O pior para startups ficou para trás? Dados revelam aumento dos valuations

Rodadas de investimentos mais recentes têm precificado o valor das empresas para cima, em um primeiro sinal de melhora para o mercado de venture capital

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Bloomberg Línea — Depois de um período de dificuldades na captação de investimentos por startups, o cenário do mercado de venture capital começa a dar sinais de melhora. Dados da Carta, uma plataforma global de gestão de ações e instrumentos de capital para empresas, mostram que, no segundo trimestre de 2023, startups americanas que conseguiram captar registraram aumento nos valuations em relação ao primeiro trimestre.

O movimento de valuations maiores, que tende a se refletir em outros mercados, também se fez presente no Brasil em alguns casos. Um exemplo recente foi o da Sami, startup de planos de saúde para micro e pequenas empresas que recebeu um investimento de US$ 18 milhões (cerca de R$ 90 milhões) em uma rodada com valuation superior ao da anterior.

“Sabemos que o mercado não está com muitas rodadas e, quando acontece, são a valuations estáveis ou abaixo [down round]. Nós não vamos anunciar o valuation, mas o nosso é maior que o anterior”, disse o fundador da Sami, Vitor Asseituno, em entrevista à Bloomberg Línea.

Outra startup brasileira que obteve um up round foi a Cobli, empresa de tecnologia para logística, que recebeu um aporte de R$ 100 milhões liderado pelo IFC e Fifth Wall, entre outros investidores. “Não estamos divulgando exatamente o valuation, mas ele foi bem mais do que foi da última rodada” disse Rodrigo Mourad, presidente e cofundador da startup, em entrevista à Bloomberg Línea.

Além delas, a Digibee, startup brasileira de software, recebeu um investimento de pouco mais de US$ 60 milhões no começo de junho. O aporte representou um “up round [aumento do valuation] significativo”, disse o CEO Rodrigo Bernardelli à Bloomberg Línea.

Já a Daki recebeu um investimento de US$ 50 milhões em fevereiro de 2023 e elevou seu valuation de US$ 1,2 bilhão para US$ 1,3 bilhão apó a rodada, segundo dados da consultoria Pitchbook.

Embora esses casos apontem para uma mudança positiva, ainda há um número menor de rodadas em comparação com os níveis de atividade de 2021 e início de 2022.

Segundo a plataforma Distrito, os investimentos de venture capital em startups brasileiras tiveram uma queda de 51,4% no primeiro semestre deste ano em relação ao volume investido no semestre anterior, quando foram investidos US$ 1,57 bilhão. O número de aportes caiu 49,1% em relação ao semestre passado e 63,2% em comparação ao mesmo período de 2022.

Já no mercado americano, os dados indicam uma leve recuperação. Segundo a Carta, todas as etapas da semente à Série D tiveram um aumento na mediana de avaliação, o que é um dado distinto em um mercado de venture capital mais restrito desde que as taxas de juros pelo mundo subiram para controlar a inflação. Agora, esses estágios (Seed, Série A, B e C) têm avaliações acima ou um pouco abaixo do primeiro trimestre de 2021.

Especialistas que acompanham o setor, como Filipe Trindade, CEO do Know How Club e jurado no reality show Meet the Drapers e fundador do Draper Startup House Brasil, a aceleradora do renomado investidor de risco Tim Draper, afirma que tudo que acontece no Vale do Silício reflete na América Latina.

“A quebra do Silicon Valley Bank estabeleceu uma nova ordem entre startups para manterem o caixa e começarem a ser rentáveis”, disse Trindade. “O mercado americano olha muito as startups da América Latina, com tanto potencial quanto as americanas, mas com valuation menor.”

Segundo Trindade, uma startup que começa nos Estados Unidos já sai na frente em termos de valuation do que uma brasileira por conta do câmbio. “Existem muitos empreendedores da América Latina que devido ao cenário econômico vêm se destacando nesse ambiente caótico que é empreender na região. Os VCs americanos enxergam bons empreendedores com empresas com potencial de serem globais”, afirma.

