Bloomberg Línea — O que parecia um sonho impossível há 18 anos se transformou na Agrotools. É assim que o CEO e fundador da empresa, Sérgio Rocha, descreve como pensou, em 2007, na possibilidade de monitorar a evolução de uma área rural com o apoio de dados espaciais e inteligência artificial.
“Naquela época, você olhava para um talhão de cana, de soja ou de milho e torcia para que desse certo e se materializasse ao final da colheita. Hoje, acompanhamos de maneira dinâmica e ajudamos os elos da cadeia”, disse Rocha em entrevista à Bloomberg Línea.
O agronegócio que Rocha ajuda a construir atualmente é muito diferente do imaginário há quase duas décadas e dos estereótipos.
“Estamos falando de um agro de algoritmos, de geotecnologia e de inteligência artificial, muito diferente do agro de raiz do interior paulista”, disse Rocha.
A empresa atua com soluções que conectam dados espaciais, climáticos e comerciais, com intuito de contribuir com grandes corporações a tomarem decisões estratégicas sobre suas cadeias de fornecimento.
A agtech cresceu ao longo dos anos de forma bootstrap, com o reinvestimento de receitas e ganhos. Somente entre 2021 e 2022, a empresa foi ao mercado e levantou R$ 100 milhões em uma primeira rodada com investidores.
Em 2021, a empresa atingiu R$ 130 milhões em receita.
A companhia opera com contratos recorrentes de médio a longo prazo, em média com duração de três anos, e eles somados apontam para um Life Time Value (LTV) estimado em R$ 200 milhões.
A empresa não divulga dados mais recentes de faturamento. Rocha disse apenas que a receita cresceu 36% entre 2023 e 2024.
A agtech ganhou escala na sua base de clientes. Apenas no ano passado, processou mais de 24 milhões de análises de dados.
Em 2023, a Agrotools iniciou uma expansão para a América do Norte, mercado que Rocha acreditava ter soluções tecnológicas bem desenvolvidas. Mas não foi o caso.
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“Achamos que encontraríamos uma sofisticação tecnológica maior, mas o setor agro nesses países ainda é muito básico digitalmente”, afirmou Rocha.
Embora 90% do faturamento da agtech ainda venha de operações focadas no Brasil e na América do Sul, a empresa já atende grandes clientes internacionais, como McDonald’s, tradings e bancos globais.
Para diminuir o tempo de análise, a empresa pretende lançar ainda neste ano uma nova geração de sua plataforma, diz Rocha. A expectativa é que o tempo de análise, que antes era de 15 dias para um milhão de casos, caia para um dia.
“Isso representa uma revolução na eficiência e na entrega de valor para nossos clientes”, afirmou o executivo, que espera que a atualização seja um dos vetores de crescimento da agtech para o ano.
Pilares de atuação
A atuação da Agrotools é dividida em três grandes pilares.
O primeiro é o setor financeiro, para o qual a empresa desenvolve ferramentas capazes de avaliar riscos com mais precisão do que os modelos tradicionais.
“O agro é complexo. Um produtor pode ter feito tudo certo, mas ser afetado por uma adversidade climática. Isso exige um novo tipo de leitura de risco, e é isso que entregamos ao setor financeiro”, explica Rocha.
A agtech atende bancos, cooperativas de crédito e seguradoras, e oferece insights via APIs integradas aos sistemas dos clientes e aplicativos móveis.

O segundo pilar envolve a inteligência de dados aplicada ao comércio de commodities, tanto na compra de matéria-prima como na venda de insumos e equipamentos agrícolas.
“A base de tudo é o território. Entendemos onde estão os clientes, quais as condições logísticas e como otimizar essas operações com dados”, afirma.
Já o terceiro pilar é a sustentabilidade.
Atualmente, cerca de 60% das operações de carne e até 40% das de grãos no país passam pelas plataformas da empresa, diz Rocha.
A rastreabilidade e a conformidade ambiental, uma vez vistas como custos, tornaram-se diferenciais competitivos para acesso a mercados exigentes e linhas de crédito sustentáveis.
Armazenar mais dados
Um dos maiores ativos da empresa são os dados. E também esse é um dos maiores desafios. A Agrotools é considerada uma das maiores consumidoras de dados espaciais e territoriais do mundo, afirmou Rocha.
Para lidar com esse volume, a empresa opera com nuvens (multi-cloud) e firmou uma parceria com a Microsoft, o que possibilitou acesso ao laboratório do computador planetário da big tech.
“A troca foi excelente: fornecemos dados em larga escala e, em contrapartida, testamos tecnologias que ainda nem chegaram ao mercado”, diz.
Mas armazenar dados custa caro. E esse é um problema ainda sem solução definitiva para a empresa.
“Estamos constantemente buscando formas criativas de reduzir custos, sem comprometer a qualidade e a precisão das análises. Dados são nosso combustível, e inteligência é o que os transforma em valor”.
“Hoje, quem não usa dados e tecnologia está em desvantagem. E nós somos o atalho para quem quer otimizar operações em escala gigante.”
Mesmo com o crescimento do setor como um todo, Rocha disse acreditar que o mercado brasileiro ainda está apenas no começo da digitalização.
Segundo ele, soluções como as da Agrotools ainda representam menos de 9% do potencial de penetração no país, o que revela um horizonte promissor para o futuro.
O time da agtech é composto por desenvolvedores e cientistas de dados.
Recentemente, a Agrotools foi escolhida como empresa âncora do Agropolo, iniciativa do Parque de Inovação Tecnológica de São José dos Campos (PIT).
Inspirado no sucesso do polo aeroespacial liderado pela Embraer, o Agropolo quer transformar a cidade em um Vale do Silício do agro de alta tecnologia.
“Hoje são mais de cem empresas que fazem parte desse ecossistema. Tentamos repetir o que a Embraer fez para a indústria aeroespacial, mas agora no agro digital”, afirmou Rocha, que não descartou o mercado de aquisições para a agtech.
“Estamos sempre em busca de oportunidades de M&A que complementam nossas competências em ciência de dados. Até agora, crescemos de forma orgânica, mas estamos prontos para acelerar com novas parcerias”, disse.
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