Queijo artesanal do interior de SP ganha força com projeto de pequenos produtores

Caminho do Queijo Artesanal Paulista reúne 16 queijarias com proposta ancorada em uma produção de pequeno porte e impulsionada pelo tripé turismo, profissionalização e organização coletiva, com diversificação de receitas

Pequenos produtores se juntam para impulsionar a economia do queijo artesanal em SP
Por Daniel Buarque
18 de Dezembro, 2025 | 09:41 AM

Bloomberg Línea — Quando pequenos produtores de laticínios do interior de São Paulo se juntaram em 2017 para criar um grupo para fomentar o queijo feito ali de forma artesanal, a ambição transcendia a ideia de lançar um simples mapa turístico.

O objetivo era formar uma estrutura econômica que permitisse ao queijo artesanal do estado disputar espaço em um mercado dominado por produtos de outras regiões mais tradicionais e por industriais de prateleira de supermercado.

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Oito anos depois, o Caminho do Queijo Artesanal Paulista reúne 16 queijarias, mais de uma centena de variedades e começa a desenhar uma nova cadeia de valor no interior paulista.

A proposta do grupo está ancorada em uma produção de qualidade e impulsionada pelo turismo, pela profissionalização e por uma organização coletiva.

“Hoje nós somos uma associação que tem esse intuito de fortalecer o queijo paulista. O turismo rural é gerador de renda, segura a família no campo e motiva essa produção”, disse Diego Trevizan proprietário da Jeito de Mato, uma das queijarias participantes, em entrevista à Bloomberg Línea.

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Dentro do projeto, a forma de produzir é restrita, com foco em pequena escala, processos manuais e uso de leite da própria fazenda ou do entorno.

Por trás dessa narrativa de origem há uma agenda pragmática, que busca atrair consumidores, pressionar o poder público por segurança jurídica e viabilizar o negócio de quem decidiu viver de queijo.

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É o caso de Trevizan na Jeito de Mato, em Fernandópolis, a cerca de 550 quilômetros da capital. Sua queijaria trabalha com rebanho próprio de cerca de 50 cabeças e processa perto de 300 litros de leite por dia em um portfólio de 12 produtos, que atende cerca de 70 pontos de venda no país.

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A viabilidade econômica, entretanto, vem das visitas que recebe de turistas, que representam entre 30% e 50% do faturamento, com um fluxo médio de 60 a 70 pessoas por sábado.

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O ticket médio só na loja gira em torno de R$ 300 a R$ 350, sem contar o gasto no bar, que fica na faixa de R$ 200 a R$ 250 reais por mesa.

“O turismo traz um público para quem o queijo é prioridade, pessoas que estão dispostas a conhecer melhor e que pagam um pouco mais, o que ajuda a viabilizar o negócio”, disse.

Em São Paulo, a trajetória da Qjo Martina mostra outro caminho para o mesmo objetivo dentro do grupo.

Instalado à beira da Represa de Guarapiranga, na capital, o negócio nasceu de uma decisão pessoal da fundadora, Martina Sgarbi, que trocou o cargo de diretora financeira de uma grande rede varejista pela produção de queijos artesanais.

“Entrei nisso por amor, por propósito, mas meu objetivo é ter algum retorno financeiro também e que o queijo me sustente, lógico”, afirmou à Bloomberg Línea.

Hoje a Qjo Martina produz cerca de 250 quilos de queijo por mês em uma estrutura de 30 metros quadrados, com uma equipe de quatro pessoas, e compra o leite de dois produtores da região de Parelheiros.

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Martina contou que o negócio ainda está em fase de amortização dos investimentos na queijaria, mas já se sustenta.

A principal fonte de renda não vem das peças vendidas a empórios especializados: ela passou a oferecer cursos, consultorias financeiras para outras queijarias, tábuas de queijo sob encomenda e experiências gastronômicas no sítio.

Dentro do Caminho, a produtora também atua como tesoureira da associação e ajuda a organizar temas que vão além da produção, como tributação e gestão.

Na outra ponta do espectro em tamanho está a Fazenda Atalaia, em Amparo, que ajudou a tornar o queijo tulha um símbolo da queijaria paulista.

A fazenda histórica estruturou o negócio em cinco frentes, que incluem agricultura, pecuária, industrialização do leite, hospitalidade e manutenção do patrimônio.

A unidade de laticínios produz em média 700 quilos de queijo por dia em dez dias de fabricação por quinzena, algo em torno de 15 toneladas por mês, com uma equipe de 40 pessoas.

Nos últimos anos, a Atalaia passou a tratar o turismo e a gastronomia como um segundo eixo de receita, com peso semelhante ao da venda de queijos para fora da propriedade.

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A fazenda recebe entre 500 e 600 pessoas por dia em fins de semana de alta temporada, com um restaurante de 160 lugares que gira cerca de duas vezes por serviço e ticket médio de R$ 300.

“A parte de experiência pesa tanto quanto a venda do nosso produto fora da fazenda”, afirmou a gerente de produção, Meiri Cardoso.

Mesmo assim, internamente o queijo ainda é o centro da equação financeira. Cardoso explicou que a queijaria banca outros projetos da fazenda, como a retomada do plantio de café e a formação de rebanhos de cabras e ovelhas.

“O queijo é totalmente sustentável, e nós entendemos que ele hoje é o grande financiador das outras operações da fazenda”, disse.

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Daniel Buarque

Daniel Buarque

Editor-assistente