WeWork só não cresce mais por falta de prédios ‘triple A’ no Brasil, diz CEO LatAm

Em entrevista à Bloomberg Línea, Claudio Hidalgo diz que operação no país opera com taxa de ocupação de 84% e que escassez de edifícios de alto padrão é um dos entraves para a abertura de novas unidades no curto e no médio prazo

WeWork
28 de Agosto, 2025 | 05:01 AM

Bloomberg Linea — Poucos executivos conhecem tão bem os altos e baixos da WeWork quanto o chileno Claudio Hidalgo.

Ex-COO global da companhia e atualmente CEO da operação na América Latina, ele voltou à empresa que se tornou sinônimo de coworking em 2023 para liderar um dos momentos mais turbulentos de sua história: a preparação para o Chapter 11 nos Estados Unidos, o equivalente à recuperação judicial no Brasil.

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De lá para cá, o executivo ajudou a redesenhar a operação global, a eliminar bilhões de dólares em dívidas e a reintegrar a América Latina ao controle direto da matriz, depois de anos sob uma joint venture com o SoftBank.

Hoje, Hidalgo fala em “novo capítulo” — literalmente.

Claudio Hidalgo, do WeWork: E hoje a operação na América Latina é rentável e sustentável.  O que significa dizer que tem planos de longo prazo que vão crescendo e hoje passa um momento espetacular

A WeWork, segundo ele, deixou de ser um mosaico de operações independentes para se tornar uma companhia global padronizada, com métricas únicas, foco em rentabilidade e em elevar a experiência de seus membros.

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E, nesse cenário, a América Latina — em especial o Brasil — se tornou vitrine, segundo ele: o país já alcançou o patamar de 84% de ocupação em seus prédios e um NPS (Net Promoter Score, métrica universal de satisfação do cliente) de 80%, o maior do mundo dentro da rede de coworking.

Em entrevista exclusiva à Bloomberg Línea em breve passagem pelo Brasil, Hidalgo contou como foi o processo de reestruturação, detalhou o peso da região no balanço global e projetou os próximos passos para o Brasil e a América Latina.

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“Podemos ter que abrir espaços antes [de 2028 no Brasil], mas precisamos que exista inventário ou prédios disponíveis no perfil premium, triple A. E a vacância de prédios hoje é muito baixa, não tem muita disponibilidade para crescermos", contou em referência à abertura de novas unidades no país.

Enquanto esse desafio não é equacionado, o plano é continuar a crescer pelo menos até 2028 com a maximização dos espaços hoje existentes nos 28 prédios no mercado brasileiro.

Veja a seguir a entrevista editada para fins de clareza e compreensão:

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Você atuou como COO global de 2020 a 2022 e depois retornou à WeWork em um período turbulento, com a empresa se preparando para o Chapter 11 em 2023. Como foi esse processo?

Eu estava fora do mundo corporativo desde 2022, morando na Colômbia, literalmente em uma fazenda, aposentado. Mas em junho de 2023 o presidente global me ligou e pediu para que eu voltasse. Primeiro, assumi como COO de Estados Unidos e Canadá, porque era preciso preparar a operação para entrar potencialmente no Chapter 11. Fizemos toda a estratégia operacional para isso.

Quando já estávamos prontos para entrar no Chapter 11, ele me disse: ‘Preciso que você faça o mesmo, mas globalmente’. Isso por causa de uma razão central: antes do Chapter 11, nós tínhamos operações diferentes em todo o mundo.

Cada país era quase uma companhia independente. E como o tempo era muito curto e o dinheiro limitado para o turnaround, não podíamos administrar 40 empresas diferentes. Precisávamos de uma única companhia, uma única métrica, um único modelo operacional. E fizemos isso com muito êxito: as pessoas têm a mesma experiência em Nova York, Bangkok, na Tailândia, e Sydney, na Austrália.

Como a operação da América Latina entra no processo de mudanças globais?

Em outubro de 2024, recompramos os mercados de língua espanhola, que estavam sob controle de uma joint venture com o SoftBank. Em janeiro de 2025, recompramos também o Brasil. Desde então, a América Latina passou a ser 100% da WeWork global.

Isso foi muito importante porque nos permitiu aplicar aqui todo o aprendizado do processo de reestruturação global. As coisas que fizemos bem e as que fizemos mal — tudo foi usado para acelerar a transformação na região.

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Globalmente, eliminamos quase US$ 4 bilhões em dívidas e quitamos mais de US$ 13 bilhões em passivos futuros.

E hoje a operação na América Latina é rentável e sustentável. O que significa dizer que hoje passa por um momento espetacular e que tem planos de longo prazo que vão crescendo. O processo de reestruturação foi muito mais curto, mais acelerado e com muito foco.

