JP Morgan. A receita líquida de juros no primeiro trimestre deste ano foi 60% maior do que a receita trimestral obtida antes da pandemia
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Bloomberg Opinion — Quando o Federal Reserve injetou dinheiro na economia durante a pandemia de covid-19, a entidade exacerbou um problema para os maiores bancos dos Estados Unidos: o que fazer com todos os depósitos extras.

Agora que as taxas de juros estão prestes a cair quatro anos depois, os resultados das diferentes abordagens do JPMorgan Chase (JPM) e do Bank of America (BAC) estão bem claros: a escolha do primeiro em manter o dinheiro extra nos money markets ou no Fed acabou sendo uma estratégia muito mais lucrativa do que investir em títulos.

A lição desse caso é que é preciso manter a mente aberta para suas opções devido à grande incerteza, mas é errado criticar o Bank of America com tanta severidade.

Havia pouca oportunidade para emprestar o capital, e as escolhas do Bank of America sobre o que fazer com todo esse dinheiro foram semelhantes ao resto do setor. O JPMorgan se destacou mais. Hoje, a boa notícia para a economia é que ambos ainda têm recursos abundantes para atender a demanda por crédito quando ela retornar.

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Para ver o que aconteceu, observemos a receita líquida de juros – receita que os bancos ganham com empréstimos, mercados monetários e títulos após pagar depositantes e outros custos de juros.

A receita líquida de juros do JPMorgan no primeiro trimestre deste ano foi 60% maior do que a receita trimestral obtida antes da pandemia. Já a receita líquida de juros do Bank of America subiu apenas 12%.

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Essa diferença é muito maior do que a diferença no crescimento dos depósitos em cada banco: o Bank of America ainda tinha 41% mais depósitos no final do primeiro trimestre deste ano do que no início de 2019, ao passo que o JPMorgan tinha 65% a mais.

O JPMorgan conseguiu alguns depósitos e empréstimos extras com o resgate do First Republic Bank em 2023, mas não o foi suficiente para contabilizar a renda extra.

Vale a pena analisar a escala destes bancos após a pandemia e a crise bancária regional no ano passado. O total de depósitos do JPMorgan era de US$ 2,4 bilhões no final de março, e o total do Bank of America era de US$ 1,95 bilhões. Somados, isso equivale a um quarto de todos os depósitos nos EUA.

Durante 2020 e 2021, os auxílios do governo inundaram as contas bancárias de pessoas físicas e jurídicas, enquanto os consumidores estavam em lockdown, gastando menos e por vezes quitando algumas dívidas.

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Neste período, todos os bancos compraram mais títulos do Tesouro e títulos de agências federais, mas no segundo semestre de 2020 o Bank of America começou a direcionar os seus recursos excedentes para bonds e a reduzir o montante em reservas de liquidez, equivalentes a dinheiro em espécie, ao passo que o JPMorgan deu preferência para a reserva de liquidez e ali permaneceu.

No ponto de maior diferença no final de 2021, o Bank of America tinha quase dois terços dos seus depósitos excedentes em títulos, e o JPMorgan, menos de um terço.

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No início, o Bank of America parecia inteligente: o Fed só começou a aumentar as taxas em março de 2022, e a taxa efetiva dos fundos do Fed nos mercados só ultrapassou os rendimentos do Tesouro em novembro. Mas à medida que os juros aumentaram, o rendimento que o JPMorgan tinha com seu caixa ajudou a sua receita líquida de juros a começar a acelerar, descolando o banco do seu rival.

Para o Bank of America também havia outras questões. À medida que os rendimentos dos títulos subiram, o valor deles caiu, o que provocou impactos de capital em todos os bancos. Mas para o Bank of America, isso gerou questões maiores sobre a dimensão das perdas não realizadas de títulos que o banco planeava manter até o vencimento, principalmente após o colapso do Silicon Valley Bank no ano passado. No final de 2023, o Bank of America tinha US$ 131 bilhões de perdas não realizadas em títulos, ante US$ 34 bilhões do JPMorgan.

As probabilidades de o Bank of America ter de contabilizar essas perdas eram incrivelmente reduzidas, dadas as suas vastas reservas de dinheiro disponíveis para quaisquer retiradas de depósitos. Ainda assim, houve algumas manchetes esquisitas, e os analistas ainda perguntavam na semana passada se a alteração dos valores dos títulos na carteira disponível para venda poderia prejudicar a sua base de capital no futuro.

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Perguntei a Alastair Borthwick, CFO do Bank of America, se ele agora tomou decisões com base em palpites para mover mais dinheiro para títulos. “Se tivéssemos sabido absolutamente há dois ou três anos tudo o que ia acontecer, poderíamos ter feito um trabalho melhor? Claro”, disse. “Mas estamos muito confortáveis com onde estamos”.

A questão para a economia em geral é como isto afeta a capacidade ou o apetite dos bancos por empréstimos. Em suma, não deveria afetar, e os próprios bancos insistem que emprestariam mais se houvesse procura.

Em todos os bancos, os empréstimos comerciais e industriais estavam cerca de 20% mais altos no final de março do que no início de 2019, enquanto os empréstimos ao consumidor aumentaram 28%.

Os empréstimos totais do JPMorgan cresceram quase 20% durante o mesmo período (excluindo o First Republic Bank, que acrescentou 14 pontos percentuais de crescimento). O crescimento dos empréstimos do Bank of America estava 11% atrás do setor até o final de março.

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O JPMorgan teve ajuda por gerir o maior negócio de cartões de crédito dos EUA, que registrou uma recuperação dos empréstimos muito mais forte do que outros tipos de empréstimos. Mas no balanço do primeiro trimestre, ambos os bancos afirmaram que a procura por empréstimos empresariais, em particular, permaneceu fraca.

É provável que isso mude em 2024, à medida que todo o dinheiro extra que os consumidores e as empresas receberam com a pandemia finalmente se esgotar. Quando os juros caírem novamente, a procura por crédito deverá aumentar.

Os bancos não deverão ter problemas para atender a essa demanda: para o JPMorgan e o Bank of America, os empréstimos representavam menos de 55% dos depósitos no final do primeiro trimestre, muito abaixo dos quase 70% no início de 2019. A soma de seu dinheiro e espécie e de seus títulos, foi de impressionantes US$ 3,2 trilhões. Nem todo esse valor pode ir para empréstimos, mas boa parte sim.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Paul J. Davies é colunista da Bloomberg Opinion e cobre bancos e finanças. Já foi repórter para o Wall Street Journal e o Financial Times.

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