Eduardo Fuentes, gerente de novos negócios da Distrito, disse que, embora seja difícil estabelecer um prazo, é esperado que o aumento dos valuations também volte a ocorrer no Brasil à medida que taxas de juros abaixem e que startups ajustem suas operações apresentando modelos de negócios com métricas operacionais mais consistentes.

Segundo dados da Distrito, o tíquete médio dos aportes até Série D em 2023 no Brasil tiveram reduções. Para a Série D, por exemplo, a média passou de US$ 80,9 milhões em 2022 para US$ 69,3 milhões neste ano. Considerando que os percentuais médios de participação no capital que os investidores negociam com as empresas não mudou, se o valor do tíquete médio cai, o valuation também cai, ainda que o Distrito não possua dados suficientes para tirar conclusões sobre os valuations das startups brasileiras.

Eduardo Fuentes, gerente de novos negócios no Distrito, disse à Bloomberg Línea que com base nos últimos relatórios lançados pela Carta, foi observado um aumento no valuation de empresas de tecnologia monitoradas pela organização no último trimestre, e que, embora seja difícil estabelecer um prazo, ele espera que esse movimento volte a acontecer no Brasil à medida que taxas de juros abaixem e que startups ajustem suas operações apresentando modelos de negócios com métricas operacionais mais consistentes.

Martin Fergus, sócio da Ilha Capital, uma consultoria de M&A, disse que nas últimas semanas tem falado com investidores e sentido uma volta de interesse significativa. “Isso me deu um certo otimismo para os próximos meses, mas estou cauteloso. Acho que o resto do ano será melhor do que o início do ano, mas 2024 e 2025 serão bem promissores”, afirmou.

Também sócio na Ilha Capital, Michael Frase disse que o mercado não vai voltar rápido, mas percebe sinais positivos. “É ótimo ver essas noticias da Carta agregando essas estatísticas de melhora do mercado americano entre o primeiro e segundo trimestre, mas a Série D ainda está bem difícil comparando os valuations de 2021. Acho que o mercado ficará menos volátil de agora até o final do ano, mas será uma volta devagar”, disse Frase quando questionado pela Bloomberg Línea.

Para ele, há vários indicadores que mostram que há espaço para otimismo, mas que o mercado continuará cauteloso por um tempo e mostrando que 2021 foi de fato um ano “fora da curva”.

Cenário de aperto

Apesar do movimento de recuperação no mercado americano, há também acredite que os down rounds ainda vão aparecer à frente. Demissões e dívidas levantadas em 2022 estenderam o tempo de caixa das startups, empurrando os down rounds para o futuro, segundo o PitchBook. A consultoria disse acreditar ser provável que as rodadas para baixo aumentarão ao longo do tempo, apesar da melhora do cenário apontada pela Carta.

Thiago Sandim, sócio na Demarest Advogados, também não é tão otimista. Para ele, na metade de 2024, as empresas mais fortes devem sobreviver ao que chamou de “sacudida Darwiniana” no mercado, por fazer a seleção natural das melhores empresas. “Estamos no meio da fase mais difícil, acho que o resto de 2023 não vai ser fácil. Não tem nenhum indicador macro que indique que o resto de 2023 será uma maravilha”, disse Sandim.

“Houve M&As e follow-ons, mas ainda assim os follow-ons foram direcionados. Sou um pouco cético com essa recuperação sazonal que o mercado está tendo. Acho que o mundo está se preparando para um 2024 e 2025 melhor do que 2023″, disse Sandim, em evento promovido pela Demarest Advogados nesta terça-feira.

O mercado de M&As na América Latina teve uma redução de 23% no primeiro semestre de 2023, segundo dados do TTR. Mas, recentemente, negócios relevantes têm sido anunciados na área. A Visa, por exemplo, adquiriu a startup brasileira Pismo por US$ 1 bilhão. E, nesta terça-feira, a Enjoei (ENJU3) divulgou que pretende adquirir a Elo7, por um valor não divulgado a ser pago em dinheiro.

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