Bloomberg Opinion — O desespero com o mercado de escritórios parece estar diminuindo nos Estados Unidos – pelo menos se o desempenho dos fundos de investimento imobiliário, os REITs, for um indicador. Mas esse mercado ainda não está fora de perigo, e os riscos podem pairar sobre ele nos próximos anos se as taxas de juros permanecerem próximas aos níveis atuais.
O Bloomberg REIT Office Property Index teve um retorno de cerca de 25% desde suas baixas no final de maio, quase três vezes os ganhos do índice S&P 500.
Os spreads do rendimento dos dividendos dos fundos de investimento imobiliário (REITs) de escritórios frente os títulos do Tesouro de 10 anos – uma medida aproximada da percepção de risco – voltaram a se aproximar do padrão histórico em relação a seus máximos após a crise bancária de março.
Em maio, o spread quase ultrapassou o pico pós-crise financeira. E, desde então, caiu para 1,74 ponto percentual no final de agosto – não exatamente um patamar “normal”, mas próximo disso.

Então, o que aconteceu desde então?
Primeiro, os temores de recessão de curto prazo diminuíram, alimentando uma ampla recuperação no mercado de ações dos Estados Unidos. Em segundo lugar, a SL Green Realty, gigante do setor, vendeu uma participação de 49,9% em um imóvel na Park Avenue com valuation relativamente positivo de US$ 2 bilhões, aliviando as preocupações sobre a disponibilidade de capital a um preço razoável.
Mas há algumas ressalvas que devem ser levadas em conta.
Para começar, os REITs de escritórios acabaram se revelando um substituto ruim para o mercado geral de escritórios. Como Jeffrey Langbaum, estrategista sênior de REITs da Bloomberg Intelligence, me disse na semana passada, os REITs tendem a manter propriedades com qualidade superior à média.
“Há uma grande discrepância entre ativos de melhor qualidade e ativos de menor qualidade”, disse ele. “A maior parte dos efeitos, acredito, será sentida fora do espaço dos REITs.”
Apesar de todo o alarde sobre o surgimento do trabalho remoto, os proprietários provavelmente ainda encontrarão demanda por prédios importantes no coração dos distritos comerciais centrais do país. O problema pode surgir nas partes obscuras e fechadas do mercado, em que a visibilidade em tempo real é geralmente ruim.
Além disso, o spread de rendimento pode não ser o sinal positivo que já foi no passado. Um dos motivos para esse estreitamento é o fato de as empresas terem cortado seus dividendos projetados para os próximos 12 meses a fim de preservar capital.
No segundo trimestre, a Vornado Realty Trust suspendeu temporariamente seus dividendos após tê-los cortado anteriormente em cerca de 29%, e alguns outros REITs de escritórios (representando cerca de 18% do índice) fizeram cortes grandes e notáveis no ano passado.
Para que os imóveis para escritórios em geral saiam intactos desse episódio, vários acontecimentos precisam ocorrer.
No próximo ano, os proprietários de imóveis precisam provar que podem refinanciar suas hipotecas que estão vencendo, apesar da retração dos bancos regionais. Como Langbaum disse recentemente, a venda da participação na SL Green foi um sinal positivo, mas os investidores precisarão ver mais evidências como essa de que tanto o capital próprio quanto o capital de dívida continuam disponíveis.
Para resolver permanentemente a situação, pelo menos uma de duas coisas precisa acontecer: a demanda por espaços para escritórios precisa voltar aos padrões pré-pandemia (o qué é improvável); e os juros, diminuírem de forma sustentável (possível, mas até quando?).

O ônus realmente parece estar nas taxas de juros, que são uma espécie de tiro no escuro. Os rendimentos dos títulos do Tesouro de cinco a dez anos atingiram recentemente para o valor mais alto desde 2007, e os dados da Cushman & Wakefield mostram que os credores estão exigindo 305 pontos-base adicionais em hipotecas de escritórios com taxas fixas de cinco anos com uma relação empréstimo/valor acima de 60%.
Isso representa uma taxa de hipoteca total de cerca de 7,2%, e é um choque para qualquer pessoa que esteja renovando um empréstimo emitido anos antes. Simultaneamente, as taxas de desconto elevadas significam que os valores dos imóveis (usados para se qualificar para empréstimos) também estão comprimidos.
Os investidores podem temporariamente ignorar essa realidade assustadora se acreditarem que as taxas altas são transitórias. Talvez os investidores de private equity e outros vejam isso como um momento de ganância, trazendo capital adicional para a mesa.
O principal problema surgirá se as expectativas das taxas de juros começarem a se ancorar nos níveis atuais, talvez por medo da inflação de longo prazo ou por preocupações com déficits governamentais sustentavelmente altos.
Se isso acontecer e os bancos regionais continuarem tímidos quanto à concessão de novos créditos, a onda de refinanciamentos ao longo do próximo ano poderá se tornar feia rapidamente. Portanto, embora as boas notícias provenientes do mercado de REITs sejam bem-vindas, talvez ainda seja um pouco prematuro esquecer o risco representado pelo mercado de escritórios nos EUA.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Jonathan Levin trabalhou como jornalista da Bloomberg na América Latina e nos EUA, cobrindo finanças, mercados e fusões e aquisições. Mais recentemente, ele atuou como chefe da sucursal da empresa em Miami. Ele é analista financeiro certificado pelo CFA Institute.
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