O Brasil hoje lidera globalmente com o melhor NPS, de 80%, e o é o segundo país com a mais alta ocupação, em 84%, em toda a América, atrás apenas do Chile.

O que foi realizado e tornou possível que a companhia se tornasse sustentável nesse período de um ano?

Tem muito a ver com o Chapter 11 nos Estados Unidos, que é um processo de reestruturação - ou seja, você reestrutura todas as dívidas.

E nós colocamos 100% do foco em nossos membros [clientes] globalmente. Na América, inclusive, o NPS está acima de 80%. Nunca tínhamos alcançado nota tão alto, antes ficava na faixa de 50 a 60. Isso ajudou a impulsionar a receita.

Do lado dos custos, negociamos todos os aluguéis globalmente com os proprietários. Somando as novas condições com o crescimento da receita e um nível de satisfação muito alto, temos a combinação para uma empresa rentável.

No fim do ano passado, ainda na fase da joint-venture em LatAm, a WeWork teve problemas com dívidas e devolveu imóveis a proprietários e fundos de investimentos no Brasil. Ainda existem problemas como esse?

Não temos mais dívida. Nós passamos por um momento difícil, quando não estávamos em reestruturação. Naquele momento, precisávamos devolver prédios que não eram parte da nossa proposta de valor. Fizemos isso globalmente, saindo de mais de 200 prédios.

Mas, se olharmos todos os prédios [devolvidos], eles não tinham fit com nossa proposta de valor e, por isso, precisávamos sair. Hoje, todos os espaços podem fazer essa entrega que queremos.

Como pretendem lidar com o cenário de crescimento da demanda e menor quantidade de prédios? Planejam ampliar o número de unidades no Brasil?

Hoje, nós temos 28 prédios no Brasil e uma taxa de ocupação de 84%. Vale lembrar que temos um negócio flexível, com clientes que ficam por dois ou seis meses e outros por anos.

O nosso objetivo, no que resta de 2025 e nos anos de 2026 e 2027, é maximizar os espaços que temos. Se decidirmos expandir, isso irá acontecer a partir de 2028. Não será antes, porque isso toma tempo e precisamos de cerca de um ano e meio para crescer com novos prédios.

Agora, se aparecer uma boa oportunidade que se enquadre com a nossa proposta de valor e, em adição a isso, tenhamos um membro que precise dessa locação -, nós cresceremos, mas em conjunto.

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Ano após ano, mais empresas retornam por mais dias aos escritórios ou adotam 100% o trabalho presencial. As taxas elevadas de ocupação são reveladoras desse movimento. Isso não seria motivo para prever a abertura de novas unidades antes de 2028?

Antes da pandemia, mais de 60% dos nossos membros vinham todos os dias para as unidades. Esse número, que chegou a 0% na pandemia, está evoluindo e em torno de 50%. E isso não só acontece no Brasil, é um número global.

Portanto, sim, podemos ter que abrir espaços antes, mas precisamos que exista inventário ou prédios disponíveis no perfil premium, triple A. E a vacância de prédios hoje é muito baixa, não tem muita disponibilidade para crescermos.

O que não vamos fazer é crescer em prédios que não são parte da nossa proposta de valor. Esse “não-fit” é como acabamos no Chapter 11. Não vamos repetir isso. A forma para crescermos tem que ver com a expansão da própria demanda do mercado.

Qual é a importância hoje da América Latina para a operação da WeWork globalmente?

A América Latina representa quase 20 % da receita global, que deve fechar em mais de US$ 2 bilhões neste ano. Temos 70 prédios na região de um total de mais de 600 pelo mundo. E, quando olhamos as operações, o nível de satisfação latino-americano é o maior, sendo a operação brasileira a líder.

O que muda na experiência dos clientes daqui para frente?

Queremos elevar ainda mais o padrão. Na Europa, por exemplo, todos os prédios têm serviço de barista pela manhã, e vamos começar a trazer isso para a América Latina, primeiro na Colômbia agora em setembro. No Brasil, já estamos melhorando a qualidade do café, da internet e da limpeza, levando para os padrões que temos globalmente. A ideia é simples: alguém que está em São Paulo tem que ter a mesma experiência que teria em Nova York, Paris ou Sydney.

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Marcos Bonfim

Jornalista brasileiro especializado na cobertura de startups, inovação e tecnologia. Formado em jornalismo pela PUC-SP e com pós em Política e Relações Internacionais pela FESPSP, acumula passagens por veículos como Exame, UOL, Meio & Mensagem e Propmark