Ex-BC: Guedes abandonou agenda liberal e embarcou na campanha

Para Alexandre Schwartsman, PEC dos Precatórios, que altera o cálculo do teto de gastos, acaba com regime fiscal criado em 2016

Alexandre Schwartsman
22 de Outubro, 2021 | 12:30 PM

São Paulo — Ao analisar os desdobramentos da PEC dos Precatórios, que visa mudar o cálculo do teto de gastos, e a queda de quatro membro-chave da equipe econômica, o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman concluiu que, embora formalmente o mecanismo de controle de gastos ainda exista, o regime criado em 2016 não existe mais.

“O bypass das restrições impostas pelo teto de gastos está sendo corretamente interpretado como uma deterioração significativa das instituições fiscais″, escreveu o economista, em relatório da consultoria Schwartsman e Associados, que ele lidera.

“Daí o caos nos mercados financeiros e a renúncia de membros-chave da equipe econômica, incluindo o Secretário do Orçamento e o Secretário do Tesouro Nacional, mas não o ministro da Economia, que desistiu definitivamente da sua agenda dita liberal e saltou de corpo e alma na campanha de reeleição do presidente”, afirmou Schwartsman, no texto.

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Ontem à noite, avançou na Câmara dos Deputados o texto novo da PEC dos Precatórios. O substitutivo apresentado pelo relator, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), prevê, além do limite com estas despesas e parcelamento de precatórios com valores superiores a R$ 66 milhões (o que afeta especialmente Estados e municípios que têm a receber R$ 16 bilhões da UnIão), uma mudança no cálculo do teto de gastos.

Pela regra que vigora desde 2016, quando a Constituição foi alterada para criar o teto, o limite de crescimento dos gastos do governo federal é determinado pela inflação medida em 12 meses até junho do ano anterior. A proposta incluída na PEC dos Precatórios muda isso para dezembro, além de abrir mais um extra no caixa de 2022, porque a mudança seria retroativa a 2016.

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Nas contas de Schwartsman, a mudança no teto abriria espaço para despesas adicionais de R$ 46,7 bilhões. Com a limitação de pagamentos de precatórios – que são dívidas cujo pagamento será protelado – o governo terá um extra de R$ 94 bilhões para gastar no ano eleitoral.

Este valor é superior aos R$ 75 bilhões de custo estimado do novo Auxílio Brasil, que substitui o Bolsa Família, com pagamentos estimados de R$ 400 até o final de 2022. O Bolsa Família, em vigor há 18 anos, custa anualmente em torno de R$ 34,7 bilhões.

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Embora o economista afirme que o texto do projeto tecnicamente preserve a existência do teto de gastos, seu “espírito” o desvirtua na prática. “É claro que o regime fiscal criado em 2016 simplesmente não existe mais”, afirmou Schwartsman, no texto.

Após aprovação ontem na Comissão Especial, a PEC dos Precatórios vai ao plenário da Câmara dos Deputados, onde precisa de 308 votos dos 513 deputados. Se aprovada, a proposta segue ao Senado.

Neste vídeo, a Bloomberg Línea explica, em linguagem simples, o que são precatórios e como eles se tornaram uma bomba-fiscal.

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.