Itaú e Bradesco vs. Nubank: o que esperar do impacto da crise nos balanços

Resultados do JPMorgan e do Morgan Stanley acendem alerta para investidores em bancos brasileiros, cuja operação é mais dependente de crédito

Nubank: resultado do segundo trimestre vai mostrar efeitos dos juros altos sobre a carteira de crédito
15 de Julho, 2022 | 04:15 AM
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São Paulo — O cenário macroeconômico se tornou mais desafiador para os bancos brasileiros neste segundo semestre diante das previsões cada vez mais consensuais de uma recessão nos Estados Unidos e dos impactos do ciclo mundial de alta dos juros - para conter a inflação - nos fluxos de capital para países emergentes, segundo analistas e gestores ouvidos por Bloomberg Línea.

Balanços trimestrais considerados decepcionantes nesta quinta-feira (14), divulgados pelos gigantes americanos JPMorgan (JPM) e Morgan Stanley (MS), acenderam o sinal de alerta no mercado devido à redução dos lucros e das receitas reportados no segundo trimestre. A safra de resultados dos bancos brasileiros só começa na última semana do mês. Inadimplência, diversificação de receitas e controle de custos são apontados como os principais pontos a serem observados por investidores.

Nesta sexta (15) saem os resultados de Citi (C) e Wells Fargo (WFC).

Veja a seguir a visão de dois analistas e um gestor sobre os resultados de bancos brasileiros:

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  • “A análise tem de considerar as diferenças entre Brasil e EUA. Nosso Banco Central começou a subir a taxa Selic muito antes do Fed. Já temos juros reais, e isso beneficia o Brasil, que pode ser o primeiro a sair do ciclo de alta das taxas. O clima de cautela é maior neste segundo semestre e isso pode postergar investimentos”, diz João Daronco, analista da Suno Research.
  • Os grandes bancos tradicionais, como Itaú (ITUB4) e Bradesco (BBDC4), têm uma resiliência maior do que os bancos digitais neste novo cenário, pois captam recursos a um custo menor, não precisam investir tanto em infraestrutura e não são tão dependentes de uma só vertical, mas o comportamento da inadimplência preocupa”, afirma Victor Bueno, analista da Nord Research.
  • “Ainda é cedo para recomendação de troca de posição em ações de bancos. Os apertos monetários ao redor do mundo reduzem a liquidez e aumentam o risco de calote para os bancos, que emprestam menos, mas os últimos balanços ainda mostram uma solidez do setor, apesar das incertezas”, comenta o gestor Bruno Tebaldi, da Nova Futura Investimentos.

Qualidade do crédito

A piora da qualidade do crédito é o principal ponto a ser observado nos resultados financeiros do segundo trimestre do setor bancário, segundo o analista Pedro Leduc, do Itaú BBA.

“Evitaremos os bancos digitais - Nubank (NU) e Banco Pan (BPAN4)- devido à alta concentração de crédito ao varejo e custos de funding [captação de recursos]”, escreveu Leduc em relatório a clientes sobre a revisão de recomendações do Itaú BBA para o setor com a safra de balanços do segundo trimestre.

O Banco do Brasil (BBAS3) é a principal escolha do analista do Itaú BBA para uma recomendação “outperform” (desempenho acima da média do setor): o banco cita seu portfólio considerado menos cíclico e tendências mais fortes de NII (receita líquida com juros). Entre as instituições de menor porte, ele destaca o Banco ABC (ABCB4) devido à expansão dos lucros e à qualidade de crédito estável.

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Já o analista da Suno Research diz que a maior exposição do BB ao crédito ao agronegócio contribui para fortalecê-lo diante de um cenário macroeconômico mais negativo, considerando o perfil exportador do setor, com receitas em moeda estrangeira.

“Bancos como BB e Itaú têm uma forte presença no financiamento do agronegócio, um setor que pode compensar quando o resto do mercado doméstico vai mal. São diferentes do neobancos digitais, que são muito dependentes do varejo, da pessoa física”, diz Daronco.

