Bloomberg Línea — As regras adotadas pelo governo Lula para servir como alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeira (IOF) mudam a forma como são tributados diversos tipos de investimento no Brasil.
As medidas são mais abrangentes do que foi inicialmente divulgado pelo Ministério da Fazenda e atingem também ações, derivativos, criptoativos, investimentos de estrangeiros no país e fundos de investimento, de acordo com o texto da Medida Provisória nº 1.303 publicado na noite de quarta-feira (11) no Diário Oficial da União.
Além disso, o texto da MP confirma a tributação de 5% sobre títulos que antes eram isentos, como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas, e também o aumento da tributação sobre as casas de apostas esportivas – as chamadas bets.
Segundo o Ministério da Fazenda, a medida busca corrigir distorções, construir isonomia tributária e manter o equilíbrio fiscal. As ações foram tratadas com líderes da Câmara e do Senado depois de reação negativa ao decreto do aumento do IOF.
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A medida estabelece uma alíquota única de 17,5% de Imposto de Renda para os rendimentos de aplicações financeiras de pessoas físicas, substituindo a tabela regressiva para a renda fixa que tinha alíquotas de 22,5% (para rendimentos de até 180 dias) a 15% (acima de 720 dias).
O imposto será retido na fonte e considerado antecipação do valor devido na declaração anual. Os rendimentos serão informados em ficha própria na Declaração de Ajuste Anual. Se o imposto retido for maior do que o imposto apurado, o investidor poderá ter restituição.
Em uma novidade, as perdas com investimentos realizados a partir de 1º de janeiro de 2026 poderão ser compensadas com rendimentos de outras aplicações financeiras - antes a compensação era restrita à mesma categoria. As perdas não compensadas poderão ser aproveitadas por até cinco anos, segundo o texto da MP.
As novas regras entram em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026. Ganhos e rendimentos obtidos até 31 de dezembro de 2025 seguirão sendo tributados conforme a legislação anterior.
A Medida Provisória tem efeito imediato, mas precisa ser analisada e aprovada pelo Congresso em 60 dias (prorrogáveis por mais 60) para não perder a validade e pode sofrer alterações.
Ações
Ganhos em operações com ações e outros ativos negociados em bolsa ou balcão também passarão a ser tributados à alíquota de 17,5%, com apuração trimestral.
Antes a alíquota sobre os ganhos líquidos era de 15% para operações normais e de 20% para day-trade, e a apuração era mensal.
A isenção para vendas de ações, que antes era de até R$ 20 mil por mês, passa a valer apenas se o total vendido no trimestre for igual ou inferior a R$ 60 mil.
A remuneração recebida por investidores que emprestam ações ou títulos também será tributada à alíquota de 17,5%, com retenção na fonte.
As perdas em bolsa poderão ser compensadas com ganhos em outros trimestres, ou com outros rendimentos de aplicações financeiras, desde que respeitadas as condições da MP.
A compensação não será permitida se o contribuinte vender e recomprar o mesmo ativo em um período inferior a trinta dias.
Criptoativos
Criptoativos também passam a ser tributados. Ganhos com a venda desses ativos serão tributados à alíquota de 17,5%, com apuração trimestral.
O contribuinte poderá deduzir custos e despesas comprovadas e compensar prejuízos na tributação, mas apenas dentro da categoria de ativos virtuais.
Perdas com cripto não poderão ser compensadas com rendimentos de outras aplicações.
Investidores estrangeiros
Investidores estrangeiros passam a ser tributados com base nas mesmas regras aplicáveis a pessoas físicas residentes no Brasil, segundo o texto da MP. A alíquota padrão será de 17,5%.
Os ganhos com ações em bolsa permanecem isentos para investidores que não estejam em países com tributação favorecida – como aqueles considerados paraísos fiscais. Nestes casos, a alíquota será de 25%.
O investidor estrangeiro deverá indicar uma instituição no Brasil para ser responsável pelas obrigações tributárias no país, segundo o texto da MP.
Fundos de investimento
Fundos de investimento passam a ter os rendimentos dos cotistas tributados na distribuição, amortização ou resgate, também com alíquota de 17,5%.
Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs) e Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) seguem isentos em sua carteira, mas os cotistas passam a pagar Imposto de Renda sobre os rendimentos no momento da distribuição ou do resgate das cotas.
A alíquota será de 5% se o fundo tiver ao menos 100 cotistas e as cotas forem negociadas exclusivamente em bolsa ou mercado organizado, desde que o cotista não tenha 10% ou mais das cotas do fundo, nem direito a rendimento superior a 10% do total, segundo o texto.
Nesse e em outros casos, a alíquota será de 17,5%.
Títulos isentos (LCI, LCA, CRI, CRA, debêntures incentivadas)
Ativos que antes eram isentos, como LCI, LCA, CRI, CRA, Cédula de Produto Rural (CPR) financeira, debêntures incentivadas e letras de crédito do desenvolvimento, passarão a ter alíquota de 5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos, se forem emitidos a partir de 1º de janeiro de 2026.
Os títulos emitidos até esta data seguem as regras anteriores e continuam isentos.
Juros sobre capital próprio (JCP)
A MP aumenta de 15% para 20% a alíquota sobre os Juros sobre Capital Próprio (JCP) pagos por empresas a seus acionistas. A nova regra vale a partir da data de publicação da MP.
A cobrança do imposto será retida na fonte na data do pagamento ou do crédito ao beneficiário, segundo a MP, o que afeta a distribuição dos lucros a acionistas e investidores.
Tributação sobre casas de apostas esportivas (bets)
A MP do governo eleva a alíquota da contribuição sobre o faturamento das empresas operadoras de apostas de quota fixa — conhecidas como “bets” — de 12% para 18%.
A contribuição incide sobre o total arrecadado pelas empresas após o pagamento dos prêmios aos apostadores.
A medida não altera o Imposto de Renda nem a CSLL devidos pelas empresas de apostas, nem a tributação sobre os prêmios pagos aos jogadores.
-- Atualizada às 12h15 para incluir informações da tributação sobre JCP.
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