‘Apagão’ de insumos coloca em risco safra agrícola do Brasil

Importação de glifosato é 20% menor em 2021, com preço médio 22% maior. Já a compra de fertilizantes que cresceu 40% no primeiro trimestre recuou 6% em volume no terceiro período do ano

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São Paulo — O apagão de insumos que era visto apenas como uma possibilidade no início do segundo semestre está se mostrando uma dura realidade para os produtores. No último dia 4 de agosto, a Bloomberg Línea publicou uma reportagem onde informava que 90% dos defensivos agrícolas da safra 2021/22 já haviam sido vendidos, mas que a própria indústria não descartava atrasos na entrega e cancelamentos de compras. O artigo também já apontava para a falta de fertilizantes, especialmente para quem deixou para adquirir o produto no limite do prazo de compra.

Pouco mais de dois meses após a publicação, o sentimento do setor produtivo é que a falta de insumos pode por em risco a próxima safra. Para Antônio Galvan, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja-Brasil), ainda é cedo para se falar em prejuízos, mas a situação é grave.

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“A falta de defensivos é ainda mais crítica que a de fertilizantes. Para iniciar o plantio, é preciso fazer uma aplicação de glifosato para preparar o solo para o plantio. Cerca de 20 dias após a semente estar no solo, uma nova aplicação deve ser feita para controle das ervas daninhas. Sem o produto, o plantio atrasa, mesmo havendo condições climáticas favoráveis”, afirma Galvan.

Importações de glifosato e adubos

De janeiro a setembro, o Brasil importou menos de 100 mil toneladas de glifosato, o volume representa uma queda de 20% em comparação ao mesmo período do ano passado, quando foram adquiridas 124,6 mil toneladas do produto. Em setembro, contudo, foi o primeiro mês deste ano em que o volume mensal superou seu par de 2020. No mês passado, a importação de glifosato chegou a 20,7 mil toneladas, um crescimento de 11% sobre setembro do ano passado.

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No que se refere aos fertilizantes, a situação não é muito diferente e quem adiou a compra está com as entregas atrasadas. De janeiro a março o Brasil viveu um boom nas compras de adubos. O país importou 1,15 milhão de toneladas no primeiro trimestre, volume 41% maior do que o acumulado dos três primeiros meses de 2020. No segundo trimestre do ano, o volume adquirido foi praticamente o mesmo de 2020, pouco mais de 1 milhão de toneladas. Entre julho e setembro, no entanto, as compras recuaram 6%, totalizando pouco mais de 988 mil toneladas.

Atrasos e renegociação de contratos

Diante do atual quadro, muitas empresas fornecedoras de insumos estão atrasando as entregas, tentando renegociar os contratos com os produtores ou mesmo devolvendo o valor pago corrigido e informando que não fará a entrega. “As empresas estão roendo a corda. Muitos produtores estão sendo executados por não terem entregue parte da safra passada por causa da seca. Agora, como vamos entregar o produto que foi vendido antecipadamente?”, questiona Galvan.

Para Guilherme Bellotti, gerente da consultoria agro do Itaú BBA, as renegociações com fertilizantes estão acontecendo, mas ainda são pontuais e ocorrem principalmente para compras feitas de última hora. “A preocupação é com a safrinha e culturas como cana-de-açúcar e café, tanto do ponto de vista de preços quanto de disponibilidade”, afirma Bellotti.

O aumento dos preços do gás natural, insumo necessário para a produção de amônia, fez com que a Yara, maior empresa de fertilizantes do mundo, anunciasse uma redução de 40% de sua capacidade de produção de suas fábricas na Europa.

Além disso, as fábricas chinesas e europeias também estão sofrendo com a crise energética. Com a chegada do inverno no hemisfério norte, o risco de escassez energética pode se agravar, impactando as indústrias fabricantes de insumos.

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“O atual cenário gera uma dificuldade muito grande de precificação dos insumos e, consequentemente, de fazer a compra antecipada. Com a preocupação do produtor em relação à alta dos insumos, as vendas antecipadas perdem o ritmo e pode prejudicar o nível de liquidez dos produtores”, afirma Belloti, do Itaú BBA.

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