederam o pedido de falência.

A Ambipar informou ter R$ 4,7 bilhões em caixa em meados de 2025, mas logo buscou proteção contra credores por causa de uma dívida de apenas R$ 60 milhões, segundo o Bradesco na ação judicial.

A empresa acabou pedindo recuperação judicial no Rio de Janeiro nesta semana, enquanto sua subsidiária Ambipar Emergency Response entrou com pedido de proteção sob o Capítulo 11 da lei de falências dos Estados Unidos, no Texas.

A companhia afirmou que a medida era essencial para reestruturar dívidas e preservar empregos, citando irregularidades em operações de swap realizadas por sua área financeira e a renúncia repentina do ex-diretor financeiro, o que abalou a confiança de investidores e levou credores a exigir o pagamento antecipado de dívidas.

O pedido se soma a uma série de abalos recentes nos mercados de crédito, do Brasil aos Estados Unidos, servindo como um alerta contundente para investidores em dívida corporativa brasileira. A Fitch Ratings comparou a sequência de eventos ao caso Americanas de 2023, embora o governo não veja risco sistêmico no momento, segundo informações da Bloomberg News.

Nas últimas semanas, os títulos da Braskem caíram para níveis de estresse após a empresa contratar assessores para revisar sua estrutura de capital, enquanto os problemas envolvendo o Banco Master ameaçam se espalhar para empresas e fundos de pensão expostos a seus instrumentos de dívida.

-- Com a colaboração de Cristiane Lucchesi.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Ambipar pede recuperação judicial no Rio de Janeiro e nos EUA com R$ 11 bi em dívidas

Da Ambipar à Braskem, crises corporativas abalam investidores em mercados emergentes

Em meio à crise, CEO da Ambipar perde fatia na empresa após venda de ações de garantia