Emergentes podem ser os novos desenvolvidos, diz head do Morgan Stanley para área

Em entrevista à Bloomberg Línea, Marshall Stocker, co-head de mercados emergentes do banco de Wall Street, diz que tais países estão mais atrativos após políticas monetárias ortodoxas

Banco de Wall Street vê perspectivas promissoras para ativos como dívida e ações de emergentes
28 de Novembro, 2023 | 05:05 AM

Bloomberg Línea — Países emergentes têm se destacado no portfólio de investidores ao redor do mundo. Depois de um período de juros mais altos que garantiram retornos na renda fixa, uma mudança de ciclo e a busca por melhores retornos tendem a favorecer ativos de emergentes, em especial papéis de dívida e ações, uma vez que essas economias estiveram à frente do mundo desenvolvido no combate à inflação. Essa é a avaliação de Marshall Stocker, co-head de Mercados Emergentes (EM) do Morgan Stanley (MS).

“Os investidores estão começando a procurar por valuations atrativos – e esses parecem estar nos emergentes”, disse Stocker em entrevista à Bloomberg Línea.

Com uma carreira de 24 anos, Stocker é responsável por co-liderar os times de gestão e alocação em mercados emergentes (EM, na sigla em inglês) de Boston, Washington D.C., Londres e Singapura.

Entrou para um dos grandes bancos de Wall Street em 2021, com a aquisição da Eaton Vance, uma das empresas mais tradicionais de investimento dos Estados Unidos, já com uma experiência de mais de uma década de gestão de ativos de emergentes, superando os pares em diferentes ocasiões.

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Segundo ele, a estratégia de mercados emergentes do Morgan Stanley tem registrado o melhor ano em termos de entrada de recursos desde a crise financeira de 2008, com os investidores aproveitando as oportunidades, de forma a se preparar para a maior busca por retorno.

O índice MSCI de Ações de Mercados Emergentes acumulou ganhos de 10,8% nos 12 meses até o fim de outubro. O indicador de moedas avança mais de 2% apenas em novembro.

De acordo com Marshall, o horizonte segue positivo para a estratégia: “Temos uma década promissora daqui em diante, em que muitos dos problemas à frente são de mercados desenvolvidos. Os EM já enfrentaram tudo isso e, por causa de políticas monetárias ortodoxas, continuarão a melhorar suas instituições econômicas e a desviar de muitos problemas que estão sendo vistos hoje nos países desenvolvidos.”

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Confira os principais destaques da entrevista com Marshall Stocker, do Morgan Stanley, à Bloomberg Línea, editada para fins de maior clareza:

Como os emergentes tendem a se beneficiar de um início mais rápido de flexibilização monetária em relação aos países desenvolvidos?

Talvez os países desenvolvidos sejam os novos emergentes, e os emergentes, os novos desenvolvidos. O que eu quero dizer é que, alguns meses atrás, quando bancos centrais de países desenvolvidos, incluindo o Federal Reserve, nos EUA, tentaram entender se a inflação era transitória ou se havia uma inflação de oferta vs. demanda, os bancos centrais de EM estavam trabalhando. Eles subiram os juros – e não foi pouco.

E, com isso, as respostas de política monetária em emergentes vieram primeiro do que nos desenvolvidos. Normalmente é o oposto. E agora estamos vendo desinflação nos EM e cortes de juros no Brasil, no Chile e no Vietnã. Parece que os EM estão liderando esse ciclo de inflação, porque foram eles que reagiram de uma forma ortodoxa e urgente à alta dos preços.

Com os juros mais altos, investidores migraram para ativos de renda fixa, deixando de lado ações, fundos e outras classes de ativos consideradas mais arrojadas. Os emergentes, liderando o ciclo de flexibilização monetária, deverão ver primeiro a reversão dessa tendência?

Com certeza. Os investidores reagiram a esse ciclo de desinflação como foram pré-programados anteriormente: vendendo o que parecia mais arriscado, o que poderia quebrar se o custo do capital aumentasse, e dando preferência às taxas de 5% que conseguem nos EUA para fundos de curto prazo. Esse tem sido o curso natural da história.

Mas o que aconteceu desta vez foi que os investidores começaram a perceber que os EM não estão quebrando. Por causa da resposta rápida que esses países deram à inflação, nós registramos no Morgan Stanley nossa melhor entrada de recursos na estratégia desde a crise financeira global.

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Tem havido uma mudança de mindset e, por isso, os preços dos ativos estão tão atrativos, no melhor nível desde a crise financeira de 2008, seja olhando o nível da taxa de juros real, os spreads de crédito ou o diferencial no múltiplo P/L [preço sobre lucro] das ações.

O que essa mudança de mindset sugere?

Isso sugere duas coisas. A primeira é que os investidores estão começando a procurar por valuations atrativos – que parecem estar em EM. Enquanto os mercados desenvolvidos estão lidando com o fim de uma taxa de juros igual a zero, crise imobiliária e colapso de bancos como o SVB, nos emergentes houve uma resposta rápida à inflação.

Por isso, quem não está em emergentes agora começa a buscar os melhores gestores, a abrir a carteira e a fazer alocação modesta para quando chegar a hora de maior busca por retorno, de colocar o dinheiro para trabalhar.

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Também temos visto a entrada de um grupo que já investe em EM, mas que está frustrado com a gestão de seus portfólios neste ciclo atual, então estão fazendo upgrade de seus gestores, buscando melhores retornos.

Nós tivemos o melhor ano desde a grande crise financeira no Morgan com relação à entrada de recursos em dívida e ações de emergentes – e é porque os investidores estão se preparando para esse ciclo.

