Bloomberg Línea — A Receita Federal disse que identificou pelo menos 40 fundos de investimentos, com patrimônio somado de R$ 30 bilhões, que teriam sido utilizados como estruturas de ocultação e blindagem patrimonial por uma organização criminosa e que foram alvo nesta quinta-feira (28) da “Operação Carbono Oculto”, segundo nota da Polícia Federal, sem identificar os suspeitos.
A imprensa brasileira identificou a organização criminosa investigada como o PCC (Primeiro Comando da Capital).
Na cidade de São Paulo, um dos alvos dos mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia Federal (PF) é a Reag Investimentos, gestora fundada por João Carlos Mansur e uma das mais atuantes da Faria Lima e das que mais cresceram nos últimos anos.
Segundo informações no site da Reag Investimentos, a gestora era o maior player independente do país com cerca de R$ 300 bilhões em ativos, segundo dados de fevereiro de 2025 citados no ranking da Anbima (associação de entidades e empresas que atuam no mercado de capitais do país).
“A Reag Investimentos S.A. e a Ciabrasf – Companhia Brasileira de Serviços Financeiros S.A. informaram ao mercado nesta quinta-feira que suas sedes estão sendo alvo de mandados de busca e apreensão no âmbito da Operação Carbono Oculto", confirmou a gestora em nota.
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Mais cedo, jornais brasileiros haviam identificado a gestora como um dos alvos da operação.
“As empresas esclareceram que se trata de um procedimento investigativo em andamento e que estão colaborando integralmente com as autoridades competentes, fornecendo todas as informações e documentos solicitados. As companhias se comprometeram a manter acionistas e o mercado informados sobre os desdobramentos da investigação”, complementou a Reag na nota.
Segundo o comunicado da PF, estão sendo cumpridos mandados de busca e apreensão em cerca de 350 alvos - pessoas físicas e jurídicas - localizados em oito estados: São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Na capital paulista, são 147 alvos, sendo 103 de pessoas jurídicas.
Os fundos de investimento, em sua maioria fechados com um único cotista, criavam camadas de ocultação para impedir a identificação dos reais beneficiários dos recursos de origem ilícita, segundo a nota da PF (veja abaixo a informação divulgada pela Receita Federal sobre como funcionariam tais esquemas).

Entre os bens adquiridos por esses fundos de investimentos estão um terminal portuário, quatro usinas produtoras de álcool, 1.600 caminhões para transporte de combustíveis e mais de 100 imóveis, incluindo seis fazendas no interior de São Paulo avaliadas em R$ 31 milhões, além de uma residência em Trancoso, na Bahia, adquirida por R$ 13 milhões, segundo a PF.
Os indícios apontam que as administradoras dos fundos estavam cientes e teriam contribuído para o esquema, disse a PF em nota.
Fintech completava a estrutura, diz PF
Uma fintech de pagamento, não identificada, complementava a estrutura de ocultação, atuando como “banco paralelo” da organização criminosa e movimentando R$ 46 bilhões não rastreáveis entre 2020 e 2024, de acordo com a PF.
As mesmas pessoas controlavam outras instituições de pagamento menores, criando uma dupla camada de ocultação no sistema financeiro, segundo a nota.
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O dinheiro de origem ilícita era reinvestido em negócios, propriedades e outros investimentos por meio dos fundos que recebiam recursos da fintech, o que dificultava sua rastreabilidade e dava aparência de legalidade aos valores.
A utilização de fundos fechados com estruturas complexas de cotistas servia como mercado de ocultação patrimonial.
A fintech recebia diretamente valores em espécie, com mais de 10,9 mil depósitos que totalizaram R$ 61 milhões entre 2022 e 2023, “procedimento estranho” à natureza de uma instituição de pagamento, segundo a PF.
Era utilizada a “conta-bolsão”, conta aberta em nome da própria fintech em banco comercial por onde transitavam recursos não segregados de todos os clientes.
Maior operação da história
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ingressou com ações judiciais cíveis de bloqueio de mais de R$ 1 bilhão em bens dos envolvidos, incluindo imóveis e veículos controlados por meio dessas estruturas financeiras.
A operação é considerada a maior contra o crime organizado da história do país em termos de cooperação institucional.
O esquema infiltrado no sistema financeiro nacional conectava-se a toda cadeia de combustíveis controlada pelo crime organizado, segundo a PF.
Cerca de 1.000 postos de combustíveis vinculados ao grupo movimentaram R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024, alimentando as estruturas de ocultação financeira, de acordo com a nota.
O nome “Carbono Oculto” traduz a noção de dinheiro escondido dentro da cadeia do combustível, em alusão ao elemento químico presente na gasolina e diesel e ao ato de esconder recursos ilícitos nas instituições de pagamento e nos fundos de investimentos utilizados como estruturas de ocultação.
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Outras duas operações
Além da “Carbono Oculto”, a PF deflagrou hoje duas operações contra organizações criminosas que atuavam na cadeia produtiva de combustíveis, movimentando R$ 23 bilhões em rede criminosa nacional, segundo nota.
A Operação Quasar desarticulou um esquema que utilizava fundos de investimento para ocultar patrimônio de origem ilícita, empregando múltiplas camadas societárias e transações simuladas de compra e venda de ativos entre empresas do mesmo grupo.
A ação resultou no cumprimento de 12 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Campinas e Ribeirão Preto, com bloqueio de bens e valores até R$ 1,2 bilhão.
A Operação Tank teve como alvo uma rede de lavagem de dinheiro no Paraná que movimentou mais de R$ 23 bilhões desde 2019, utilizando centenas de empresas incluindo postos de combustíveis, distribuidoras e instituições de pagamento.
O grupo empregava táticas como depósitos fracionados em espécie de R$ 594 milhões, transações cruzadas, fraudes contábeis e adulteração de combustíveis em 46 postos de Curitiba.
A operação resultou no cumprimento de 14 mandados de prisão e 42 de busca e apreensão, com bloqueio de bens superior a R$ 1 bilhão de 41 pessoas físicas e 255 jurídicas.
-- Em atualização.
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