Brasil pode sofrer “apagão” de insumos na próxima safra

Com 90% dos defensivos já vendidos para o próximo ciclo, indústrias não descartam atraso ou mesmo cancelamento de entregas por falta de matéria-prima chinesa

Queda na oferta de matéria-prima chinesa pode levar a desabastecimento do mercado brasileiro de defensivos agrícolas na próxima safra
04 de Agosto, 2021 | 01:26 PM

São Paulo — As indústrias de defensivos químicos estimam que o segundo semestre de 2021 e o primeiro trimestre de 2022 serão meses difíceis para o setor, com impactos sobre a produção nacional. O aumento de custos de produção e a redução na oferta de matérias-primas utilizadas para produção das fórmulas usadas nas lavouras estão gerando duas consequências: aumento de preços e possibilidade de falta de produto.

“Vamos ter dificuldades em alguns produtos. Uns mais do que outros. Fornecedores da China não estão honrando as entregas e há, sim, a preocupação de algumas empresas de não conseguir entregar os produtos aos distribuidores”, afirma Júlio Borges Garcia, presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg).

A preocupação do representante da indústria pode ser traduzida nos números de importação do Brasil. De janeiro e junho, as importações brasileiras de defensivos recuaram quase 3% em comparação ao mesmo período do ano passado, mesmo com a valorização do dólar.

Entrega de fertilizantes nas fazendas pode atrasar devido a problemas logísticos e aumento da demanda no hemisfério nortedfd

Enquanto as compras de inseticidas caíram 2,7%, as importações de fungicidas encolheram 38,5%. Mesmo com as compras externas de herbicidas tendo crescido 36,6% no primeiro semestre do ano, as importações de glifosato, principal produto de combate a ervas daninhas do mundo, caíram 49% em volume.

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“Há uma oferta limitada de glifosato no mundo. A China reduziu sua capacidade de produção e há uma preocupação em relação à oferta e disponibilidade do produto no Brasil”, afirma Guilherme Bellotti Melo, gerente de consultoria Agro do Itaú BBA.

Segundo Garcia, do Sindiveg, os preços do glifosato triplicaram de preços nos últimos três anos, desde quando o governo chinês começou a apertar o cerco em torno das indústrias do país, exigindo maiores controles ambientais. A medida levou muitos fabricantes de defensivos da China a fechar as portas, reduzindo substancialmente a disponibilidade do principal produto usado no controle de pragas agrícolas do mundo.

“Existem outros 12 princípios ativos nessa situação. A pressão maior será sobre os herbicidas, mas também vemos problemas em alguns inseticidas. Ainda precisamos ver como a China vai se comportar”, afirma Garcia.

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Mas o problema de abastecimento não afeta apenas a indústria de defensivos. Os produtores que adiaram a compra de fertilizantes, apostando em uma queda do preço, correm o risco de não receber o produto no momento certo e ainda ter que pagar caro.

“Havia uma expectativa de que os preços dos fertilizantes cedessem após o plantio da safra nos Estados Unidos, o que não aconteceu. Os fosfatados estão, em dólar mais do que o dobro do valor observado no ano passado”, afirma Melo, do Itaú BBA.

Alexandre Inacio

Jornalista brasileiro, com mais de 20 anos de carreira, editor da Bloomberg Línea. Com passagens pela Gazeta Mercantil, Broadcast (Agência Estado) e Valor Econômico, também atuou como chefe de comunicação de multinacionais, órgãos públicos e como consultor de inteligência de mercado de commodities.