Neobancos

Para o analista da Nord Research, os bancos digitais que investiram em diversificação de suas prateleiras de produtos e serviços tendem a se proteger mais de adversidades no cenário macroeconômico, na comparação com neobancos que dependem de um portfólio menor.

“A inadimplência deve impactar mais os [bancos] digitais do que os bancões, que possuem um histórico mais longo de seus clientes e podem controlar melhor o risco de concessão de crédito, além de compensarem eventuais perdas com outras verticais de negócios, como a área de seguros”, diz Bueno.

Entre os neobancos, ele cita o exemplo do Inter, que investe em marketplace e tem uma operação nos Estados Unidos em expansão. Para o analista, o Inter (INTR) é mais diversificado do que o Nubank, cuja receita vem mais das parcerias com marcas de cartões de crédito - isso o torna dependente do nível do consumo doméstico, prejudicado em tempos de inflação e juros elevados.

“Os bancos digitais atuam principalmente com clientes com renda de até cinco salários mínimos, um extrato que tem sofrido muito com a inflação”, comenta o analista da Nord Research.

Já o gestor da Nova Futura Investimentos afirma que, diante do cenário mais restritivo à captação de recursos e ao financiamento externo de fintechs, os bancos digitais devem rever suas políticas de remuneração dos serviços prestados aos clientes, aumentar taxas e reduzir custos, como se viu nos últimos meses com a onda de cortes de pessoal no setor de tecnologia.

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“É muito pesado o investimento para entrar no mundo digital e captar clientes. Além disso, para funcionar, a alma do negócio é investir em infraestrutura digital e contratar pessoal qualificado. Só que agora, com o ciclo de alta dos juros, os empréstimos ficaram mais caros, e a liquidez diminuiu. Não há mais aquela enxurrada de dinheiro dos primeiros anos da pandemia”, observa Tebaldi.

IPO e M&A

A desaceleração do crescimento mundial, levando a um quadro recessivo moderado ou severo, como alertou o banco suíço Lombard Odier, tende a reduzir os ganhos dos bancos de investimentos com operações de M&A (fusões e aquisições) e abertura de capital, segundo o analista da Suno.

“É um ano difícil para os bancos de investimentos mais expostos e dependentes dessa vertical, pois o movimento de fusões, aquisições e consolidações de setores já é bem menor. Há uma retração muito forte de M&A e IPOs. Bancos como BTG Pactual e BR Partners eram muito ativos nessas operações”, diz Daronco.

Mesmo com mais nuvens no horizonte, o analista da Suno espera que os resultados do setor bancário do segundo trimestre venham em linha com o que se viu no primeiro trimestre. “Não espero grandes surpresas nos balanços. Não acredito que os balanços dos bancos americanos sejam um presságio de decepções para as instituições brasileiras, que têm índices de Basileia ainda muito saudáveis”, afirma o gestor da Nova Futura Investimentos.

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Pix e real digital

As inovações para o setor financeiro, como as novas modalidades do Pix (sistema instântaneo de pagamento) e o real digital, podem ter lançamentos acelerados diante dos desafios da nova fase possivelmente recessiva da economia mundial, segundo o gestor da Nova Futura.

“As novas tecnologias de meios de pagamento tendem a andar agora em ritmo mais rápido, para bancos e instituições de pagamento aumentarem a liquidez do mercado”, disse Tebaldi, em referência ao impacto do Pix nas transações do varejo em uma economia ainda marcada pela informalidade.

A mais recente previsão do Banco Central é lançar o projeto piloto do real digital no quarto trimestre deste ano. Os bancos também esperam lançar o Pix Crédito ainda neste semestre.

O Santander Brasil reporta seu resultado do segundo trimestre no próximo dia 28, antes da abertura da Bolsa. Já o Bradesco e o Itaú divulgam seus balanços nos dias 4 e 8 de agosto, respectivamente, após o fechamento. O Banco do Brasil anuncia seus números no dia 10 de agosto.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.