CEOs argentinos tentam olhar além de eleições e incertezas sob Milei em evento anual

Em conferência em Mar del Plata, que reuniu mais 1.000 líderes empresariais, executivos tentam se concentrar nas reformas necessárias para crescer no longo prazo, enquanto enfrentam a volatilidade do país

Attendees at the annual Coloquio de Idea meeting in Mar del Plata, Argentina.Source: IDEA
Por Jonathan Gilbert
18 de Outubro, 2025 | 10:35 AM

Bloomberg — Uma multidão de líderes empresariais argentinos que se reuniu nesta semana em um resort à beira-mar tentou deixar de lado a turbulência política e de mercado que domina o país para refletir sobre o futuro. O esforço, porém, mostrou-se quase impossível de manter.

“O que aconteceu na última semana é ruído de curto prazo; nosso foco não deveria estar aí”, disse Fabian Kon, presidente do grupo financeiro Galicia, um dos organizadores do encontro anual. “Ainda há muito a fazer para construir a Argentina que queremos ver. Mas, quando conversamos nos bastidores, é impossível escapar da extrema volatilidade.”

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A conferência, realizada na cidade de Mar del Plata e que reuniu cerca de 1.000 executivos, foi em grande parte uma maratona de discussões teóricas sobre como tornar as empresas argentinas mais competitivas no longo prazo.

A metáfora do futebol — “A Argentina entra em campo” — foi o tema do evento, aberto pelo ex-jogador da seleção Javier Zanetti, no hotel Sheraton da cidade. Ele falou sobre o que é preciso para vencer e sobre sua nova vida como dirigente no Inter de Milão.

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Fora do palco, no entanto, era impossível ignorar o “elefante na sala”: a eleição legislativa nacional, marcada para 26 de outubro, considerada crucial para o presidente Javier Milei — e para as próprias empresas —, já que suas reformas libertárias são vistas como um trampolim para o crescimento.

Nos corredores, as conversas variavam entre o pleito e a volatilidade dos mercados financeiros que, mesmo para os padrões argentinos, tem sido drástica desde a derrota esmagadora de Milei em uma votação local no mês passado.

A promessa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de injetar bilhões de dólares em ajuda ao governo argentino só aumentou o comportamento errático do mercado.

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“Dá para sentir que estamos a dez dias da eleição; há um verdadeiro clima de suspense”, disse Ignacio Celorrio, vice-presidente da Lithium Argentina. “Mas não devemos temer o momento ou as circunstâncias de uma eleição. A Argentina tem uma grande oportunidade de desenvolver seu potencial quando há consenso para priorizar investimentos de longo prazo.”

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A principal iniciativa de Milei, a chamada lei “RIGI”, busca exatamente isso — um conjunto especial de regras tributárias, cambiais e aduaneiras, com garantias de estabilidade por 30 anos, para proteger o investimento da volatilidade política e econômica. As indústrias de lítio e mineração estão entre as que mais devem se beneficiar.

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Para Roberto Murchison, presidente do grupo portuário Murchison, explorar os vastos recursos minerais do país representa também uma chance de desenvolver a infraestrutura logística ao longo da hidrovia do rio Paraná.

“É preciso colocar os óculos de longo alcance nos negócios e não prestar tanta atenção aos altos e baixos do momento”, afirmou Murchison. Ele acrescentou que o histórico recente das eleições argentinas mostra uma tendência clara de voto a favor de uma economia mais aberta — o que beneficia empresas de todos os setores.

Mas alguns argentinos parecem estar cansando da transição dolorosa de Milei rumo a mercados mais livres. Sua derrota na província de Buenos Aires, onde vive cerca de um terço da população, gerou tanto pânico que o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, tem tentado intervir para ajudar.

Enquanto os executivos se dirigiam a quadras de padel e vinícolas para uma pausa, a poucos quarteirões do Sheraton, no calçadão de Mar del Plata, havia sinais claros das dificuldades do dia a dia.

“Trabalho nestas praias de ponta a ponta, e está difícil”, disse Lorena Buono, dona de uma barraca que vende vestidos. Ela se lembrava de tempos melhores, quando, sob o governo de esquerda anterior, havia subsídios ao turismo. “Outubro costuma ser um bom mês, mas não há ninguém por aqui.”

Marta González, professora de educação física, lamentou a falta de vínculo entre o evento e a cidade que o recebe. “É algo meio abstrato”, afirmou. “Parece um grupo de empresários decidindo como conduzir o país, enquanto as pessoas comuns não têm voz.”

Mariano Wechsler, presidente da Teamcubation, empresa que treina programadores, reconheceu “um tipo de fricção” na situação atual. “O problema é que esse período de transição dói”, disse. “As pessoas têm necessidades imediatas, enquanto nós conseguimos pensar e agir no longo prazo.”

Levando tudo isso em conta, sempre é o momento certo para defender os interesses do setor privado, afirmou Santiago Mignone, presidente do Idea — grupo empresarial responsável pela conferência — e sócio sênior da PwC Argentina. “Vai haver muita volatilidade no caminho, mas nossa agenda não muda.”

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