Bloomberg — Belém, a porta de entrada para a Amazônia, tem andado ansiosa.
A poucos dias da COP30, a maior cúpula do clima do mundo, novos espaços são inaugurados quase diariamente: ruas estão sendo alargadas, e parques, centros culturais, restaurantes e bares surgem enquanto trabalhadores correm para preparar a cidade para receber mais de 50.000 visitantes esperados para o evento.
Mas muitos belenenses não parecem sentir a mesma animação.
A capital paraense, de mais de 1,3 milhão de habitantes, tem passado por transformações profundas nos últimos anos, impulsionadas por cerca de R$ 4,5 bilhões em investimentos para revitalizar uma das grandes cidades mais antigas — e pobres — do Brasil.
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Mas um êxodo de moradores em busca de emprego e melhor qualidade de vida também fez de Belém uma das cidades brasileiras com as maiores quedas populacionais.
Belém ocupa o terceiro lugar entre as 20 cidades mais populosas do país que mais perderam moradores entre 2010 e 2022, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Muitos têm se mudado para municípios da região metropolitana, onde as casas são mais baratas e o custo de vida é menor.
Outros vão muito mais longe — para o estado de Santa Catarina, no sul do país, a quase 3.000 quilômetros de distância — atraídos pela promessa de empregos mais estáveis e melhores serviços públicos.
“Todo mundo na região metropolitana de Belém tem um parente em Santa Catarina”, disse a socióloga Andrea Bittencourt Pires Chaves, da Universidade Federal do Pará. “É principalmente uma migração em busca de emprego formal.”
A decisão do governo brasileiro de sediar a COP30 em Belém destaca o papel histórico da cidade como porta de entrada para a floresta amazônica — vital na luta global contra as mudanças climáticas — e também chama atenção para os desafios enfrentados pelos milhões de habitantes da região.
Em muitos aspectos, Belém representa a região Norte urbana: uma região rica em recursos, mas carente de oportunidades.
Dependente da mineração, da agricultura e da energia, sua economia oferece poucos empregos formais, deixando mais da metade da população do Pará na informalidade e muitos jovens sem perspectivas.
Belém tem a maior proporção de favelas entre as capitais brasileiras, com cerca de 57% dos moradores vivendo em áreas precárias, segundo o IBGE.
Algumas dessas moradias são palafitas construídas sobre as águas de rios no centro da cidade, que inundam de tempos em tempos.
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Outras são conjuntos de casas de madeira espalhadas pelas áreas baixas da periferia, a maioria sem acesso à rede pública de água — apenas 19% da cidade está ligada ao sistema de esgoto.
Ana Luiza de Queiroz de Almeida, nutricionista de 24 anos, mudou-se para Santa Catarina em 2020 para cursar a faculdade, depois de perceber que não conseguiria a qualidade de ensino que desejava em Belém. Ela nunca mais voltou, exceto para visitar a família.
“Percebi que lá embaixo eu realmente poderia crescer profissionalmente”, disse. “Também tinha a ver com segurança. No Sul, sinto que tenho muito mais liberdade.”
A escolha de Belém para sediar a COP30 também ressalta o esforço de impulsionar o desenvolvimento econômico em uma região que ainda fica muito atrás das partes mais prósperas do Brasil.
Os preparativos para receber o evento global trouxeram vários projetos de infraestrutura à cidade — o tipo de investimento que Belém não via há anos.
Autoridades afirmam esperar que os holofotes permaneçam acesos após a conferência, alimentando o interesse e o crescimento do turismo.
“Há uma esperança, uma expectativa muito grande de que a COP mude o nosso destino”, disse a cantora Fafá de Belém sobre a sua cidade natal. “Está se fazendo um conserto de rumo, de a gente se sentir cidadã do mundo, que não pode parar depois da COP.”
Embora os desafios socioeconômicos continuem a marcar a cidade, a energia de Belém é inconfundível.
Além das barracas do Ver-o-Peso — o maior mercado a céu aberto da Amazônia —, um número crescente de restaurantes sofisticados exibe sua culinária única, que mistura ingredientes do mar e da floresta, como o tacacá, um caldo quente que combina mandioca, camarão e jambu, famoso pela sensação de dormência e formigamento na boca.
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Ritmos nascidos na região, como a lambada, espalharam-se pelo Brasil e pelo mundo.
A impressionante arquitetura da cidade é exibida em marcos clássicos como o Theatro da Paz, inspirado no Teatro alla Scala, de Milão, símbolo da opulência da época em que a Amazônia detinha o monopólio mundial da borracha.
Embora grande parte da floresta ao redor de Belém tenha desaparecido, a cidade ainda preserva fragmentos que evocam seu esplendor original.
Na Ilha do Combu, em frente da cidade, visitantes podem caminhar por uma floresta alagada e admirar uma imponente sumaúma — conhecida como “mãe da floresta”, uma das árvores mais majestosas da região — enquanto o Parque do Utinga oferece trilhas tranquilas sob a sombra de árvores nativas.
Apesar de seus muitos atrativos, o turismo em Belém ainda é pouco desenvolvido.
Pouco mais de 33.000 estrangeiros visitaram o Pará em 2024, em comparação com mais de 1,5 milhão no estado do Rio de Janeiro, segundo dados oficiais.
A Embratur, que não divulga estatísticas por cidade, afirma que ainda não há estudos sobre o impacto potencial da COP30 no setor turístico de Belém.
No início de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou Belém para inaugurar os novos projetos.
“Se melhorarmos a qualidade de vida do povo de Belém, significa aumentar a possibilidade de vir mais turistas para o estado do Pará e para a cidade de Belém”, disse ele em uma cerimônia.
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Uma das mudanças mais visíveis trazidas pelas obras da COP30 pode ser vista ao longo da orla, onde as revitalizadas Docas — antigo distrito portuário agora repleto de lojas e restaurantes — se conectam a um novo parque linear construído ao longo de um rio canalizado e ao Museu das Amazônias, cuja exposição inaugural apresenta uma ampla coleção de fotografias do falecido Sebastião Salgado.
Temor de ‘ressaca’
A poucos quarteirões dali, no entanto, o lixo se acumula nas ruas ladeadas por prédios vazios e em ruínas, onde circulam pessoas sem-teto.
A COP30 deixará uma marca duradoura em Belém, afirma o governo do Pará, responsável pela reforma da infraestrutura da cidade.
No centro das obras estará o Parque da Cidade — o principal local da conferência — que deve se transformar em um parque público após o encerramento da cúpula.
Em meio a críticas de moradores e da imprensa local pelo atraso na conclusão das obras de saneamento e macrodrenagem planejadas para antes do evento, o governo estadual disse que haverá investimentos de R$ 20 bilhões nos próximos anos que incluirá a conclusão do sistema de esgoto de Belém até 2033.
Outras melhorias incluem a reforma do acanhado aeroporto da cidade, a restauração do histórico Mercado de São Brás e a abertura de dois hotéis de alto padrão.
“Estou muito preocupada com a ressaca pós-COP. A cidade está passando por grandes consertos de base que precisam continuar”, disse Fafá de Belém. “Precisamos cobrar do governo, mas também aprender a preservar.”
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