Nova MP muda tributação de ações, fundos, cripto, investimento estrangeiro e títulos

Medida Provisória do governo para servir de alternativa à proposta de aumento do IOF altera regras de tributação para além de títulos isentos como LCI, LCA, CRI e CRA e do que havia sido anunciado

Lula da Sila y Haddad
12 de Junho, 2025 | 10:20 AM

Bloomberg Línea — As regras adotadas pelo governo Lula para servir como alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeira (IOF) mudam a forma como são tributados diversos tipos de investimento no Brasil.

As medidas são mais abrangentes do que foi inicialmente divulgado pelo Ministério da Fazenda e atingem também ações, derivativos, criptoativos, investimentos de estrangeiros no país e fundos de investimento, de acordo com o texto da Medida Provisória nº 1.303 publicado na noite de quarta-feira (11) no Diário Oficial da União.

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Além disso, o texto da MP confirma a tributação de 5% sobre títulos que antes eram isentos, como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas, e também o aumento da tributação sobre as casas de apostas esportivas – as chamadas bets.

Segundo o Ministério da Fazenda, a medida busca corrigir distorções, construir isonomia tributária e manter o equilíbrio fiscal. As ações foram tratadas com líderes da Câmara e do Senado depois de reação negativa ao decreto do aumento do IOF.

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A medida estabelece uma alíquota única de 17,5% de Imposto de Renda para os rendimentos de aplicações financeiras de pessoas físicas, substituindo a tabela regressiva para a renda fixa que tinha alíquotas de 22,5% (para rendimentos de até 180 dias) a 15% (acima de 720 dias).

O imposto será retido na fonte e considerado antecipação do valor devido na declaração anual. Os rendimentos serão informados em ficha própria na Declaração de Ajuste Anual. Se o imposto retido for maior do que o imposto apurado, o investidor poderá ter restituição.

Em uma novidade, as perdas com investimentos realizados a partir de 1º de janeiro de 2026 poderão ser compensadas com rendimentos de outras aplicações financeiras - antes a compensação era restrita à mesma categoria. As perdas não compensadas poderão ser aproveitadas por até cinco anos, segundo o texto da MP.

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As novas regras entram em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026. Ganhos e rendimentos obtidos até 31 de dezembro de 2025 seguirão sendo tributados conforme a legislação anterior.

A Medida Provisória tem efeito imediato, mas precisa ser analisada e aprovada pelo Congresso em 60 dias (prorrogáveis por mais 60) para não perder a validade e pode sofrer alterações.

Ações

Ganhos em operações com ações e outros ativos negociados em bolsa ou balcão também passarão a ser tributados à alíquota de 17,5%, com apuração trimestral.

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Antes a alíquota sobre os ganhos líquidos era de 15% para operações normais e de 20% para day-trade, e a apuração era mensal.

A isenção para vendas de ações, que antes era de até R$ 20 mil por mês, passa a valer apenas se o total vendido no trimestre for igual ou inferior a R$ 60 mil.

A remuneração recebida por investidores que emprestam ações ou títulos também será tributada à alíquota de 17,5%, com retenção na fonte.

As perdas em bolsa poderão ser compensadas com ganhos em outros trimestres, ou com outros rendimentos de aplicações financeiras, desde que respeitadas as condições da MP.

A compensação não será permitida se o contribuinte vender e recomprar o mesmo ativo em um período inferior a trinta dias.

Criptoativos

Criptoativos também passam a ser tributados. Ganhos com a venda desses ativos serão tributados à alíquota de 17,5%, com apuração trimestral.

O contribuinte poderá deduzir custos e despesas comprovadas e compensar prejuízos na tributação, mas apenas dentro da categoria de ativos virtuais.

Perdas com cripto não poderão ser compensadas com rendimentos de outras aplicações.

Investidores estrangeiros

Investidores estrangeiros passam a ser tributados com base nas mesmas regras aplicáveis a pessoas físicas residentes no Brasil, segundo o texto da MP. A alíquota padrão será de 17,5%.

Os ganhos com ações em bolsa permanecem isentos para investidores que não estejam em países com tributação favorecida – como aqueles considerados paraísos fiscais. Nestes casos, a alíquota será de 25%.

O investidor estrangeiro deverá indicar uma instituição no Brasil para ser responsável pelas obrigações tributárias no país, segundo o texto da MP.

Fundos de investimento

Fundos de investimento passam a ter os rendimentos dos cotistas tributados na distribuição, amortização ou resgate, também com alíquota de 17,5%.

Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs) e Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) seguem isentos em sua carteira, mas os cotistas passam a pagar Imposto de Renda sobre os rendimentos no momento da distribuição ou do resgate das cotas.

A alíquota será de 5% se o fundo tiver ao menos 100 cotistas e as cotas forem negociadas exclusivamente em bolsa ou mercado organizado, desde que o cotista não tenha 10% ou mais das cotas do fundo, nem direito a rendimento superior a 10% do total, segundo o texto.

Nesse e em outros casos, a alíquota será de 17,5%.

Títulos isentos (LCI, LCA, CRI, CRA, debêntures incentivadas)

Ativos que antes eram isentos, como LCI, LCA, CRI, CRA, Cédula de Produto Rural (CPR) financeira, debêntures incentivadas e letras de crédito do desenvolvimento, passarão a ter alíquota de 5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos, se forem emitidos a partir de 1º de janeiro de 2026.

Os títulos emitidos até esta data seguem as regras anteriores e continuam isentos.

Juros sobre capital próprio (JCP)

A MP aumenta de 15% para 20% a alíquota sobre os Juros sobre Capital Próprio (JCP) pagos por empresas a seus acionistas. A nova regra vale a partir da data de publicação da MP.

A cobrança do imposto será retida na fonte na data do pagamento ou do crédito ao beneficiário, segundo a MP, o que afeta a distribuição dos lucros a acionistas e investidores.

Tributação sobre casas de apostas esportivas (bets)

A MP do governo eleva a alíquota da contribuição sobre o faturamento das empresas operadoras de apostas de quota fixa — conhecidas como “bets” — de 12% para 18%.

A contribuição incide sobre o total arrecadado pelas empresas após o pagamento dos prêmios aos apostadores.

A medida não altera o Imposto de Renda nem a CSLL devidos pelas empresas de apostas, nem a tributação sobre os prêmios pagos aos jogadores.

-- Atualizada às 12h15 para incluir informações da tributação sobre JCP.

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Filipe Serrano

É editor sênior da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.