Do Excel à IA: como a inteligência artificial pretende transformar os deals de M&A

Bancos de investimento e consultorias começam a usar ferramentas de IA para ganhar assertividade e rapidez em estimativas que vão de volume de sinergias a riscos até regulatórios

A poster at the World Economic Forum (WEF) in Davos. Photographer: Hollie Adams/Bloomberg
04 de Fevereiro, 2024 | 06:01 PM

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Barcelona, Espanha — Nos últimos dias, a notícia das negociações para uma fusão entre a Arezzo e o Grupo Soma levantou questões relevantes relacionadas ao preço embutido na relação de troca de ações entre as duas companhias e ao tamanho das sinergias projetadas caso a operação seja concretizada. O negócio por ora não teria contado com um due dilligence nas duas empresas, o que aumentou as dúvidas sobre os números.

Tais incertezas, inerentes a negócios de M&As (fusões e aquisições), podem estar com os dias contados.

A era de cálculos e modelos com uso de planilhas do Excel tem dado lugar a uma realidade dominada pela Inteligência Artificial. Se antes os analistas passavam horas imersos em dados numéricos, propensos a erros humanos, a IA agora processa e analisa volumes massivos de informações em questão de minutos.

Essa mudança representa não apenas uma evolução tecnológica, segundo especialistas: a IA simplifica os processos e também permite uma tomada de decisão mais estratégica e informada, o que confere mais precisão para os métodos tradicionais.

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Grandes empresas de consultoria, bancos de investimento e escritórios especializados começam a incorporar ferramentas de IA em seus serviços, o que resulta em maior produtividade e permite que os profissionais do setor dediquem mais tempo a análises de maior qualidade.

“A IA atua como assistente de análise, pesquisa e redação, o que transforma a maneira como esses processos são realizados”, disse Jorge Calvo, vice-reitor da GLOBIS School of Management Tokyo e professor da ESADE Business School, à Bloomberg Línea.

Aqui estão os destaques do uso de IA em M&As, segundo especialistas:

Análise de dados mais ágil

“Atualmente, o que mais nos ajuda e o que mais aproveitamos é o gerenciamento de informações e dados, especialmente na identificação de oportunidades e na capacidade de gerenciar um nível muito amplo de informações, de forma rápida e eficiente”, disse Borja Oria, CEO de Investment Banking da Arcano.

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Isso se deve ao fato de que a IA pode processar e estudar grandes volumes de dados com muito mais rapidez do que os humanos, o que é especialmente útil em fusões e aquisições, em que a análise de grandes quantidades de informações financeiras, jurídicas e operacionais é crucial.

Identificação de oportunidades

A IA pode detectar tendências, riscos e oportunidades que, de outra forma, poderiam ser ignorados, segundo Zaheer Ali, COO e cofundador da Positon AI, uma empresa de tecnologia de São Francisco, na Califórnia, cuja plataforma gerencia todo o processo de fusões e aquisições e conecta potenciais investidores e startups.

“Os recursos de análise preditiva e marchine learning da IA possibilitam a identificação de oportunidades e riscos ocultos nas negociações de fusões e aquisições por meio de uma análise mais profunda e ampla das tendências do mercado, das estratégias dos concorrentes e das possíveis implicações regulatórias, geralmente em tempo real e por meio de uma quantidade maior de dados”, disse.

Due diligence acelerada

Esse pode ser um dos processo mais demorado e caro nas operações de M&A. A IA é capaz de acelerá-lo, automatizando a análise de documentos jurídicos e financeiros, identificando rapidamente áreas de preocupação ou interesse por meio de processamento de linguagem natural e ferramentas de planejamento de integração mais sofisticadas.

“Também desempenhará um papel crucial na análise de mercado em tempo real e na navegação em ambientes regulatórios complexos”, de acordo com Rabie Zahri, CEO e cofundador da Positon AI.

Previsão de sinergias e integração pós-fusão

O CEO desta startup também prevê um maior uso da IA na busca preditiva de negócios, com a tecnologia detectando possíveis sinergias de uma fusão ou aquisição para reduzir custos, aumentar as receitas e melhorar a eficiência operacional.

“Esse será um futuro inevitável e as empresas que estiverem preparadas para o futuro se posicionarão com uma enorme vantagem competitiva nessa área”, disse Zahri.

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Impacto na avaliação de preços

Os algoritmos de IA podem analisar transações anteriores e tendências de mercado para ajudar a formular estratégias de negociação e avaliação mais eficazes.

“Em alguns setores, está claro que a IA pode gerar valor, seja por meio de custos reduzidos com pessoal, maior eficiência ou maior potencial de crescimento”, disse Borja Oria, da Arcano.

De acordo com esse executivo, a chave para os investidores agora é saber como a IA está influenciando os negócios de uma empresa, “como vai afetá-la a médio e longo prazo e que decisões os empresários estão tomando nesse sentido”.

Avaliação de riscos

A IA pode ajudar a prever e quantificar os riscos associados a uma possível aquisição. Analisar um grande número de contratos de clientes e fornecedores e identificar riscos e oportunidades na cadeia de suprimentos atual e futura pode ser uma tarefa extenuante.

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“A IA tem o potencial de tomar decisões mais bem informadas, especialmente em áreas como previsão financeira, avaliação de riscos e planejamento estratégico”, diz Zaheer Ali, cofundador da Positon AI.

Os desafios que enfrentar

Apesar dos benefícios, a adoção da IA em M&A tem seus desafios. Há uma curva de aprendizado na adaptação às novas tecnologias e na interpretação dos insights fornecidos.

Além disso, a dependência do uso da tecnologia levanta preocupações sobre a segurança e a privacidade dos dados, especialmente com relação à confidencialidade das informações.

“O uso de IA em fusões e aquisições está em um estágio muito inicial e levanta preocupações éticas e de privacidade, especialmente no que diz respeito ao processamento de dados e à parcialidade na tomada de decisões quando não aplicada metodicamente e com muito cuidado”, de acordo com Rabie Zahri.

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Borja Oria ressaltou que “nunca se deve usar ferramentas públicas de IA não proprietárias com informações confidenciais e privadas”.

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Michelly Teixeira

Jornalista com mais de 20 anos como editora e repórter. Em seus 13 anos de Espanha, trabalhou na Radio Nacional de España/RNE e colaborou com a agência REDD Intelligence. No Brasil, passou pelas redações do Valor, Agência Estado e Gazeta Mercantil. Tem um MBA em Finanças, é pós-graduada em Marketing e fez um mestrado em Digital Business na ESADE.