Qual a “foto” hoje do portfólio de mercados emergentes do Morgan Stanley?

Ao falarmos sobre classes de ativos e fatores de risco, o que mais gostamos é da exposição a juros – isso porque os emergentes lideraram o combate à inflação. Por isso, achamos que vão começar a cortar antes também, como já estamos vendo, e isso deve ser benéfico à exposição a títulos locais de renda fixa de longo prazo.

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Quando olhamos para 120 países emergentes, o bottom-up de juros é o mais atrativo, seguido por crédito e ações. Em crédito, a oportunidade parece estar mais em dívida distressed de países que reconhecem seus problemas e trabalham para melhorar a liberdade econômica, para reduzir o tamanho do governo etc., o que faz com que a dívida fique atrativa.

E na parte de ações, temos uma série de países que também estão melhorando seus sistemas econômicos e a liberdade financeira, o que faz com que os ativos fiquem mais valiosos.

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Como o Brasil está situado no portfólio de emergentes?

No Brasil, temos uma exposição moderada a juros locais, mais forte em crédito privado, em que vemos mais valor. Temos visto uma resposta ortodoxa do banco central à inflação, levando à um dos maiores juros reais do mundo – talvez altos demais.

E, com certeza, isso encoraja que, com a inflação ficando sob controle, possamos ver um pivô com relação ao crescimento no Brasil. Isso tem sido animador para nós e também significa que os brasileiros devem começar a pensar em formas de obter retorno assim que a inflação ficar sob controle e as políticas locais continuarem a impulsionar o corte de juros.

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Como vê as ações brasileiras nesse cenário?

De forma geral, as ações de EM estão muito baratas, porém há alguns outliers nos dois lados. Quando falamos de índices que não estão caros, temos a Grécia, com um múltiplo de 5,5 vezes o lucro, Paquistão com 3,5 vezes o lucro, e Colômbia, com 4,5 vezes. Eu não via valuations assim há muito tempo; normalmente são o dobro desse patamar.

Se olharmos para o Brasil, as ações estão sendo negociadas a múltiplos de 7 vezes o lucro, ante um histórico de valuation no Brasil de 12 vezes o lucro. Mesmo se o dividend yield der algo em torno de 6%, é um nível atrativo.

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Mas há um motivo pelo qual os valuations estão baixos: o custo de capital subiu. Essa pressão sobre os preços, contudo, deve recuar, porque os países têm conseguido deixar a inflação sob controle. E os investidores, de forma geral, estão começando a perceber isso e ver como uma oportunidade para entrar em ativos de EM.

Uma desaceleração da economia chinesa tem pesado sobre o setor de commodities, que é grande parte da bolsa brasileira. Como esse contexto pode mudar o cenário para as commodities?

A China está tentando transitar de uma economia muito movida pelo setor imobiliário, o que deve levar à uma rotação de commodities. Housing, por exemplo, usa outros tipos de commodities do que aquelas para veículos elétricos.

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Então não é mais se todo o setor de commodities deve subir ou cair, mas quais ganharão mais destaque à medida que a China mude seu foco de crescimento.

Sede do Morgan Stanley em Nova York, nos EUAdfd

A segunda coisa é que o cenário de atividade econômica na China é certamente mais baixo do que já foi um dia – porque o país está passando por esse processo natural de resolver a má alocação de capital – e, por isso, a demanda por commodities deve ser menor.

O que nos anima nos mercados emergentes não são mais as commodities – por meio de um crescimento da China –, mas aqueles países que estão reformulando suas economias, implementando melhorias e simplificando o ambiente regulatório. Felizmente, enquanto esperamos pela China, há uma série de outras oportunidades em EM.

Na renda variável, o Morgan Stanley tem setores preferidos?

Não temos setores preferidos e o motivo é porque 80% do alfa gerado no investimento em ações de EM é explicado pelo país em que você está investido. Os outros 20% são todo o resto: quais setores, valor de mercado, estilo [crescimento vs. valor].

Um dos exemplos disso é a pessoa que escolheu a melhor ação, no melhor setor na Rússia; tudo no país foi a zero quando a Rússia invadiu a Ucrânia e recebeu uma série de sanções globais. Por isso, focamos em escolher os melhores países para estarmos posicionados, caso de Grécia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Vietnã.

Quais os principais desafios e oportunidades nos mercados emergentes hoje?

O principal desafio que enfrento hoje é a percepção de qual papel os EM desempenham em um portfólio. Uma avaliação errada é a de que os emergentes estão crescendo mais rápido, têm melhores questões demográficas e, por isso, devem fazer parte das carteiras de investimento. Nada disso pode estar mais longe da verdade.

Taxa de crescimento econômico e questões demográficas não estão relacionadas com o resultado dos investimentos. Isso tem sido demonstrado em estudos acadêmicos. Parece certo, mas não é. O que importa em mercados emergentes é que eles são baratos por um motivo: eles têm instituições econômicas ruins, um ambiente regulatório fraco e muita intervenção no setor privado.

Mas o que é muito legal desde a queda do muro de Berlim é que os EM sabem quais sistemas econômicos são melhores e, por isso, têm adotado melhor governança. Quando esses países adotam melhores práticas, isso faz com que os ativos – sejam eles dívida ou ações – fiquem mais valiosos. Esse processo de tornar um ativo mais valioso ao melhorar suas instituições econômicas é único dos mercados emergentes.

Temos uma década promissora daqui em diante, em que muitos dos problemas no horizonte são de mercados desenvolvidos. Os EM já enfrentaram tudo isso e, por causa de políticas monetárias ortodoxas, continuarão melhorando suas instituições econômicas e desviando de muitos problemas que estão sendo vistos hoje nos desenvolvidos.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.